O re(i)gime no seu melhor

O país, segundo Irene Neto, filha de Agostinho Neto e presidente do Conselho de Administração da Fundação com o mesmo nome, é não só um clã familiar, como também ideológico à boa moda das monarquias romanas.

No caso angolano, estando no poder, uma monarquia partidocrata, esta não deve prescindir das arenas, onde se lançam os adversários e inimigos às feras, para serem degolados, sempre que divergirem das ideias da corte, rejeitarem a boçalidade imperial ou prescindirem da escravatura.

Nestes casos e por entristecerem a princesinha do reino, a justiça não deve perder tempo com julgamentos, como dizia o pai herói, também e quiçá, pelo genocídio do 27 de Maio de 1977, com os defensores dos ideais da liberdade e democracia, logo devem ser fuzilados, lançados aos jacarés, na serra da Leba ou no espaço pelos aviões da Força Aérea. Bravo!

Nas últimas semanas a princesa, Irene Neto da Fundação Agostinho Neto, acordou alegre, muito feliz, pelas sublimes lições de Liberdade, Democracia, Justiça, Respeito pela Diferença, Direitos Humanos e Direito à vida, dadas, em on line, pelo Folha 8, em tempo de COVID-19. Gostou particularmente da lição sobre o Direito à vida, consagrada no art.º 30.º da constituição atípica de Fevereiro de 2010: “O Estado respeita e protege a vida da pessoa humana, que é inviolável”, tal como o n.º1 do art.º 40.º: “Todos têm o direito de exprimir, divulgar e compartilhar livremente os seus pensamentos, as suas ideias e opiniões, pela palavra, imagem ou qualquer outro meio, bem como o direito e liberdade de informar, de se informar e de ser informado, sem impedimentos nem discriminações”, que ela desconhecia, no todo, tal como Luís Neto Kiambata, Jorge Valentim, Paulo de Carvalho, Cornélio Caley, João Pinto, Paulo Mateta, bureau político do MPLA, ERCA e tantos outros bocas de aluguer, que não lendo ou não sabendo interpretar o que leram, emitem opinião ou produzem comunicados descontextualizados e discriminadores, sobre realidades dantescas da sua imaginação monopartidária. Quando alertados de mais um erro vampiresco desculparam-se, ainda com sangue na boca, ter sido um sonho…

A Fundação António Agostinho Neto mostrou, mais uma vez, não ser uma instituição séria e credível, pese ser financiada com dinheiro de todos angolanos, inclusive das vítimas dos vários massacres, com realce para os do 27 de Maio de 1977, num curto espaço de 14 dias (16.06 e 30.06) apresentou duas queixas.

Cada uma sendo uma pérola a boçalidade raivosa, discriminatória, complexada e racista, significando não ter estrutura de queixa. Uma autêntica vergonha, destacando-se, em ambas, o carácter, quase animalesco em assassinar o Folha 8, ordenando à ERCA, não como entidade reguladora, mas apêndice da Fundação e do MPLA, o encerramento imediato, por delito de opinião, do nosso jornal.

E não é que a ERCA, capitaneada pelo exímio discriminador Adelino Marques de Almeida cumpriu a rigor, quando, afinal, na carta endereçada, no 16 de Junho, Irene Neto apenas partilhou um desabafo e não uma queixa da Fundação do herói do MPLA, como demonstra, agora numa queixa, apenas formulada no dia 30.06, quando o presidente da entidade reguladora da comunicação social, extrapolando competências, no dia 26.06 veio a terreiro, com uma ladainha abjecta afirmar:

“O Conselho Directivo da ERCA demarca-se das práticas editoriais do Jornal Folha 8 que atentam contra a honra e dignidade dos obreiros da independência Nacional, nomeadamente do Presidente-fundador da República de Angola, Dr. António Agostinho Neto”.

Face a este dado novo, em que pé ficamos? É credível um órgão assim? Pode alguém, especialmente o Folha 8, esperar bom senso, imparcialidade e sentido de justiça, de uma instituição, onde oito membros, nada fazem para rejeitar qualquer colação, a uma central etílica, por mera cegueira partidocrata e perseguição assassina contra colegas de profissão, que pensam diferente?

O jovem e corajoso revú, Jorge Kisseque, rosto das denúncias dos crimes de corrupção, nepotismo, peculato, na província do Uíge, foi mais uma vez aliciado, desta vez no dia 2 de Julho, para deixar de organizar manifestações denunciando as más práticas governativas, principalmente, se abortasse a do dia 4.7, contra um emprego na Polícia Nacional.

O proponente foi, nada mais nada menos, que o comandante provincial da Polícia, comissário Matias. “Já falei com o senhor governador e eu acredito que essa tua confusão é por estares desempregado e, nós vamos já resolver isso. Amanhã (3.7) trazes toda a tua documentação, para fazermos um processo e enviarmos a Luanda, para o teu enquadramento”, disse o comandante.

O jovem revú, não se mostrando entusiasmado pela desavergonhada proposta de aliciamento corruptivo, retorquiu: “porquê essa proposta a mim, neste momento, se não sou o único desempregado no Uíge e em Angola”? Intrigado, pela contundência da resposta do jovem revú, o comandante policial levantou-se meio irado, lançando farpas intimidatórias, contra Jorge, que não se intimidou e foi continuar os preparativos da manifestação…

E, acreditando no texto constitucional, Jorge esqueceu-se da prática ditatorial de uma Polícia que, na maioria das vezes, não age como órgão republicano, mas partidocrata, ao ponto de ter sido, no dia da manifestação (4.7) surpreendido, com a introdução, sob o olhar sereno e cúmplice da Polícia, de três agentes sabotadores, cuja missão foi a de o espancarem, enquanto líder da acção de protesto. No final da “canina” agressão foi selvaticamente, arrastado, sem o cometimento de crime algum, pois cumpriu o art.º 47.º da Constituição (Direito de reunião e manifestação), para as fedorentas masmorras da prisão local, onde permaneceu, por dois dias, até ser presente, em julgamento sumário, ao tribunal.

Falhos de provas e evidências do cometimento de crime, o Ministério Público pediu a absolvição do arguido, mas, caricatamente, o juiz, alegadamente, membro do CAP de Juízes do MPLA, condenou Jorge Kisseque a uma pena de três meses de prisão e a uma multa de 25 mil Kwanzas, mesmo não havendo provas e acusação do procurador. É o cúmulo da nossa (in)justiça.

O trabalhador da Função Pública em Angola anda sempre com o coração na mão ou a mão no coração, por dois motivos: a) ver a carreira, abruptamente interrompida; b) ser afastado por filiação partidária.

A primeira porque a rotação (remodelação) dos governantes, não respeitar o princípio da carreira do funcionalismo e, a cada mudança, ministros, governadores ou directores nacionais, mudam ou colocam, por capricho, no desemprego, técnicos médios, superiores, trabalhadores especializados, administrativos e, por vezes, até empregadas de limpeza, que servem os cafés, são, também exoneradas. É uma actuação tóxica que não abona o partido no poder, quanto ao respeito pela carreira na Função Pública, uma vez mais violada pelos seus membros, novos primeiros secretário do MPLA e governadores de Luanda, Huambo, Uíge e Cunene, que não se coibiram e fazer uma autêntica razia nos gabinetes e departamentos. Se uns são justificados, outros, são uma aberração. Até quando essa permanente desarticulação e desrespeito às leis e aos trabalhadores, que vêem afectadas a progressão de carreira, com transferências, sem critério dos cargos e funções.

A segunda é a mais grave, pese estar consagrado o multipartidarismo, na constituição atípica, os governantes do MPLA, regra geral, existem raras excepções, quando se apercebem, haver no seu gabinete ou departamento sensível, principalmente dos que gerem kumbu, um funcionário, ligado a um partido político da oposição, este é imediatamente, arredado, sem apelo, nem agravo da sua função. Esta é infelizmente, a noção de Estado que muitos ainda têm, 45 anos depois de proclamada a independência.

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