Ditadura mantém presos políticos em Cabinda

O que é Cabinda? A pergunta é andarilha. A resposta (esperada há décadas) teima em não ser blindada, por casmurrice de quem detém o poder executivo, em Luanda. Enclave? Protectorado? Colónia? Província? A todas o MPLA, por manifesta falta de razoabilidade político-mental, traçou, desde o início, uma linha divisória de colónia.

A realidade comportamental não mente, para tristeza colectiva, porquanto é a única circunscrição territorial, onde não é permitida, sequer, a existência de associações, mesmo ligadas aos direitos humanos.

Rememoremos o triste fim da Mpalabanda, que por orientação política e partidocrata do MPLA, impede o prosseguimento do recurso, que até hoje, repousa nos porões dos Tribunais Supremo e Constitucional.

O atraso tem uma lógica, obviamente porque os tribunais, em Cabinda são geridos por juízes militares idos de Luanda e, os da capital, ainda que sobrem avultadas razões de direito, os cidadãos imbindas são considerados de terceira categoria, logo sem direitos expressos na Constituição atípica de Fevereiro de 2010.

A prisão de oito jovens desde Novembro de 2019, cujos autos para julgamento deram entrada no Tribunal no dia 13.12.19, para o julgamento sumário realizar-se no dia 16.12.19, mas até agora os arguidos continuam nas fedorentas masmorras do regime, sem data marcada para conhecerem a decisão final.

O caricato é terem sido presos quando, pensando ser iguais aos demais cidadãos de Angola, como diz o art.º 23.º CRA “todos são iguais perante a Constituição e a lei”, organizaram e participaram numa manifestação da qual deram conhecimento às autoridades de direito, como recomenda o art.º 47.º CRA: “1. É garantida a todos os cidadãos a liberdade de reunião e manifestação pacífica e sem armas, sem necessidade de qualquer autorização e nos termos da lei.”

Infelizmente esse é um direito apenas textualizado, mas não permitido aos cidadãos, principalmente os imbindas, sempre espancados, com os ditatoriais bastões da Polícia do MPLA e pisoteados durante o trajecto, com as nauseabundas botas militares, como aconteceu com estes jovens, desde Novembro de 2019, por apenas reivindicarem melhores condições sociais, tais como, mais emprego, mais e melhor educação, melhor saúde, melhor gestão da coisa pública e autonomia da região, responsável por mais de 50% do Produto Interno Bruto nacional, mas vivendo na penumbra e indescritível miséria.

As permanentes prisões e limitações de direitos, desde os padres Casimiro Congo, Raul Tati, Lello e outros intelectuais de Cabinda, por parte do governo central e, agora, aos jovens imbindas, votados a um crónico desemprego e alto custo de vida, com a subida da inflação, tornando os produtos básicos mais caros na região, mostra a gritante incompetência do partido no poder, incapaz de implantar políticas capazes de estancar o sentimento independentista, que calcorreia nas mentes de grande parte dos cidadãos da região.

É esta situação aliada ao mau desempenho dos governadores que estimula a insatisfação, levando a que o movimento reivindicativo saía, permanentemente, à rua.

Um cenário triste, quando o que a maioria dos povos, Mbindas, Yombes e outros esperavam era o bom senso, por parte de João Lourenço e dos seus pontas de lança na região, bem como dos órgãos de Defesa e Segurança, que não curam de analisar a idiossincrasia regional dos diferentes povos.

A inteligência governativa para travar uma corrente reivindicativa deve estudar, em profundidade (já que a superficialidade é o refúgio de uma bestialidade, com tópicos autoritários), o sentimento, os gemeres e os quereres dos cidadãos e não afiar sempre as baionetas e limpar os tubos dos canhões.

Esta é a condição de Cabinda, uma não-província, eleita, consciente ou inconscientemente, colónia de Angola, por parte do MPLA, que por não ter um projecto de sociedade, mas de poder, vê a região apenas como produtora de petróleo, para alimentar a estratégia da manutenção do poder, bem como o resto das províncias do país, excluindo-a, enquanto produtora.

Essa perspectiva triste e desoladora, partilhada por todos os Titulares do Poder Executivo tem sido a mola que determina o sentimento independentista que vai crescendo, mais por incompetência de Luanda que não consegue gizar um plano de diálogo capaz de acomodar, numa mesa negocial, as principais preocupações e anseios dos povos Imbindas/Yombes.

Diante destas prisões que a maioria considera absurda, o economista MBembe questiona: “Gostaria apenas de fazer uma pergunta ao Titular do Poder Executivo, o dono disto tudo, aquele que os bajuladores acreditam ser um Messias, mas se o for, é o Messias da desgraça, pois desde que chegou ao poder a situação social e económica de Cabinda e Angola piorou. Porra, estamos fartos de sofrer, com este partido e regime do MPLA, eles são maus e agora João Lourenço é pior, mas se continuar a prender-nos, sem razão e fazer dos cabindas escravos, um dia ele terá o mesmo troco do nosso povo”, disse ao Folha 8, MBembe Yauca Pambi.

Por sua vez, o jurista Kimpa Bulele disse não se ter ainda realizado o julgamento, “porque o juiz exigiu melhor instrução, já que as provas do crime, pelos quais os réus vêm acusados, não estão juntas aos autos. A investigação do SIC disse ter de ir buscar as mesmas (provas da acusação) em Luanda, porque elas resultam da intercepção das comunicações telefónicas entre os organizadores da manifestação, grampeadas pelos aparelhos instalados pelo SINSE, na capital do país. Mais grave ainda, a ditar o adiamento do julgamento é a Procuradoria-Geral da República ter acusado os oito (8) jovens com base na presunção de culpa e o juiz com esta postura tem agido com dolo, ao adiar “sine die” o julgamento, num revoltante sentimento masoquista, pois não havendo elementos de prova a lei determina a soltura dos réus que não são responsáveis pela desorganização ou má-fé da acusação”, finalizou o jurista.

Até quando esta prisão ilegal é a grande questão.

No passado dia 1 de Fevereiro, a direcção político-militar da Frente de Libertação do Estado de Cabinda (FLEC) exigiu a libertação imediata de todos os presos políticos, considerando que o seu “único crime foi quererem ser livres e reclamarem o direito à liberdade de expressão”.

Presos políticos em Angola não existem, garante o Governo de João Lourenço. Mas como existem em Cabinda, o Presidente do MPLA estará a reconhecer que Cabinda não é Angola?

“Nesta data (1 de Fevereiro) em que celebramos também o Dia da Identidade Cabinda, a direcção político-militar da FLEC exige a libertação imediata de todos os presos políticos em Cabinda cujo único crime que cometeram foi querer ser livres e reclamarem o direito à liberdade de expressão e o legitimo direito à autodeterminação do nosso povo”, escreveu a FLEC e comunicado.

A Frente de Libertação do Estado de Cabinda apelou a toda a população daquela região, de Angola e do mundo, a entender que o dia 1 de Fevereiro é a data da comemoração dos 135 anos da celebração da assinatura do Tratado de Simulambuco que a colocou sob protecção portuguesa, “como um dia de reflexão”.

A FLEC reitera que permanece inabalável na sua missão de protecção do povo de Cabinda, da sua honra, e do seu desejo de liberdade e autodeterminação e que está disponível para dialogar e criar condições sólidas para que a Paz seja uma realidade definitiva.

A FLEC, através do seu “braço armado”, as FAC (Forças Armadas de Cabinda), luta pela independência do território alegando que o enclave era e é um protectorado português, tal como ficou estabelecido no Tratado de Simulambuco, assinado em 1885, e não parte integrante do território angolano.

Ingenuamente os cabindas continuam a pensar que Portugal quer fazer alguma coisa para repor a verdade e, sobretudo, a dignidade deste Povo. Ledo engano. Lisboa só faz o que o MPLA quiser.

Só por manifesta falta de seriedade intelectual e cobardia, típica dos sucessivos governos portugueses é que Portugal pode dizer (mesmo que pense o contrário) que Cabinda é parte integrante de Angola.

Cabinda – repita-se – foi comprada pelo MPLA nos saldos lançados pelos então donos do poder em Portugal, de que são exemplos, entre outros, Melo Antunes, Rosa Coutinho, Costa Gomes, Mário Soares, Almeida Santos.

É claro que, tal como em Timor-Leste, até à vitória final, continuará a indiferença (em grande parte comprada com o petróleo de… Cabinda), seja de Portugal, da CPLP, da ONU ou de qualquer outra coisa que tenha preço. Desconhecemos que haja alguma que não tenha preço.

E é pena, sobretudo quanto a Portugal, que à luz do Direito Internacional ainda é a potência administrante de Cabinda. Lisboa terá um dia de perceber que Cabinda não é, nunca foi, nunca será uma província de Angola. Tal como, ao contrário do que dizia Salazar, Angola só foi província portuguesa (Portugal, na altura, ia do Minho a Timor) pelo uso da força.

Por manifesta ignorância histórica e política, bem como por subordinação aos interesses económicos do regime do MPLA, os governantes portugueses fingem, ao contrário do que diziam pensar do Kosovo, que Cabinda sempre foi parte integrante de Angola. Mas se estudarem alguma coisa sobre o assunto, verão que nunca foi assim, mau grado o branqueamento dado à situação pelos subscritores portugueses do Acordo de Alvor.

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