Depois de puxar o gatilho
a bala não volta para trás

O Tribunal Constitucional (uma das sucursais do MPLA) chumbou definitivamente e pela terceira vez o recurso interposto para a legalização do partido PRA-JA, o projecto político lançado em 2019 por Abel Chivukuvuku, alegando que as assinaturas dos subscritores não estariam em conformidade.

De facto, reconheça-se, para que é que Angola precisa de uma democracia com vários partidos se, como todos sabemos há 45 anos, basta ter uma democracia de um só partido, sendo que para dar cor à comédia parlamentar existem alguns figurantes que gostam de dizer que são opositores?

O Folha 8 publica agora o que sobre o assunto disseram, entre outros, Belmiro Chissengueti, Benja Satula, Reginaldo Silva, Celso Malovoneke, Félix Miranda, Salas Neto, Eliezer Capolo e José Dumilde Biala.

Belmiro Chissengueti

1. Ponto prévio: não sou, nunca fui e, espero, nunca vir a ser membro de qualquer partido político. Respeito todos!

2. Sou, entretanto, paladino da sociedade pluralista e livre, em que as diversas sensibilidades e perspectivas de sociedade estejam representadas, construindo, desta forma, a unidade do mosaico que é a nossa realidade.

3. Depois do parto doloroso deste País , com muito sangue vertido inutilmente, ao permitirmos que, por causa das nossas desavenças, nos tivéssemos transformado no campo de batalha preferencial da luta entre as grandes potências; depois de termos tido um País transformado em cemitério dos seus filhos e filhas que se digladiavam por pensarem diferente, em 1991 começou a surgir uma luz no fundo do túnel.

4. Esta luz se tivesse sido bem aproveitada estaríamos longe. Vendo bem, parece ter sido o início da gangrena da corrupção que hoje sufoca todas as boas intenções, por melhores que sejam.

5. Tivemos outra grande oportunidade em 2002, com o alcance da paz. Dinheiro da China, petróleo em alta (que jamais voltará) não nos levaram a criar um País forte, antes, pelo contrário, criamos um elefante com pés de barro.

6. Nem mesmo a crise de 2008 nos despertou para uma melhor abordagem. Pelo contrário, deu-se início à actual Constituição que é, em meu entender, um grande retrocesso na estrada da democracia.

7. É impossível construir a democracia com uma Constituição não democrática e, consequentemente, com leis não democráticas, e, por conseguinte, com legislação avulsa não democrática. É impossível!

8. A democracia não se resume na realização periódica de eleições! Já vimos os que ganharam com 99,99%, que exoneravam e nomeavam a seu bel prazer, a serem esquecidos e humilhados depois de abandonarem o poder.

9. A democracia é a respiração do mundo civilizado que permite a liberdade de escolha dos líderes e a possibilidade de construir uma oposição que obrigue os detentores do poder a trabalharem com zelo, competência e integridade moral.

10. O que está a acontecer com o PRA-JA SERVIR ANGOLA é uma vergonha para um País é um péssimo precedente para a história política do nosso País. Descredibiliza o nosso sistema de justiça e gera desconfiança nos investidores estrangeiros que ficam sem garantias jurídicas em caso de eventual confronto com algum detentor do poder.

11. Espero que alguém, de boa fé, me convença que a APN de Quintino Moreira tenha mais adeptos que o PRA-JA SERVIR ANGOLA!!

12. A maior urgência democrática do nosso País, hoje, é mandar para a fogueira a actual Constituição e , caso não haja tempo para outra melhor, buscar de volta aquela de 91-92 que era bem melhor.

13. Há urgente necessidade dos freios e contrapesos que garantem os equilíbrios.

14. “Corrigir o que está mal e melhorar o que está bem” não deve ser uma simples retórica! Deve passar para a acção! Caso contrário continuaremos a importar palitos de limpar os dentes mesmo tendo a segunda maior floresta tropical do Mundo!!!

Ou o Direito mudou muito desde que deixei a UCAN ou não passo de um nabo que estudou sem entender absolutamente nada!

Benja Satula

Dói a alma de quem quer ver um país entrar nos eixos do Estado Democrático e de Direito esbarrar-se dia sim, dia sim nas incongruências, inconsistências e superficialidades dos Tribunais Superiores em Angola, que, e pelos vistos, andam a revezar-se, tipo desta vez a aberração é tua e da próxima será minha…

Com todo respeito por alguns dos Conselheiros que assinaram o acórdão 632/2020, sinto um profundo nojo e total desprezo por esta decisão e por todos que a subscreveram.

“Tenho vergonha, muita vergonha e quebra-me de triste” com o que fazem com o poder que têm de decidir, de fazer e tornar um país inclusivo, quando a credibilidade bate no fundo é quase impossível recuperá-la.

E esta decisão que matou o PRA-JA à nascença, é um sapo que um cidadão minimamente lúcido, seja qual for a sua filiação política, não deve engolir e tolerar.

Porque nos condena a todos e põe em causa, de forma irremediável, a nossa crença num Estado Democrático e de Direito.

Põe em causa um dos pressupostos da Democracia pela qual lutamos, cada uma à nossa maneira, seja na militância política ou na cidadania activa.

Porque, acima de tudo, acreditamos numa terra independente que fazemos todos os dias Pátria.

Alguém acredita que é possível que Abel Chivukuvuku tenha tido dificuldade em conseguir 150 assinaturas válidas por cada uma das províncias do nosso País?

Alguém acha normal que apenas em processos onde está Abel Chivukuvuku é que chegam ao Tribunal Constitucional “cartas anónimas” que se tornam decisivas para chumbar os projectos em que “Abel” está envolvido?

Lembram-se das cartas dos líderes dos partidos políticos que impediram a coligação eleitoral CASA-CE de se transformar em Partido?

Pois então agora são dois ofícios: (i) Administração do Kilamba Kiaxi e da (ii) Administração do Libolo que “levaram ao conhecimento do Tribunal a dizer que os seus munícipes não declararam apoio ao PRA-JA”?

Tenham alguma vergonha na cara meus senhores.

Hã Porque “diante destes irrefutáveis dados oficiais dos órgãos administrativos (…) não pode este Tribunal compactuar com a ilegalidade”.

Como diz a minha madrinha: “oh!, come on…”, querem transformar-nos em paspalhos? Essa não pega.

A predisposição para chumbar estava tão à flor da pele que até vêm confundir “inexistência de requisitos” e “incumprimento dos limites exigidos pela lei” com violação da lei, e têm o desplante de vir dizer “a recorrente não fez trabalho de casa”, passando dos juízos éticos e de acordo com a lei para os juízos morais.

Conversa fiada. Conversa fiada de quem tem o dever de fundamentar as decisões fazendo uma leitura da Constituição em conformidade com os instrumentos internacionais e não o faz, prefere fazê-lo dando credibilidade aos ofícios de administrações municipais, cujos administradores, são de nomeação de quem quer o “status quo” da política nacional.

Cuidado para não vos transformardes naqueles que tornam impossível uma revolução pacífica do estado da arte em Angola, sob pena de tornardes, com o descrédito da justiça constitucional, inevitável outro tipo de revolução.

A crise pandémica que vivemos, é mais do que uma crise de saúde pública, e já tantos o disseram e o escreveram, é uma crise de valores. Que põe a nu vulnerabilidades estruturais nos sectores da saúde e da protecção social ou da economia.

Mas o juízo, quando for feito, será político, não tenham dúvidas. E por esta andar, a covid-19 é o inimigo invisível de um poder que age sem norte, com total desrespeito pelos seus cidadãos, tanto nos aspectos formais como nas questões de fundo, passando por cima da ‘bússola’.

Ou seja, a Constituição da República de Angola nas palavras do Presidente João Lourenço.

Reginaldo Silva

Ponto prévio: O Tribunal Constitucional pode “liquidar” um processo de legalização de um partido caso apenas uma das assinaturas das 7.500 exigidas pela (draconiana) lei não seja aceite ou considerada não conforme.

Basta querer. Na maior das calmas.

É muito fácil neste tipo de processo encontrar falhas.

Adivinhamos, sem recurso a qualquer tipo de sortilégios, que este rigor da dura lex/sed lex ao longo da sua história iniciada em 2008, nunca foi aplicado pelo Tribunal Constitucional e por razões que se percebem perfeitamente nas condições do país real, falamos concretamente do “país administrativo”, uma verdadeira pérola (entenda-se pesadelo) em matéria de dificuldades e bloqueios, onde metade da sua população nem sequer BI possui.

Dito isto, só hoje fiquei com uma ideia aproximada de como tramitou o recurso apresentado pela Comissão Instaladora do PRA-JA ao plenário do TC (depois do último chumbo administrativo do seu Presidente) e que resultou no acórdão que já está publicado na sequência de um rocambolesco processo.

Mais um, para não variar.

Uma tramitação que, de acordo com as minhas informações, apenas vem confirmar os meus piores pressentimentos em relação a mais esta “crónica de uma morte anunciada”.

Ainda cheguei a admitir que em sede deste recurso para os 11 Conselheiros do TC (plenário) o procedimento fosse o mais inclusivo e transparente possível para se tirarem todas as dúvidas (e mais algumas) em relação às alegadas inconformidades detectadas no Gabinete dos Partidos Políticos do TC que depende directamente do seu Presidente.

Não foi isto que aconteceu.

Diz-se que não há bela sem senão.

Também neste processo tivemos a confirmação deste provérbio.

O voto solitário e contrário de Josefa Webba acabou por estragar a “festa” desta “crónica aragoniana”.

Mesmo não tendo feito, sabe-se lá porquê, a sua declaração de voto vencido, que não é obrigatória, a posição da Conselheira Webba é demasiado sintomática sobre o que realmente se passou no TC, para não ter uma dimensão política mais abrangente em relação a este primeiro desafio mais estruturante do “novo paradigma”.

Celso Malovoneke

Não sou jurista, logo não estou qualificado para opinar sobre o “chumbo” ao PRA-JA.

Mas o TC tem que explicar muito bem, tim-tim por tim-tim, como foi que isso aconteceu. Do ponto de vista ético, político e democrático está muito malcheiroso e cria um profundo desconforto aos cidadãos.

A Angola que sonhamos merece melhor que isso. Os nossos filhos e netos merecem infinitamente mais que isso…

Félix Miranda

Com todas as peripécias e incongruências de que somos servidos, mesmo se não se tratasse do PRA-JA; mesmo se tivesse colhido um milhão de assinaturas com todos os seus assinantes perfilados junto das portas do Tribunal Constitucional essas fichas seriam invalidadas muito provavelmente com alegações de que os subscritores não são angolanos.

A sentença está decretada. Eliminar politicamente Chivukuvuku. Isto começa a ser notório desde a criação da CASA-CE; atingiu o rubro com a rocambolesca expulsão da CASA-CE que aliás, os moldes em que ocorreu não diferem muito dos actuais e agora com este CHUMBO não do PRAJA, mas justamente o punhal contra Abel Chivukuvuku. Esta é a finalidade: Anular o Abel.

O resto, é mesmo resto.

Mas o TC ousa defraudar, desacreditar e desautorizar em público os órgãos de soberania sobretudo esses que deveriam ser o garante da segurança nacional contra a invasão pacífica do nosso país? Cito os notários e administrações.

Indo para a jurisprudência, num País como Angola com um número de iletrados que se conhece; mesmo se isso tenha acontecido, os juízes vão queimar mais de 32 mil assinaturas colhidas por um Abel Chivukuvuku?

Haja moral e bom senso. Porque se não, podemos dizer: “A Pátria está em perigo”!

Salas Neto

Algo não bate bem no segundo chumbo que o TC deu à tentativa de legalização do PRA JÁ do Abel Chivukuvuku, por inconformidades das assinaturas que a sua comissão instaladora apresentou, segundo justificação daquela instituição.

Ora, partindo-se do pressuposto de que tais inconformidades nos levam inelutavelmente a algum tipo de falsificação de documentos, sempre vale perguntar por que razão é que o Tribunal Constitucional não faz desencadear um processo para responsabilização criminal dos autores morais e materiais desse ilícito.

Pelo que ouvi do mano Chivas ontem no noticiário das 13 da Rádio Nacional, para além dele próprio como mentor da trama toda, a estas horas já deviam estar também na cadeia os seus correligionários da Comissão Instaladora e os notários que validaram fraudulentamente a documentação em primeira instância, digamos. Portanto, se assim não acontecer, é porque os documentos não são nada falsos.

Sinceramente, eu não “consego” de entender essa malta. ou, como diria o mais-velho Jonas, estes tipos do MPLA já não mudam.

Eliezer Capolo

O Tribunal Constitucional é uma porcaria, é uma instituição nojenta que envergonha o país, Quintino Moreira que não têm apoiantes, não sabemos onde tirou assinaturas, criou bandeira semelhante à da UNITA algo proibido pela lei dos partidos políticos mesmo assim o Tribunal legalizou o partido dele, Abel Chivukuvuku que tem milhares de apoiantes, apresentou quase 35 mil assinaturas, tem representações em toda extensão do território de Angola até na diáspora o TC não legaliza?

José Dumilde Biala

Em nosso entendimento a decisão foi bem fundamentada, mas o facto de o Dr. Juvenis Paulo se ter pronunciado antes, numa matéria que não tem competência (uma vez tratar – se de recurso que é competente para se pronunciar sobre ela simplesmente o plenário do TC), colocou em causa não só a seriedade da própria instituição (Tribunal Constitucional) como também a decisão tomada sobre o recurso interposto pelo recorrente, na medida em que passa a ideia de que o Dr. Juvenis Paulo ao se pronunciar antes, ou influenciou na decisão dos juízes conselheiros do TC, ou foi informado sobre a decisão que seria tomada.

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