O antigo governador de várias províncias, nomeadamente da de Luanda, general Higino Carneiro foi constituído como arguido num processo de alegada má gestão durante o tempo em que exerceu essas funções na capital, entre 2016 e 2017, indicou hoje o advogado do também antigo ministro.
Arguido significa ser um sujeito processual, formalmente constituído como tal, ou contra quem haja sido deduzida uma acusação ou aberta a instrução, sobre quem recaiam, num certo momento processual, fundadas suspeitas de ter praticado ou comparticipado na prática de um crime. Nessa qualidade, goza de um estatuto especial, designadamente um conjunto de deveres e direitos, que lhe são explicados no acto da sua constituição formal.
O arguido goza, em especial, em qualquer fase do processo e, salvas as excepções da lei, dos direitos de estar presente nos actos processuais que directamente lhe disserem respeito; ser ouvido pelo tribunal ou pelo juiz de instrução sempre que eles devam tomar qualquer decisão que pessoalmente o afecte; não responder a perguntas feitas, por qualquer entidade, sobre os factos que lhe forem imputados e sobre o conteúdo das declarações que acerca deles prestar; escolher defensor ou solicitar ao tribunal que lhe nomeie um; ser assistido por defensor em todos os actos processuais em que participar e, quando detido, comunicar, mesmo em privado, com ele; intervir no inquérito e na instrução, oferecendo provas e requerendo as diligências que se lhe afigurarem necessárias; ser informado, pela autoridade judiciária ou pelo órgão de polícia criminal perante os quais seja obrigado a comparecer, dos direitos que lhe assistem; recorrer, nos termos da lei, das decisões que lhe forem desfavoráveis.
Segundo José Carlos Miguel, advogado do general, a decisão foi anunciada depois de Higino Carneiro, de 63 anos, ter sido ouvido, já na qualidade de arguido, pela Direcção Nacional de Investigação e Acção Penal (DNIAP) angolana, que o interrogou hoje durante cerca de sete horas e meia.
O advogado de Higino Carneiro adiantou que só na quarta-feira sairá um despacho da Procuradoria-Geral da República (PGR) para determinar as medidas de coacção.
José Carlos Miguel explicou que se tratou de um interrogatório sobre um processo que está em instrução preparatória, tendo sido feitas perguntas ao general das Forças Armadas Angolanas e deputado à Assembleia Nacional pelo MPLA, partido no poder desde 1975, sobre o período de exercício de governação da província de Luanda entre 2016 e 2017.
Questionado se a demora da audição revela alguma gravidade do processo, o causídico rejeitou a tese, salientando que foi somente “a necessidade de as coisas se esclarecerem”.
“É o tempo necessário para a bateria de perguntas que havia sido preparada”, disse o advogado de defesa de Higino Carneiro, que se recusou a avançar mais pormenores ao grupo de jornalistas que aguardava pela sua saída.
José Carlos Miguel reforçou que o seu constituinte foi “ouvido na condição de arguido, segundo uma notificação entregue hoje”.
“Vamos esperar. O processo está em instrução, são os primeiros passos”, disse, informando que o também antigo ministro das Obras Públicas de Angola, entre 2002 e 2010, não foi ouvido no âmbito deste cargo que exerceu.
“Eu não ouvi falar em desvio de fundos, também não ouvi falar de má gestão de erário público. Ouvi perguntas sobre determinados actos de gestão. Não posso falar de factos que têm a ver com aquilo que é o objevto do processo, infelizmente tenho essa limitação”, acrescentou.
Segundo o advogado, tudo quanto pode dizer é que na quarta-feira vão ser notificados do despacho decorrente do acto de interrogatório que houve hoje.
“Este acto tem de ser confrontado com determinada matéria que já tinha sido colhida antes, para o magistrado poder exarar o despacho. O processo está em segredo de justiça e ainda não sabemos que matérias haviam sido recolhida antes”, frisou.
Higino Carneiro, além de governador da província de Luanda e da Comissão Administrativa da Cidade de Luanda, exerceu as mesmas funções nas províncias do Cuanza Sul (1999-2002) e do Cuando Cubango (2012).
O deputado à Assembleia Nacional foi igualmente segundo vice-presidente do Parlamento angolano e entre 1991 e 1999 esteve ligado ao processo de negociações de paz para Angola como chefe adjunto da Comissão Político-Militar e vice-ministro sem Pasta do órgão Coordenador do Processo de Paz.
Em Agosto de 2018, o semanário português Expresso noticiou que as irregularidades detectadas pela Inspecção Geral da Administração do Estado (IGAE), durante as acções inspectivas realizadas em diversas entidades públicas, conduziram ao congelamento de contas bancárias dos ex-ministros Higino Carneiro e Manuel Rabelais, que já foi ouvido na DNIAP na passada terça-feira e que está proibido de sair do país.
Associado a suspeitas de má gestão, Higino Carneiro, segundo o IGAE, nunca justificou despesas de cerca de 30.000 milhões de kwanzas (85 milhões de euros ao câmbio actual) relativas a um período no tempo em que foi ministro das Obras Públicas, tal como exigiu na altura o IGAE.
Segundo indicou então o director do gabinete de Inspecção da IGAE, Tomás Gabriel, além das promoções indevidas e dos encargos com carros externos à instituição, o antigo Ministério das Obras Públicas não celebrou contratos com o pessoal eventual e deixou por justificar despesas naquele valor.
Tomás Gabriel relatou que, quando confrontado com estas irregularidades, Higino Carneiro “disse que não tinha tempo para dar justificações”.
Ainda referente a actos ocorridos em 2007, a IGAE constatou a existência de “remuneração ilegal” da Comissão de Coordenação do chamado Projecto da Linha de Crédito da China, bem como a aquisição de meios não inventariados e a execução de 64 contratos cujos vistos foram recusados pelo Tribunal de Contas.
No final do ano passado os instrutores da DNIAP, adstrita à Procuradoria-Geral da República, viram-se forçados a interromper as investigações à volta de irregularidades ocorridas no Governo Provincial de Luanda (GPL), ao tempo da gestão do general Francisco Higino Lopes Carneiro.
Segundo se apurou, os investigadores da DNIAP, assim procederam depois de terem realizado um rastreio das contas do GPL, em que terão dado conta de fundos que entraram para contas controladas pelo Comité Provincial do MPLA de Luanda, e por sua vez, usados para a campanha eleitoral deste mesmo partido, para pagamento dos seus fiscais eleitorais.
Diante desta “descoberta”, os magistrados sentiram-se de mãos atadas, sem ter outra opção que não fosse interromper as investigações para poderem realizar consultas junto dos seus superiores hierárquicos, e estes por sua vez pontualizarem o Presidente da República, a quem o Procurador-Geral da República, responde e depende estatutariamente.
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