Angola? “Não livre”

O mundo atravessa, pelo 14.º ano consecutivo, um clima de diminuição dos direitos políticos e das liberdades civis, deteriorando os regimes democráticos, aponta o relatório da Freedom House, “Freedom in the World 2020”, hoje divulgado. E se isso acontece com as verdadeiras democracias, como será em regimes como o de Angola em que existem vários partidos mas em que só um (o MPLA) manda? Neste caso desde 1975. Angola (32 pontos) e Guiné Equatorial (6 pontos) são os dois países lusófonos classificados como “não livres”.

O relatório Liberdade no Mundo 2020 explica que a democracia está a “ser atacada” em todo o mundo, e que os efeitos são progressivamente mais evidentes em países com regimes autoritários como a China, a Rússia e o Irão, mas também em países com um historial de defesa dos direitos e liberdades.

“O relatório mostra claramente, mais uma vez, que as democracias estão em declínio”, conclui Mike Abramowitz, presidente da Freedom House, uma organização não-governamental que investiga e advoga casos de democracia, liberdade política e direitos humanos

O documento revela que os movimentos de protesto que se multiplicaram em grande escala em 2019 são prova de que as pessoas se sentem cada vez mais descontentes com os regimes políticos em que vivem.

Num balanço do ano de 2019, o relatório Liberdade no Mundo 2020 diz que os revezes nos sistemas democráticos excederam os avanços, numa proporção de dois para um, fazendo com que esse tenha sido “o 14.º ano consecutivo de deterioração da liberdade global”.

Dos 195 países avaliados para o relatório, 83 (43%) foram classificados como livres, 63 (32%) como parcialmente livres e 49 (25%) como regimes não livres, revelando que a presença de países livres diminuiu três pontos percentuais na última década, enquanto a percentagem dos países parcialmente livres e não livres aumento dois e um ponto percentuais, respectivamente.

Os países com melhores progressos e com maiores declínios encontram-se concentrados em África: Sudão, Madagáscar e Etiópia registaram fortes melhorias nos seus sistemas políticos; Benim, Moçambique e Tanzânia sofreram fortes revezes.

Portugal manteve a pontuação de 96 (em 100), mantendo a sua posição como país livre, obtendo apreciação muito positiva, quer ao nível dos direitos políticos (39 em 40) quer ao nível das liberdades cívicas (57 em 60).

O relatório também encontrou uma erosão global alarmante no compromisso dos governos com o pluralismo: uma característica definidora da democracia liberal.

Grupos étnicos, religiosos e outras minorias sofreram o impacto dos recentes abusos estatais nas democracias e nos países autoritários, conduzindo a uma maior ameaça da liberdade das populações.

Os dois exemplos mais flagrantes pelo relatório dizem respeito à China – onde a campanha plurianual de aniquilação cultural do regime contra a minoria Uighur e outros grupos predominantemente muçulmanos ficou bem marcada – e à Índia, que obteve o maior declínio entre as 25 democracias mais populosas do mundo no relatório deste ano.

A Índia há muito tempo que é vista como um potencial contrapeso democrático da China autoritária na região indo-pacífica, mas os alarmantes afastamentos do actual Governo indiano das normas democráticas está a diminuir as diferenças entre os regimes de Pequim e de Nova Deli.

Também o processo democrático nos Estados Unidos está a ser ameaçado com as novas tendências evolutivas, segundo o relatório da Freedom House.

Embora os EUA tenham mantido a pontuação na lista das democracias saudáveis, a verdade é que caiu oito pontos, numa escala de 100, nos últimos 10 anos e não se detectam sinais de recuperação.

Pelo contrário, diz o relatório, o ano de 2019 revelou “sinais preocupantes” de enfraquecimento dos direitos civis nos Estados Unidos, com evidências de interferência nos processos eleitorais e com crescentes confrontos entre o poder executivo e o poder legislativo, como ficou patente no ‘impeachment’ ao Presidente Donald Trump.

“A Índia e os Estados Unidos são as maiores e talvez as mais influentes democracias do mundo, e o seu desvio dos ideais democráticos liberais está a enviar exactamente a mensagem errada”, comenta Mike Abramowitz.

O relatório da Freedom House refere que os protestos em massa que se multiplicaram em várias regiões do mundo, em 2019, provocaram resultados muito variados para a pontuação geral de cada país.

Hong Kong, onde os protestos sociais foram particularmente violentos, caiu quatro pontos na sua apreciação, mas a pontuação do Sudão subiu cinco pontos, desde que os protestos contra o regime subiram de tom, abrindo caminho para um Governo de transição e de partilha de poder.

Nós por cá… cada vez mais pior

Moçambique (liderado pela partido irmão gémeo do MPLA, a FRELIMO, também desde a independência) foi um dos países onde a democracia mais recuou no ano passado, segundo conclusões do relatório sobre a liberdade e a democracia no mundo, hoje divulgadas pela Freedom House.

De acordo com o relatório “Freedom in the World 2020”, os países com os maiores retrocessos e progressos em termos de liberdade e democracia no ano passado localizam-se todos em África.

“Benin, Moçambique e Tanzânia foram penalizados por eleições fraudulentas e a repressão de dissidentes por parte do Estado, enquanto o Sudão, Madagáscar e a Etiópia beneficiaram do progresso em matéria de reformas e de leis mais democráticas”, adianta o documento.

Moçambique perdeu seis pontos em relação ao relatório anterior e surge classificado como “parcialmente livre”, com uma pontuação global de 45 em 100 pontos possíveis, conquistando 14 pontos em direitos políticos e 31 nas liberdades civis.

A pontuação global combina a avaliação da prestação dos países em matéria de direitos políticos (0-40 pontos) e liberdades civis (0-60). O Benim sofreu uma queda de 13 pontos e a Tanzânia de 5 pontos.

Estes três países contam-se entre os 12 estados que maiores quebras sofreram em 2019, grupo que inclui também a Bolívia, Burkina Faso, Chile e Índia (-4 pontos), Guiné-Conacri, Haiti, Mali, Nigéria e Venezuela (-3 pontos).

Numa avaliação a 10 anos, Moçambique regista uma quebra de 14 pontos na classificação global e integra o grupo dos 29 países que mais pioraram as suas prestações ao longo da década.

No sentido oposto, a Guiné-Bissau (+4 pontos) está entre o grupo de países que mais melhoraram a avaliação no que respeita à liberdade e democracia em 2019 relativamente ao ano anterior.

Etiópia, Madagáscar e Sudão (+5 pontos), Macedónia do Norte (+4 pontos) e República Democrática do Congo e Esuatini (+3 pontos) integram também este grupo.

Classificada como “parcialmente livre”, a Guiné-Bissau conquistou uma pontuação global de 46 pontos, com 17 pontos nos direitos políticos e 29 nas liberdades civis.

Os países considerados “livres”, onde se incluem os lusófonos Portugal (96 pontos), Brasil (75 pontos), Cabo Verde (92 pontos), São Tomé e Príncipe (84 pontos) e Timor-Leste (71 pontos) têm classificações globais acima dos 70 pontos.

Angola (32 pontos) e Guiné Equatorial (6 pontos) são os dois países lusófonos classificados como “não livres”. Brilhante. Parabéns ao MPLA. Para quê mudar o que está… mal.

Sobre Angola, a Freedom House aponta que a dinâmica e os progressos registados após a mudança de liderança em 2017, abrandaram em 2019 e que “os resultados da agenda de reformas do Presidente João Lourenço, com ênfase na luta contra a corrupção, ainda não foram plenamente concretizados”.

A Guiné Equatorial está entre os 10 países “piores dos piores”, ou seja, entre os menos livres dos 49 países considerados “não livres”, com uma pontuação de zero nos direitos políticos e 6 nas liberdades civis. Dos 195 países avaliados, 43% são considerados “livres”, 32% “parcialmente livres” e 25% “não livres”.

A Europa é a região com maior percentagem de países “livres” (81%) e o Médio Oriente e Norte de África a zona com menos (11%).

Globalmente, a Freedom House conclui que a “democracia está sob ataque em todo o mundo” e que os efeitos “são evidentes não só em Estados autoritários como a China, Rússia e Irão, mas também em países com um longo historial de defesa dos direitos e liberdades fundamentais”.

“Embora os movimentos de protesto em todas as regiões tenham ilustrado a exigência popular generalizada de melhor governação, ainda não inverteram o padrão geral de declínio da liberdade”, aponta a organização.

O relatório denuncia também o que considera “uma alarmante erosão global” no compromisso dos governos com o pluralismo, apontando como “exemplos mais gritantes” a China, por causa da perseguição à minoria Uighur e a outros grupos predominantemente muçulmanos, e a Índia, que sofreu o maior declínio entre as 25 democracias mais populosas do mundo no relatório deste ano.

Folha 8 com Lusa

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