O Presidente de Angola, João Lourenço, voltou hoje ao seu melhor: exonerou, por decreto, os secretários de Estado da Defesa, Águas e Obras Públicas, cargos para que foram nomeados em Outubro de 2017, indica hoje uma nota oficial. Se eu exonero, logo… existo, pensa – e muito bem – o também Presidente do MPLA e Titular do Poder Executivo.
Segundo um comunicado da Casa Civil do Presidente, João Lourenço exonerou, a pedido do visado, Gaspar Santos Rufino (secretário de Estado da Defesa), e por “conveniência de serviço”, Luís Filipe da Silva (Águas) e Fernando Malheiros José Carlos (Obras Públicas).
Para os respectivos lugares, o chefe de Estado nomeou José Maria de Lima (secretário de Estado da Defesa), que deixa a presidência do Instituto de Defesa Nacional, ligado ao ministério homónimo, Lucrécio Alexandre Manuel da Costa (Águas) e Carlos Alberto Gregório dos Santos (Obras Públicas).
A última mexida no Governo ocorreu há já bastante tempo – de acordo com a bitola do Presidente – a 2 de Janeiro deste ano, quando João Lourenço substituiu as ministras das Pescas e do Mar, Victória de Barros Neto, nomeando Maria Antonieta Josefina Sabina Baptista, e da Acção Social, Família e Promoção da Mulher, Victória Francisco Correia da Conceição, colocando no seu lugar Faustina de Almeida Alves.
Na mesma altura, o Presidente exonerou igualmente Carlos Alberto Jaime Pinto do cargo de secretário de Estado da Agricultura e Pecuária, tendo nomeado, por decreto, para as mesmas funções José Carlos Lopes da Silva Bettencourt.
O Governo, liderado desde Setembro de 2017 por João Lourenço e desde 1975 pelo MPLA, conta com 32 ministros (incluindo três de Estado), mais um do que o último de José Eduardo dos Santos, que foi chefe de Estado entre 1979 e 2017.
O Presidente também exonerou quatro vice-governadores provinciais, em Luanda e na Lunda Sul, também por “conveniência de serviço”, todos nomeados para as funções a 25 de Outubro de 2017.
No Governo Provincial de Luanda, João Lourenço exonerou o vice-governador para o Sector Económico, Júlio Marcelino Vieira Bessa; para os Serviços Técnicos e Infra-estruturas, José Paulo Kai, e para o Sector Político e Social, Ana Paula dos Santos Corrêa Victor.
Para os respectivos lugares, o Presidente angolano nomeou Lino Quienda Mateus Sebastião (vice-governador da província de Luanda para o Sector Económico), Elizabeth de Fátima Tavares Matos Rafael (para os Serviços Técnicos e Infra-estruturas) e Dionísio Manuel da Fonseca (para o Sector Político e Social).
No Governo provincial da Lunda Sul, João Lourenço exonerou Ofélia Madalena Jeremias Uqueve Xiri do cargo de Vice-Governadora para Sector Político, Social e Económico, nomeando, para o lugar, Cassongo João da Cruz.
Exonerações (também) com farda
No dia 23 de Abril de 2018, o Presidente João Lourenço exortou as novas chefias militares, que nomeou e empossou nesse dia, a trabalharem para a moralização da sociedade angolana, começando pela classe dos generais, a quem pediu “cabeça sã”. Isto, é claro, para além de uma aprimorada “Educação Patriótica”…
Ao discursar no Palácio Presidencial, em Luanda, onde deu posse às novas chefias das Forças Armadas Angolanas (FAA), o chefe de Estado sublinhou o empenho do seu unipessoal executivo na “luta pelo resgate de valores”, nomeadamente com a “necessidade da moralização” da sociedade do país.
“E gostaríamos que, também nesta nova conjuntura, as Forças Armadas ocupassem a primeira trincheira neste combate pela moralização da nossa sociedade”, apelou.
“A missão que deixo aqui aos mais altos responsáveis pelas FAA é a de trabalharem, sobretudo com a classe de oficiais, com a classe de generais, para que possamos garantir este nosso desejo. Uma vez que eles são a cabeça das Forças Armadas e só com uma cabeça sã conseguimos cumprir com os objectivos que nos propusemos alcançar e conseguiremos cumprir com o papel que a Constituição e a lei conferem às FAA”, apontou.
O Presidente exonerou também nesse dia 22 altos responsáveis, sobretudo oficiais superiores, em funções entre o Estado-Maior das Forças Armadas Angolanas e a Casa de Segurança.
As exonerações, bem como as 20 nomeações feitas, foram decretadas “depois de ouvido o Conselho de Segurança Nacional”, informou a Casa Civil, em comunicado.
António Egídio de Sousa Santos foi exonerado do cargo de Chefe do Estado-Maior General-Adjunto para a Área de Educação Patriótica e nomeado para suceder a Geraldo Sachipengo Nunda.
Também foi exonerado do cargo de Chefe do Estado-Maior General Adjunto para a Área Operacional e de Desenvolvimento o general José Luís Caetano Higino de Sousa, nomeado, por sua vez, director-geral do Serviço de Inteligência Externa.
Neste serviço de informação foi exonerado no mesmo dia, por decisão de João Lourenço, do tenente-general André de Oliveira João Sango, que tinha sido nomeado director-geral por decreto presidencial do dia 12 de Outubro de 2012, na presidência de José Eduardo dos Santos.
Na lista das exonerações divulgadas figurava ainda o general Marques Correia, até então segundo comandante do Exército, o general Matias Lima Coelho, Inspector-Geral da Defesa Nacional. Este último passou, por nomeação, a ocupar o cargo de Chefe do Estado-Maior do Exército, enquanto o general Marques Correia assumiu a função de Inspector-Geral da Defesa Nacional.
Já o general Sequeira João Lourenço, irmão do chefe de Estado, foi exonerado do cargo de secretário executivo da Casa Militar e nomeado chefe adjunto da Casa de Segurança do Presidente da República.
Unidade da Guarda Presidencial, gabinete de saúde da Casa de Segurança, gabinete de estudos de segurança da Casa Militar, Gabinete de Voo Presidencial da Casa Militar, Gabinete de Obras Especiais da Casa Militar, foram igualmente alvo de exonerações e nomeações pelo Presidente angolano.
Exonerar sempre, governar um dia… talvez
O Presidente, general João Lourenço, continua a blindar o seu histórico consulado dando prioridade máxima às exonerações e mínima (ou quase nula) à governação. Tudo normal, portanto.
A escolha do general António Egídio de Sousa Santos “Disciplina” não poderia, aliás, ser mais emblemática. Pôr no comando das FAA o seu chefe do Estado-Maior General adjunto para a Educação Patriótica, reflecte com exactidão o que João Lourenço quer dos militares para que estes o possam ajudar a “educar patrioticamente” todos aqueles que não são do MPLA e, ainda, todos aqueles que sendo do MPLA possam estar a pensar mudar de rumo.
Fará sentido, quase 44 anos depois da independência, 17 após a paz total, falar-se de “educação patriótica”? Ter um chefe do Estado-Maior General adjunto exactamente para a Educação Patriótica? Pelos visto faz, sobretudo como degrau que antecede a chefia das FAA. É claro que se na Coreia do Norte faz sentido, em Angola também faz, considera certamente o MPLA.
O chefe do Estado-Maior General adjunto das Forças Armadas Angolanas (importante: para a Educação Patriótica), general Egídio de Sousa Santos “Disciplina”, explica tudo.
Ou seja, devido à sua posição geoestratégica e às suas potencialidades em recursos naturais, Angola tem sido alvo de várias tentativas de desestabilização através do incentivo – escreveu em tempos a Angop – “de reformas correntes à desobediência e desacatos às autoridades legalmente instituídas”.
O general fez estas afirmações quando, em 2015, discursava na abertura do 6º curso de estratégia e arte destinado a oficiais generais e almirantes das Forças Armadas Angolanas.
Será então de concluir, ou não fosse o general Egídio de Sousa Santos “Disciplina” responsável pela “Educação Patriótica”, que por exemplo os nossos jovens activistas se inseriam nessa monumental e poderosa tentativa de desestabilização, exactamente por ausência da… educação patriótica.
De acordo com o oficial general, neste “sentido deve-se prestar maior vigilância a estes cenários para não permitir que a paz duramente conquistada à custa do suor e sangue de muitos filhos da pátria seja perturbada”.
Está bem visto. Provavelmente os jovens activistas (e não só eles) estariam, para além de um golpe de Estado, a preparar-se para a guerra, pondo a paz, “duramente conquistada à custa do suor e sangue de muitos filhos da pátria”, em causa.
O curso de “de estratégia e arte” enquadra-se nas perspectivas e estratégias de formação definidas pelo comando superior das Forças Armadas Angolanas e materializadas pelo Estado-Maior General por intermédio dos seus órgãos de ensino militar.
“Esta formação marca uma etapa importante no âmbito da implementação da directiva do Presidente da República e Comandante-em-Chefe das Forças Armadas Angolanas, José Eduardo dos Santos, que prevê um conjunto de tarefas concretas na perspectiva «Angola 2020», nas quais se destaca a formação contínua dos quadros a todos os níveis como premissa fundamental para a modernização da instituição castrense”, explicou na altura o general das FAA.
Hoje poderá dizer exactamente a mesma coisa. Só tem (como fizeram e fazem muitos outros ilustres políticos e militares) de substituir José Eduardo dos Santos por João Lourenço. O resto aplica-se na íntegra.
“Todavia, o sucesso de qualquer formação depende em última instância do engajamento efectivo que cada discente tiver no estudo das matérias que forem ministradas, além do factor coabitação entre docentes, discentes, conteúdo, métodos de ensino e aprendizagem”, afirmou o general Egídio de Sousa Santos “Disciplina”, justificando a cada vez maior necessidade de reeducar os angolanos. Sobretudo, ou exclusivamente, os que teimam em pensar pela própria cabeça.
Egídio de Sousa Santos “Disciplina” afirmou estar convicto de que as Forças Armadas Angolanas “estão no bom caminho no concernente à formação, produzindo valores que possam enobrecer as estruturas de ensino militar, a instituição castrense, e o país em geral no contexto interno e externo em última instância, o soldado que constitui a unidade de um todo que são as Forças Armadas Angolanas”.
Espera-se também que, para a completa segurança e desenvolvimento do país, todos bebam os “Princípios fundamentais e bases ideológica do MPLA”, e se inspirem – por exemplo – no “Discurso do Presidente José Eduardo dos Santos na abertura do VI Congresso do partido”.
Assim sendo, “Educação Patriótica” é sinónimo do culto das personalidades afectas ao regime do MPLA, banindo da História de Angola qualquer outra figura que não se enquadre na cartilha do partido que, cada vez mais, não só se confunde com o país como obriga o país a confundir-se consigo.
O oficial superior da tal “Educação Patriótica”, hoje Chefe do Estado-Maior das FAA, reconheceu então – e tudo continua mesma – que o primeiro presidente de Angola foi um grande estadista e político que contribuiu também para a libertação de outros povos africanos rumo à independência dos seus países.