Governo lançou as redes
mas apanhou pouco peixe

A Administração Geral Tributária (AGT) de Angola recuperou apenas 15% dos 60.000 milhões de kwanzas (155,4 milhões de euros) das receitas em atraso desde que abriu o processo de regularização fiscal, em Janeiro. Dir-se-ia que os “marimbondos” estão a boicotar as “ordens superiores” baixadas pelo Presidente João Lourenço. Será?

Segundo a edição de hoje do órgão oficial do regime, o Jornal de Angola, o coordenador do Grupo Técnico de Implementação do Regime Excepcional de Regularização de Dividas Fiscais e Aduaneiras, Milcon Ngunza, indicou que o prazo para a adesão ao perdão fiscal termina na próxima segunda-feira, 1 de Julho.

Milcon Ngunza não indicou se, face aos resultados até agora obtidos – 9.000 milhões de kwanzas (23,3 milhões de euros) – o prazo para a adesão pode ser prolongado.

O responsável lembrou que o prazo final de pagamento é 31 de Dezembro, pelo que só nessa altura a AGT saberá ao certo o montante final arrecadado, uma vez que os contribuintes têm entre as opções pagamentos em prestações e outros, mediante compensação.

“Existem contribuintes que são credores do Estado que também devem aderir e se, na altura do pagamento, optarem pela compensação, há lugar para um cruzamento da dívida do Estado para com o contribuinte e a deste para com o Estado”, explicou.

Uma vez feita a adesão, segundo Milcon Ngunza, os contribuintes podem optar pelo pronto pagamento, remunerando o imposto a partir do momento da adesão, ou por um plano em prestações, desde a que a última seja paga até 31 de Dezembro de 2019.

Tratando-se de um regime que abrange tanto o lado tributário, do ponto de vista dos impostos, quanto o dos direitos aduaneiros, Milcon Ngunza disse que o plano em prestações dependerá de um calendário elaborado pelo contribuinte junto da Repartição Fiscal mais próxima do domicílio ou numa delegação aduaneira.

O regime permite ainda eliminar a dívida total, um caso em que a AGT assume a tarefa de congregar toda a dívida do contribuinte, dando-lhe a oportunidade de liquidá-la na totalidade para depois gozar desse regime excepcional e pagar sem juros e multas.

O valor global da dívida dos contribuintes na altura em que foram feitos os estudos preliminares antes de o regime entrar em vigor era de 323.000 milhões de kwanzas (836,8 milhões de euros), do qual foi separado, para efeitos deste processo, o montante correspondente a juros e multas (38%), pelo que a quantia a perdoar representa 124.000 milhões de kwanzas (321,2 milhões de euros).

A estimativa também pressupõe que, se pelo menos 30% dos contribuintes aderirem ao regime de perdão, até 31 de Dezembro, a AGT poderá arrecadar cerca de 60.000 milhões de kwanzas (155,4 milhões de euros).

“Esta é a meta que perspectivamos arrecadar com esse regime, já que existem ainda contribuintes que devem ao Estado e o grosso da dívida cinge-se a juros e multas, o que não é pouco”, frisou.

O regime excepcional estimula os contribuintes a pagarem os impostos sem juros e multas, para que possam viabilizar a produção e evitar baixas de rendimento da actividade económica, defendeu Milcon Ngunza, que considerou positivo o actual processo de adesão nas repartições fiscais.

A Lei 18/18, de 28 de Dezembro, que aprovou o Orçamento Geral do Estado (OGE) para o exercício económico de 2019, prevoa no seu artigo 17º o Regime Excepcional de Regularização da Dívida Fiscal, Aduaneira e à Segurança Social, com base na qual o Estado predispõe-se a perder em torno de 124.000 milhões de kwanzas (322 milhões de euros), que correspondem a 38% de juros e multas, do total que os contribuintes deixaram de pagar.

Milcon Ngunza referiu na altura que o Estado quer, com essa medida fiscal, evitar que as empresas possam cair na falência, bem como evitar a eliminação de postos de trabalho.

“É bom aderir, porque não há garantias que um regime desta natureza venha a ser contemplado futuramente. Para já, não há qualquer previsão de o Estado vir a repetir essa oportunidade de os contribuintes procederem à liquidação de dívidas sem juros, multas e custos processuais”, reforça Milcon Ngunza sempre que fala do assunto, recordando que os contribuintes podem pagar a dívida a pronto, isto no momento de adesão, ou em diferentes parcelas, até 31 de Dezembro.

Em linhas gerais, quem não se chegar à frente entra no regime dos pressupostos do Código Geral Tributário, do Código do Processo Tributário e, se também for caso de recurso, do Código das Execuções Fiscais.

Ora então… mais do mesmo

Em tempos, convém recordar em abono dessa “coisa” que tanto chateia o MPLA e que se chama “memória”, a Assembleia Nacional já tinha aprovado perdão fiscal para os contribuintes com dívidas ao Estado anteriores a… 2013.

A medida abrangia, recorde-se, dívidas relativas ao Imposto Industrial, Imposto sobre os Rendimentos do Trabalho por conta própria, Imposto do Selo, Imposto sobre a Aplicação de Capitais e Imposto Predial, explicitou na altura o director-adjunto da Unidade Técnica Executiva para a Reforma Tributária.

A medida envolvia o perdão das dívidas, juros e multas resultantes de incumprimentos praticados por contribuintes individuais e empresas “até 31 de Dezembro de 2012″.

Mas o perdão não era geral. “Não são beneficiadas por esta medida as empresas públicas ou as empresas privadas cujo capital seja maioritariamente público, nem as empresas do sector petrolífero e mineiro – sujeitas aos regimes especiais de tributação – e também as empresas cujo objecto social esteja na periferia desses sectores”, adiantou nesse tempo Gilberto Luther, hoje Secretário Executivo do Conselho Nacional de Estabilidade Financeira.

Apesar de admitir que este perdão fiscal representava uma “eventual perda de receita” para o Estado, também funcionará, disse, como um “estímulo à economia e ao consumo das famílias”, constituindo-se como uma “recapitalização das empresas.”

O perdão da dívida fiscal conferia benefícios aos contribuintes, bem como balizava o início da Reforma Tributária no país, afirmou no dia 11 de Dezembro de 2014, em Luanda, o técnico da Direcção Nacional de Impostos, Cláudio Santos.

Segundo Cláudio Santos, que falava no “workshop” sobre “As Implicações do Novo Pacote Tributário na Execução Orçamental”, com esse perdão, pretende-se que os contribuintes tomem consciência das suas obrigações fiscais, porque, a partir do próximo ano, a administração será mais rígida na sua actuação.

Acrescentou que o perdão fiscal incluído na Reforma Tributária, em curso no país, abrangia, entre outros, os impostos industrial, de rendimento de trabalho, de selo e sobre a aplicação de capital.

Cláudio Santos explicou que não estavam abrangidos pelo perdão fiscal as contribuições da segurança social e as dívidas aduaneiras.

“O perdão fiscal compreende, em termos concretos, o perdão de impostos de si mesmo, quer estejam ou não apurados, as multas que resultam de impostos apurados ou não e também os juros, quer os compensatórios, quer os de mora, que são calculados sobre os impostos na eventualidade do contribuinte não ter cumprido com as suas obrigações fiscais”, sublinhou.

Os beneficiários do perdão de dívidas fiscais, continuou, são todos os contribuintes, exceptuando aqueles que são classificadas como empresas públicas ou com o capital maioritariamente público, ou seja, àquelas em que o Estado participa com um capital superior a 50 por cento.

“Não estão também abrangidas no perdão de dívidas, as empresas que são tributadas no regime especial de tributação (empresas do sector petrolífero e diamantífero), nem aquelas cujo objecto social inclui actividades petrolíferas”, explicou.

O técnico fez igualmente saber que o perdão de dívidas também não se implicava aos processos que já tivessem tramitado em tribunal.

Folha 8 com Lusa

Artigos Relacionados

Leave a Comment