Pescar com enxadas
e semear com anzóis

O vice-presidente do Banco Africano de Desenvolvimento (BAD), Sherif Khaled, disse hoje que a alta taxa de desemprego é uma das principais razões para Angola apostar na diversificação económica, devendo privilegiar a agricultura e pescas. Há décadas que se diz sempre a mesma coisa. Tantas quantas o MPLA está no Poder.

O dirigente do BAD com o pelouro dos resultados disse à Lusa que há um “consenso crescente” para um aumento de capital de 150% que permitiria empréstimos anuais de quase 10 mil milhões de dólares.

“Angola está a lidar com uma taxa de desemprego de 30%, e é uma das razões para diversificar a economia, já que o combate ao desemprego provou ser um desafio consistente”, disse Sheirf Khaled, em Abidjan, à margem da reunião extraordinária de governadores do BAD que aprovou o aumento de capital do banco para 208 mil milhões de dólares.

O banqueiro sustentou que “parte do processo de diversificação tem de servir para ajudar Angola a ser auto-suficiente em termos alimentares, não faz sentido o país importar metade dos alimentos que consome”.

Angola, acrescentou, deve “desenvolver a agricultura de forma significativa para ter uma maneira de combater os preços baixos do petróleo, para que o sector petrolífero não seja o principal condutor da economia”, um processo que, reconheceu, será longo.

“Angola tem potencial para tudo, tem uma força de trabalho relativamente bem educada, tem potencial para diversificar, especialmente na agricultura e nas pescas, mas agora, olhando para o crescimento do PIB [Produto Interno Bruto], o grande problema é garantir que o Governo continua a apostar na estratégia que tem seguido para promover a estabilidade económica, como tem feito até agora”, afirmou o vice-presidente do BAD com o pelouro da Integração e Desenvolvimento Regional.

Questionado sobre o que pode o Governo fazer agora, num contexto de desvalorização da moeda, crescimento económico negativo e dívida pública nos 90% do PIB, Sherif Khaled reconheceu que “o financiamento é um desafio significativo”, mas lembrou os envelopes financeiros do BAD, de 700 milhões de dólares (635 milhões de euros), e do Fundo Monetário Internacional, de 3,7 mil milhões (3,35 mil milhões de euros).

“Primeiro que tudo, Angola tem de pensar como criar riqueza através da promoção de um sector nacional que possa empurrar a economia, porque um dos problemas persistentes em África é que os governos detêm demasiados activos públicos que são os motores da diversificação económica, por isso tem de abrir o país ao investimento privado”, argumentou Khaled.

Este investimento privado, continuou, “não é apenas estrangeiro, o sector nacional é chave e é preciso desenvolver o sector privado, não só na área da agricultura, mas também nas pescas, que oferece oportunidades espectaculares na costa, e é uma área absolutamente importante quando se tenta avançar para a auto-sustentabilidade alimentar”.

O BAD, salientou, “está empenhado em apoiar o Governo de Angola para lidar com os desafios e garantir estabilidade macroeconómica, em conjunto com o Banco Mundial e com o FMI, que é um pré-requisito para conseguir ter um bocadinho de espaço orçamental para fomentar a diversificação económica”.

Por isso, concluiu, “o Governo precisa agora imediatamente de apoio da comunidade internacional, do BAD, do FMI, do Banco Mundial, para garantir espaço de manobra e continuar com as reformas estruturais como o programa de privatizações ou a introdução do IVA, que são exactamente as reformas que precisa de fazer para abrir caminho para aliviar o peso da dívida e começar a diversificação”.

Todos dizem o que o patrão quer ouvir

Em 14 de Dezembro de 2017, o gestor de concessões da petrolífera Sonangol, António Feijó Júnior, considerou que “o petróleo não pode ser o único recurso do país” e garantiu que as críticas das operadoras internacionais estavam a ser resolvidas. Ou seja, com a chegada ao Poder de João Lourenço todos estão a descobrir a pólvora…

“O petróleo não pode ser o único recurso do país, primeiro porque limita o próprio desenvolvimento, depois porque é um produto finito e poluidor, e Angola não pode ter só esse produto em comercialização, até porque há políticas energéticas mundiais que vão restringir o financiamento à indústria petrolífera”, disse António Feijó Júnior.

Entrevistado no dia do lançamento do livro “Petróleo, uma indústria globalizada”, na sede da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), o director do departamento da Sonangol considerou que a importância do “ouro negro” vai diminuir com o passar dos anos.

“A matriz energética vai-se alterar, hoje o petróleo tem muita importância mas não a terá daqui a alguns anos, o gás está a tornar-se mais importante, as centrais nucleares vão evoluir, e as fontes renováveis também, por isso Angola não pode continuar dependente” desta matéria-prima, sublinhou.

O melhor caminho, acrescentou, passa também pela necessidade de diversificar a economia, um desígnio que é agora partilhado por todos os angolanos: “Neste momento sente-se que as pessoas, o país no seu todo, está muito interessado em produzir e por as outras riquezas ao serviço do próprio país, o interesse na diversificação é agora mais acentuado”.

Já houve, admitiu, “falhas, não fomos bem sucedidos na diversificação, mas o caminho está traçado e agora continua, com mais acutilância e necessidade desde o choque petrolífero de 2014; antes tivemos outros choques mas a lição não foi bem aprendida, talvez porque o choque [dos preços baixos do petróleo] não foi tão longo”.

Os diamantes, os minerais e até a agricultura devem beneficiar das receitas provenientes do petróleo, cujo fim, defendeu António Feijó Júnior, é “impulsionar a diversificação e não continuar a ser a galinha dos ovos de ouro”.

Com que então… diversificar a economia?

A apertou. O regime espirrou, constipando-se desde a queda preço do barril do petróleo. Ficou a nu (e assim continua) a incompetência e má-gestão de uma política económica desgarrada, assente em paliativos ideológicos. Ou seja, o MPLA no seu melhor?

No tempo das vacas gordas (alta do crude), tudo era feito ao acaso, sem planificação e ao sabor do saco azul, proveniente da receita do petróleo, que enriquecia dirigentes corruptos, com dinheiro do erário público, iludindo a maioria com obras descartáveis de betão.

Era a visão partidocrata de desenvolvimento dos gestores de pastilha. Não tinham um plano B, para uma eventual calamidade, natural ou financeira, como a que se conhece. Navegavam à vista e com uma corda ligada ao cais.

A criação do Fundo Soberano do Petróleo foi um verdadeiro embuste, pois mais de 5 mil milhões de dólares, da República de Angola (é assim tratada na Constituição), foram monarquicamente, colocados nas mãos de José Filomeno dos Santos, primeiro filho varão do então Presidente da República e actual Presidente do MPLA, que quando se esperava pudesse ajudar a tirar o país da liderança do “ranking” da mortalidade infantil, vieram a terreiro dizer estar o Fundo sem fundo para cumprimento de um dos seus objecto; a nobre empreitada de salvar vidas de crianças.

Este quadro mostrou a fragilidade de uma gestão danosa e dolosa, cuja responsabilidade criminal deve ser imputada a quem fez (e a quem permitiu que se fizesse, incluindo o ex-vice-presidente do MPLA e ministro da Defesa de Eduardo dos Santos, de seu nome João Lourenço) do erário público uma fonte de diversificação de dinheiro do Estado, aos ricos do regime, que roubam dinheiro aos pobres.

Com base nesta fórmula, temos que a ladainha da diversificação nunca visou, nem visará, projectar a economia, mas apenas a contínua delapidação da riqueza de Angola, cada vez mais concentrada em cerca de 0,5 % de dirigentes partidocratas.

O então Titular do Poder Executivo, José Eduardo dos Santos, foi desde 2010 um factor de bloqueio à verdadeira diversificação da economia, ao promulgar o Decreto Presidencial n.º 135/10 de 13 de Junho, ao impedir os pequenos e médios agricultores, o regente agrícola ou o engenheiro agrónomo, de produzirem mais e melhor escoando os produtos do campo, com a aquisição de uma carrinha de ocasião.

Um decreto deslocado, besta e sem justificativa, para um país sem indústria automobilística, quando os grandes produtores (Alemanha, França, Espanha, Estados Unidos da América, Japão, Reino Unido, etc.) não impedem a entrada de carros de 1950, desde que estejam a andar e com as inspecções em dia.

Com isso, parou o sonho do enfermeiro, do professor, do comerciante, do pastor e do técnico de laboratório, regressarem ao campo. Mantiveram-se mais uma vez em Luanda e noutras grandes cidades. Por outro lado, com o fim deste segmento de mercado, milhares de angolanos ficaram no desemprego, por conta e risco do decreto presidencial.

E demonstrando estar contra os pobres, quanto à diversificação da economia, escancarou as portas aos ricos (sócios estrangeiros da nomenclatura), às representações e stands de venda de automóveis novos.

Como acreditar na diversificação da economia quando se bloqueou a concessão de divisas nos bancos comerciais, aumentou os direitos aduaneiros, limitando, impedindo e colocando em risco a actividade liberal de milhares de empreendedoras e empreendedores que, semanalmente, cruzavam os céus internacionais em busca de pequenos negócios, geradores de emprego local?

A forma de gestão sectária, divisionista, parcial e partidária, que apenas beneficia os angolanos do MPLA é um dos maiores erros e empecilhos para o sucesso da diversificação, pois a concentração da riqueza nas mãos dos mesmos, não augura êxito. É como se os melhores jogadores de um país estivessem numa só equipa, naturalmente, o campeonato torna-se fraco, prejudicando, por via disso, a própria selecção nacional. Se, ao contrário de Eduardo dos Santos, João Lourenço fosse capaz de falar com toda a tribo empreendedora do país, assinando um pacto com os até aqui discriminados… seria possível dar a volta ao problema.

Dificilmente quem provoca uma crise económico-financeira tem receitas para reverter, na plenitude, a situação.

Folha 8 com Lusa

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