Vinte (20) milhões de pobres (independentes há 44 anos!)

O Povo, sedento do que é básico e elementar: liberdade, comida, educação, saúde e água, não sabe, mesmo e sobretudo depois de 11 de Novembro de 1975, data da Independência partidocrata, proclamada pelo presidente do MPLA, ao invés do Presidente da República, o que é Angola.

Em 2019, pese o alegado multipartidarismo, com o partido do regime elevado a primeiro órgão do Estado, em 44 anos, em função da fome e discriminação, a maioria autóctone desconsegue afirmar se a Angola actual é uma extensão da anterior província ultramarina de Portugal, uma coutada das empresas petrolíferas, concessão do Estado do Vaticano ou futuro protectorado do Fundo Monetário Internacional (FMI).

Neste oceano a resposta emerge, vaga, inconsistente, imprecisa, pelo retrocesso na vida de milhões, pese serem, actualmente (44 anos) negros que estão à frente dos destinos de Angola, sem governo, mas capitaneados por um Titular do Poder Executivo que abocanha todos os órgãos de soberania, subvertendo a separação de poderes, tornando-se nessa atipicidade detentor de poder absoluto, superior ou equiparado ao das maiores ditaduras do planeta.

Esta realidade, ao que parece, não sairá do trilho, neste e no próximo mandato, por, declaradamente, não existir vontade política de João Lourenço alterar a actual Constituição atípica (já o afirmou publicamente), jogada na lama, por um anacrónico Acórdão do Tribunal Constitucional (um tribunal de especialidade), sem competência, para alterar, tão pouco adulterar (que o fez, dolosamente), normas jurídico-constitucionais, não sendo detentor de mandato do soberano e órgão de soberania.

Assim, a actual Lei Mãe (CRA) e este Acórdão (impede a fiscalização da Assembleia Nacional (parlamento) ao Titular do Poder Executivo), são um hino ao poder absoluto de um homem só e um risco à alternância democrática, pois tal como dizia Frederic Bastiat:

“Quando o saque se torna um modo de vida para um grupo de homens, eles criam para si próprios, no decorrer do tempo, um sistema jurídico que o autoriza e um código moral que o glorifica”.

A encruzilhada em que se encontram os angolanos, no registo de mais um ano de (in)dependência, não será diferente da anterior, onde a mola mestra, cingiu-se apenas numa mão cheia de ilusões ópticas, com exonerações e prisões selectivas, alegado combate à corrupção, ao nepotismo e caracterização dos maus como “marimbondos”, como se não fizessem parte todos da mesma organização ideológica, responsável por todos os desvarios.

Entre um calendário de promessas, regista-se o retorno aos casebres (raros os detentores de casa ou mansões), a crónica “esperança idosa” dos males (1975-2019); falta de água, nas torneiras e de luz, nos interruptores, quando Deus nos bafejou com uma das maiores bacias hidrográficas do mundo e um plano para a electrificação e distribuição de água domiciliar se esperava como prenda da nova aurora.

Mas, para piorar a sarrabulhada partidocrata, não houve subtracção dos dígitos, principalmente nos preços dos produtos da cesta básica, pelo contrário, o tomate, pão, sal, feijão, fuba, óleo, arroz, massa, não sairão tão cedo da linha vermelha, numa abjecta parceria com a inflação imposta contra os pobres, pelo BNA (Banco Nacional… do regime) e Ministério das Finanças, sob os nobres auspícios do FMI.

Com operações cosméticas, incapazes de produzir efeitos práticos, que não a “masturbação mental” de uns poucos incautos que acreditam num virar de página, com simples paliativos, ancorados numa carrancuda, parcial e obtusa ideologia partidocrata, quando os cidadãos carecem de uma luz no fundo do túnel, capaz de iluminar e aquecer corações, muitos dos quais, mais de quatro décadas depois, não sabem distinguir a diferença entre colonização e independência.

Por tudo isso era mister, depois das eleições de 2017, mais que a parafernália comunicacional, de descaracterização de quem estendeu o bastão, para continuidade da maratona.

Uma revolução ponderada e rigorosa, na ética dos agentes públicos impunha-se por parte do Titular do Poder Executivo, para o distinguir do condutor da carroça de loengos, com a implantação de novos métodos nas prioridades e aprovação de empreitadas públicas.

Os economistas e gestores mais avisados sempre tiveram uma pulga atrás da orelha em relação à capacidade da actual equipa económica (remodelada ou não) reverter o estado calamitoso do desenvolvimento. Muitos exigem a revogação dos últimos despachos presidenciais que autorizam uma série de obras inoportunas, que não vão gerar emprego seguro, nem retorno de investimento, logo deveria apostar-se em projectos de desenvolvimento onde o retorno de capital fosse um facto e a manutenção de empregos directos e indirectos, uma garantia absoluta.

João Lourenço seguindo em sentido contrário ao programa eleitoral do MPLA e mal aconselhado, correu o risco e esbarrou-se (apesar de avisado) na primeira esquina, comprometendo as promessas de uma forma diferente de gerir os bens públicos com imparcialidade, que o exercício impõe, evitando a repetição de afectação directa, “privilegiando os seus”, nas empreitadas (má prática), sem a realização de verdadeiros concursos públicos.

Mas, quando despachos presidenciais conferem a discricionariedade de escolha ao Gabinete de Obras Especiais (na dependência vertical do gabinete do Presidente da República), para a celebração de contratos directos, com empresas, previamente seleccionadas, “dos nossos camaradas”, na lógica da “polis-corruption”, que apenas troca 6 (seis) por meia dúzia (6).

Terá sido por amnésia ou induzido em erro, que o Presidente João Manuel Gonçalves Lourenço, sem concurso público, afectou duas obras milionárias à empresa OMATAPALO, de um “companhon de route”, Luís Manuel da Fonseca Nunes, membro do bureau político do MPLA e governador da Huíla (que detém, sem concurso público, o monopólio das obras naquela província, numa clara promiscuidade do agente público |dia| e agente privado |noite|), para a remodelação e reconstrução dos hospitais Sanatório e Américo Boavida, em Luanda, avaliadas em mais de 38 milhões de dólares (fonte das Finanças), demonstrando ter “MUDADO O QUE NADA MUDA”.

No dia 20 de Novembro de 2018, por sua vez, autorizou a remodelação e ampliação do edifício do Conselho de Ministros, que à luz da Constituição atípica, art.º 134.º, é um órgão auxiliar, logo com relevância relativa (acolhe reuniões dos membros do gabinete presidencial, para tomarem ciência do seu pensamento e políticas), gastando milhões.

Com mais esta megalómana opção, milhões de crianças mantiveram adiado o sonho de ler e escrever, trabalhadores, de receber salários atrasados, antigos combatentes, as pensões devidas e desempregados, emprego.

Novo peculato, nova corrupção

Exemplos. O Tribunal de Contas, liderado pela economista (?) Exalgina Gamboa, ex-deputada e dirigente do MPLA foi acusado de ter assinado um contrato, sem concurso público, avaliado em 5 (cinco) milhões de dólares, com a empresa Kazomo Solutions, alegadamente pertença de um, também, dirigente do MPLA, para gestão documental e da biblioteca. Ora no futuro, caso venha a ocorrer uma verdadeira mudança de regime, está garantida a evaporação de milhares de processos, envolvendo dirigentes do partido, actualmente, no poder, face à possibilidade do esvaziar de arquivos e provas documentais comprometedoras.

Por outro lado, violando a Constituição, art.º 10.º (Estado laico), quanto à laicidade do Estado: “A República de Angola é um Estado laico, havendo separação entre o Estado e as igrejas, nos termos da lei”, numa altura em que fechou outras confissões religiosas, o Presidente da República ofereceu a maior prenda de Natal à Igreja Católica, com a entrega de património, regalias públicas e um cheque de cerca de 300 milhões de dólares, mesmo não havendo entre a República de Angola e o Vaticano (onde agora está João Lourenço e visita oficial), um Tratado de Concordata. Com esta decisão, o Catolicismo passa, sub-repticiamente, a ser a religião oficial do Estado.

Através de vários despachos presidenciais, sempre sob a douta condução do Gabinete de Obras Especiais, a Sacyr Somague Angola e a Griner Engenharia, abocanharam a empreitada de 40.68 milhões de kwanzas, equivalente a 115 milhões de euros; a Casais Angola e a OMATAPALO coube-lhes 50.624 milhões de kwanzas, cerca de 145 milhões de euros, para a implantação de infra-estruturas na vila da Muxima; a Progest com 127 milhões de Kwanzas, 365 mil euros e a Dar Angola Consultoria com 699 milhões de Kwanzas, cerca de dois milhões de euros, receberam a bênção para construção do Santuário da Muxima, por sinal, uma padroeira mariana, das tropas coloniais portuguesas.

Depois desta doação, consignada no OGE (Orçamento Geral do Estado) de 2019, poderá a cúpula da Igreja Católica colocar-se, de peito aberto, ao lado dos pobres, na defesa da transparência na gestão da coisa pública e de um verdadeiro combate à corrupção?

Verdade ou mentira, o benefício a uma congregação religiosa, penalizará mais de 3.500.000 (três milhões e quinhentas mil crianças), que ficarão, por falta de verbas (?), fora do sistema de ensino, doentes dormirão no chão e corredores dos hospitais, por perca de 2.000 camas, 5 blocos operatórios, 500 micro e médias empresas, capazes de gerar mais de 200 mil postos de trabalho, tudo em benefício de uma padroeira criada e inspirada pelas tropas coloniais portuguesas, após a construção de uma fortaleza e a igreja Nossa Senhora da Conceição em 1599.

Falta de consciência patriótica

Houvesse higiene intelectual, respeito pela história e a memória dos nossos antepassados e a primeira decisão de um governo patriota e nacionalista, na vila da Muxima (que significa coração, na língua angolana Kimbundu) seria a construção de uma grande “ACADEMIA ou MUSEU SOBRE A ESCRAVATURA AUTÓCTONE ANGOLANA”.

Foi nesta bifurcação entre o Rio Kwanza e o Oceano Atlântico que partiram milhões de escravos, vendidos na lógica da acumulação primitiva de capital, para outros continentes, principalmente, a América, que para proteger os colonizadores e escravocratas, tinham de ser baptizados pela Igreja Católica, sob alegação de expulsarem do corpo dos “pretos” o demónio (linguagem inserida na Obra Portugal Missionário de 1928), para com o acto salvaguardarem o risco de naufrágio os navios negreiros.

A necessidade da alteração urgente da Constituição atípica, visa permitir, também, uma verdadeira despartidarização do aparelho do Estado. Uma visita da vice-presidente do MPLA, ao Hospital de Cacuaco foi mais uma demonstração da promiscuidade do partido no poder, quanto à utilização indevida de fundos públicos. Num de repente, as camas, as batas do corpo clínico tudo novo, com base em créditos, para mostrar uma imagem falsa da realidade quotidiana e, até a oferenda, exibida na comunicação social, disse uma fonte ao Folha 8, foi paga com dinheiro público, do Ministério da Saúde. Deveria ser proibido um partido brilhar com dinheiro dos contribuintes. Deveria, se Angola fosse um Estado de Direito

E para agravar ainda mais a crónica situação financeira, do país, o Despacho Presidencial n.º 3/19 autorizou a despesa e formalizou a abertura do procedimento de contratação simplificada para a empreitada de construção das instalações dos serviços de Saúde da Presidência da República, celebrado com a empresa Mota-Engil , e dos respectivos serviços de fiscalização, celebrado com a empresa DAR Angola Consultoria.

Com toda esta sarrabulhada estão invertidas as prioridades do Titular do Poder Executivo, o que não obsta a que o povo comemore, por cá, mais um dia da independência, enquanto o Presidente (dos angolanos do MPLA) o festeja em Itália.

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