Entre Presidente do MPLA
e, às vezes, da República

O Presidente da República, João Lourenço, rendeu hoje (sábado), homenagem aos cerca de sete mil mártires da resistência do Cuito (Bié), sepultados no Cemitério Monumento. Ao falar de mártires da resistência, e não de vítimas da guerra, João Lourenço revelou, uma vez mais, que estava ali como Presidente do MPLA para homenagear os resistentes das FAPLA.

Em declarações à imprensa, após depositar uma coroa de flores, o Chefe de Estado, visivelmente comovido, disse tratar-se sempre de um momento de profunda reflexão para que a história não se repita.

“O compromisso que assumirmos sempre que viemos a este local é de tudo fazer para que a história não se repita. Portanto, o que passou passou, devemos mobilizar a população para os desafios do futuro, tendo como foco o desenvolvimento”, exprimiu João Lourenço, reafirmando – diz – a sua vontade de manter o Cuito como “Cidade do Perdão”, compromisso assumido na campanha eleitoral de 2017.

É (parte da) verdade. No discurso que fez em 2017, o então como candidato do MPLA, João Lourenço referiu-se ao passado histórico da província do Bié, fortemente atingida no período de guerra civil, considerando que a mesma “deveria passar para a história como a cidade do perdão”. Perdão que, contudo, o regime de João Lourenço confunde com submissão.

Para João Lourenço, a província do Bié e a sua capital, Cuito, são a “cidade do perdão, da tolerância”, por terem sabido “perdoar, serem tolerantes ao ponto de terem contribuído bastante para que a reconciliação nacional entre os angolanos vingasse”.

Reconciliação? Essa só contaram para João Lourenço que, como ministro da Defesa, deu o exemplo de que o mais importante para o regime é a razão da força e não a força da razão. Reconciliação pela força é como acontecia durante o colonialismo português, em que os chefes do posto apresentavam à sociedade os “voluntários devidamente amarrados”.

João Lourenço pediu o voto do povo do Bié, para acabar com a fome, pobreza e a miséria, que ainda grassa por algumas regiões do país, reactivando a agricultura e a indústria, promovendo milhares de empregos para a juventude. Isto é, o MPLA prometia nessa altura (tal como promete agora) fazer o que o MPLA não fez durante 44 anos.

Sem citar nomes, deixando a identificação para os militantes, o cabeça-de-lista do MPLA recordou que o país já teve num passado recente um potencial de indústrias, no entanto, destruídas em tempo de guerra. Guerra em que, como todos sabemos, só as balas, as bombas, as minas da UNITA matavam o Povo. As do MPLA, inteligentes, paravam e perguntavam: és Povo? Se era… elas desviavam.

“Vamos repor as indústrias, não só para que voltemos a produzir os bens industriais, mas sobretudo para resolvermos um problema, que é o emprego. Aqueles que destruíram a indústria e, consequentemente, destruíram os postos de trabalho que a indústria oferecia são os mesmos que hoje vêm dizer que a juventude não tem emprego”, acusou.

Ora aí está. A culpa só pode ser daqueles que destruíram tudo e mataram quase todos. A UNITA, é claro. Aliás, um dia destes ainda se provará que os massacres do 27 de Maio de 1977 foram levados a cabo pela UNITA sob comando de Jonas Savimbi. Mais atrasado está o dossier em que o MPLA trabalha para provar que Savimbi também foi responsável pelo holocausto nazi.

“Hoje com maior descaramento vêm dizer que a juventude não tem emprego. Vamos criar milhares de postos de trabalho para a nossa juventude. Os que destruíram os postos de trabalho vão ser penalizados e duramente penalizados (…) vamos castigá-los no voto, é a melhor forma de os castigar”, frisou o candidato que, pelos vistos, nada tem a ver com o passado do MPLA pois, asseguram-nos fontes do regime, só ontem (ou terá sido hoje?) chegou a Angola.

No cemitério Mártires do Cuíto, localizado na comuna do Cunje, sete quilómetros a norte do Cuito, estão sepultados perto de sete mil corpos, que haviam sido enterrados em locais impróprios, como jardins e quintais de residências, por força da guerra pós-eleitoral de 1992.

Erguido com a finalidade de permitir a passagem do testemunho às novas gerações, sobre os acontecimentos que levaram à morte de milhares de angolanos na década de 90, o cemitério ocupa uma área de 75 mil metros quadrados.

Possui três casas de apoio, sendo uma capela, casa administrativa e um museu que contém alguns artefactos encontrados junto dos corpos, nomeadamente retratos, documentos e restos do material usado durante a guerra.

O processo de construção do cemitério, exumação e inumação dos corpos decorreu de 13 de Outubro de 2003 a Novembro de 2004 e orçou aos cofres do Estado angolano cerca de 510 milhões de kwanzas.

O Presidente da República cumpriu hoje o último dia da sua visita de trabalho à província do Bié, iniciada sexta-feira, para se inteirar da sua situação socioeconómica e traçar soluções para os problemas da população.

No cumprimento da agenda da sua visita, João Lourenço inaugurou, sexta-feira, o Hospital Regional do Cuemba e reinaugurou o aeroporto Joaquim Kapango, na cidade do Cuito. Inteirou-se do andamento das obras do Hospital Provincial do Bié, erguido já em cerca de 70 por cento.

Ainda hoje, o Presidente inaugurou um sistema de captação, tratamento e distribuição de água à cidade do Cuito, para além de manter um encontro com a juventude e orientar a reunião do Conselho Provincial de Auscultação das Comunidades.

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