O OGE, a Oposição e os comentários

O Titular do Poder Executivo, figura unipessoal, que encarna, no sistema político angolano, a “contrarium sensus”, o que poderia ser um órgão colegial: governo, endossou à Assembleia Nacional, o ante-projecto, na realidade, já projecto definitivo, do OGE (Orçamento Geral do Estado), para, no escuro, os deputados da bancada maioritária: MPLA, qual “manada de gado”, votar, mesmo sem saber, sem ler e, muitas vezes, tendo consciência de ser errado, aprovar o mal, vindo, monarquicamente, da lavra do chefe…

O OGE continua, infelizmente, a ser um bicho desconhecido para muitos parlamentares, que não sabem o que ele é, nem o que representa, anualmente, para a vida das populações e sectores de desenvolvimento económico, provincial e nacional, uma vez, poucos conseguirem decifrar os números e pouquíssimos, sabem da localização dos projectos, sua importância, grau de implantação e viabilidade, junto das localidades e populações.

A Assembleia Nacional é, actualmente, pese integrar bancadas da oposição (minoritária, nem consegue aprovar uma lei, para reduzir o consumo excessivo de papel higiénico, durante a legislatura), é uma cópia mais perniciosa, que a sua antecessora socialista (tempo de partido único – 1975-1991); Assembleia do Povo, integrada, à época, maioritariamente, por maquisards, camponeses, operários (falsos) e intelectuais chickletes, que faziam do “quadriciclo”, um jardim infantil, onde no escorrega e baloiços, têm a escrupulosa missão da omissão irresponsável, responsável, na linha da cartilha ideológica.

Pode parecer que alguma coisa tenha mudado, mas é mera ilusão óptica, porquanto a fraude iniciada, com a cumplicidade das forças comunistas portuguesas, na violação dos Acordos de Alvor de 1975, (subscrito pelos três movimentos de libertação nacional: FNLA, MPLA e UNITA), apenas se tem refinado, ao longo dos anos, na continuação, muito apurada da lógica comunista, hoje, no máximo esplendor, com INDRA e SIFIC, garantes de uma maioria forjada, para o unanimismo e aberrações, não só cúmplices como criminosas, da parte de deputados, que ano após ano, aprovam chorudos orçamentos, caricatamente, com resultados agravadores da vida dos autóctones angolanos, ao invés de a melhorar ou igualar a que uns, já desfrutavam no conturbado período colonial.

Um Orçamento Geral de Estado é o conjunto de despesas e gastos previstos, anualmente, pelas várias unidades orçamentais; provinciais, institucionais e ministeriais para, no final, estarem reflectidas, num documento final, submetido a aprovação do poder legislativo.

Só pode elaborar, um OGE, com dados e elementos fiáveis, quem tenha conhecimento, quotidiano, da vida e direcção dos vários órgãos, sob pena de especulação leviana, em função da especificidade e cientificidade de tão importante instrumento.

Nas democracias participativas, cujos pergaminhos transcendem os meros textos constitucionais e legais, não pode, ser tratado como joguete, com fins populistas, daí o império da sua elaboração, repousar, exclusivamente, na esfera governativa.

Em qualquer parte do mundo, a oposição (cujo objecto é o poder), cabe fiscalizar e, com base no conhecimento da realidade, em relação ao exercício do executivo, no ano anterior, nos vários sectores sociais e económicos, exigir melhores explicações e correcção do proponente, após atenta leitura e análise documental, dos dados estatísticos, contabilísticos e financeiros, em pauta.

Exigir de uma oposição, por mais blindada que seja, num país de viés ditatorial, centralizado, onde o partido governamental é transversal, em todos os órgãos de exercício público, a apresentação de uma réplica do OGE é o mesmo que obrigar o elefante a passar pelo buraco da agulha. Será sempre uma tentativa inglória, mais a mais, quando inexiste, fiscalização da sua execução, da parte de quem é chamado a aprova-lo.

No caso concreto de Angola, com este fenómeno, calcinado, existe a consagração de um golpe de Estado (mais um) protagonizado pelos homens de toga preta; juízes do Tribunal Constitucional, que se têm especializado, ao longo dos anos, na subversão da própria Constituição atípica e da democracia, ao aprovarem o livre arbítrio e a discricionariedade de um homem só: Titular do Poder Executivo, João Lourenço, Presidente da República, João Lourenço, Chefe de Estado, João Lourenço, Comandante em Chefe das Forças Armadas, João Lourenço, nomeador de todos juízes, João Lourenço, nomeador do Procurador-Geral da República, João Lourenço, controlador exclusivo da comunicação social pública, João Lourenço e, ainda, sem os finalmente, utilizador dos recursos e reservas financeiras do Estado, sem qualquer autorização legislativa, como se impunha. Diante deste quadro dantesco, como pode uma oposição, aproximar-se de números realistas, quando estes farfalham o peculato, o nepotismo, o tráfico de influência e, sexualizam, institucionalmente, com a corrupção, vermelha ou cor-de-rosa, dependendo das épocas e protagonistas?

Como alguém, em sã consciência pode exigir, de outrem, tendo ciência, que não preenchem os dedos de uma mão, nas 18 unidades territoriais (províncias), quadros, verdadeiramente, independentes e não submissos, em órgãos públicos.

Aliás cabe ao próprio Presidente da República a relíquia discriminatória de os cidadãos, alheios ao seu partido e ideologia, só poderem, independente da qualificação técnica e académica, aspirar a direcção de uma escola, quiçá, de terceira categoria…

Assim, antes de uma inversão do paradigma, carente de higiene intelectual, uma maior participação e contribuição da oposição, na elaboração do Orçamento Geral do Estado, com acatamento das recomendações, por parte do Titular do Poder Executivo (persistindo a actual Constituição), só poderá emergir, quando houver um verdadeiro poder autárquico, com assembleias legislativas provinciais e locais eleitas, longe das amarras de qualquer fraude.

Hoje, este quadro inexiste, face ao temor político governante de perder, sem batota eleitoral, circunscrições territoriais, por onde, actualmente, vazam, montantes financeiros e recursos materiais, sem prestação de contas, as populações e autores locais, pergaminhos e exigências da democracia cidadã e não a “macumbagem” permanente da, “orgulhosamente” suspeita, Comissão Nacional Eleitoral…

Até mesmo, em política, onde vale tudo e as baboseiras mais abjectas, por vezes, têm estatuto, muitas vezes, de letalidade (em Angola, há 45 anos), não se fazem omeletas sem ovos.

Assim, quando um economista, político ou comentador, tem o indicador apontado a exigência da oposição apresentar um documento rival, ao OGE, do Titular do Poder Executivo, que não curou de solicitar autorização legislativa, para utilização dos valores do Fundo Soberano, cujo objecto é distinto ao perseguido pelo PIIM, é o mesmo que se confundir as piruetas de um macaco com a raiz quadrada.

Mais já agora, até para as novas gerações e estudiosos da política legislativa angolana, seria curial indicar-se, quais as propostas, só propostas, feitas pela oposição parlamentar, foram acolhidas pelo Executivo/MPLA, desde a instauração do multipartidarismo.

Adiante, quais as sugestões da sociedade civil, incluindo dos jornalistas, que até existe uma lei de apoio a imprensa privada, foi pelo actual regime, acolhida e implementada?

Por tudo isso é importante não se tapar o sol com a peneira, em nome da razoabilidade intelectual, pois sem conhecimento profundo de uma realidade, intramuros e do “quantum” financeiro, das unidades orçamentais, impossível se torna, ser levado a sério, qualquer exercício, quando no básico, como as eleições autárquicas, plasmadas no art.º 61.º do primeiro texto constitucional do MPLA de 1975, simultaneamente, anunciadas, pelo mesmo actor, para 1992; 2008; 2012; 2013; 2015; 2018; 2021, no, “agoramente”, do novo paradigma, que, infelizmente, confunde data formal, com acto administrativo formal.

É muita fruta, em camião soviético, porque, na realidade, as eleições sempre foram convocadas e, nos últimos anos, quer pelo actual Vice – presidente, como pelo próprio Presidente da República, infelizmente, o que vale é a ausência de órgãos de soberania, verdadeiramente fortes, para impedir o vigorar da lei absolutista da ditadura.

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