Do rio Okavango às minas e aos chimunos do re(i)gime

O Governo angolano anunciou hoje o investimento de 60 milhões de dólares (54 milhões de euros) para a remoção de minas terrestres da bacia do rio Okavango, no âmbito de uma conferência em Londres.

O financiamento, a aplicar num projecto da organização não-governamental britânica Halo Trust ao longo de cinco anos, destina-se a limpar 153 campos minados dentro dos parques naturais de Mavinga e Luengue-Luiana, na província de Cuando Cubango.

Na região, disse James Cowan, presidente executivo da Halo Trust, vive 50% da população de elefantes do mundo e tem uma grande diversidade de vida selvagem, abrangendo vários países (Angola, Botsuana, Namíbia, Zâmbia e Zimbabué).

Todavia, a presença de minas terrestres impede tanto o trabalho de ambientalistas como o uso das terras para agricultura.

“A conservação natural não é apenas para proteger animais, mas também as pessoas. Se conseguirmos que as populações se desenvolvam e se possam dedicar a actividades como agricultura, podem deixar de recorrer à caça ilegal”, afirmou.

A região tem também potencial em termos turísticos, podendo beneficiar globalmente cerca de 500 mil pessoas, adiantou Adriano Gonçalves, director de Relações Internacionais da Comissão Nacional Intersectorial de Desminagem e Assistência Humanitária (CNIDAH).

A Halo Trust estima que sejam precisos mais 60 milhões de dólares para limpar os campos minados restantes junto aos parques naturais, tendo Cowan lançado um apelo a contribuições para completar o financiamento necessário.

O projecto foi revelado durante a conferência “Remoção de Minas, Conservação Natural e Desenvolvimento Económico em Angola”, organizado no Instituto Real de Relações Internacionais – Chatham House, em parceria com a Halo Trust.

Numa intervenção no final do evento, a ministra do Ambiente angola, Paula Coelho, vincou que este investimento não será apenas aplicado na desminagem, mas também na certificação de terrenos limpos, para atrair investidores.

Disse ainda que o Governo quer melhorar a gestão dos parques naturais e integrar antigos militares nas equipas, para que se possam tornar “soldados da natureza”.

“Angola tem o potencial de abrigar mais elefantes do que tem agora”, garantiu Paula Coelho, referindo o desejo de colaboração com outros países da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC) para facilitar a circulação destes animais na região.

De acordo com um relatório do grupo parlamentar interpartidário britânico sobre Angola, produzido pelo Chatham House, a província de Cubango Cubango é a mais afectada do país, representando 25% do total dos campos minados, correspondente a cerca de 22 quilómetros quadrados.

Até 2017, 15 anos depois do fim da guerra civil, a Halo Trust, juntamente com as organizações Mines Advisory Group (MAG) e Norwegian’s People Aid (NPA) tinham limpado 56% dos campos minados em Angola.

Na última década, o financiamento internacional caiu 80%, de um pico de 48,1 milhões de dólares (43 milhões de euros) em 2006 para um mínimo histórico de 3,1 milhões de dólares (2,8 milhões de euros) em 2017.

Para Angola atingir o objectivo de eliminar todas as minas terrestres até 2025 precisa de 275 milhões de dólares (245 milhões de euros), ou 40 milhões de dólares (36 milhões de euros) por ano.

Porém, o relatório estima que, à taxa actual de financiamento, o objectivo só será atingido em 2046.

A conferência foi concluída pelo príncipe Harry, que participou noutros eventos relacionados com a remoção de minas terrestres, seguindo os passos da mãe (a princesa Diana), que apadrinhou a campanha ao visitar Angola em 1997.

O príncipe recordou a visita que ele próprio fez em 2013 e o impacto que viu as minas terrestres terem não só na população, mas “no ambiente e na vida selvagem, e consequentemente na economia”, fazendo deste um “problema humanitário”.

Elogiando o Governo angolano por este “compromisso significativo”, o príncipe Harry saudou o “progresso foi que feito” mas lembrou que muito continua por fazer, lançando um apelo à comunidade internacional para “não deixe este trabalho por terminar”.

Seca, chuva, fome e… MPLA

No dia 27 de Fevereiro de 2018 o Vice-presidente da República recomendou, em Luanda, uma gestão correcta dos recursos hídricos, no sentido de assegurar o acesso das famílias e das comunidades à água potável. O que Bornito de Sousa habitualmente diz equipara-se ao que o seu camarada Bento Kangamba afirma, no caso quanto a ser necessário assegurar o acesso das famílias e das comunidades à electricidade… potável.

Bornito de Sousa discursava na abertura da primeira reunião ordinária do Conselho Nacional de Águas, um órgão (mais um) permanente consultivo do Titular do Poder Executivo, criado pelo Decreto Presidencial 76/17, de 5 de Abril, que aprova igualmente o seu regulamento.

O Vice-presidente falou da necessidade da municipalização da assistência aos equipamentos de energia e águas, da introdução de tecnologias inteligentes de medição e cobrança do consumo, de assegurar a sustentabilidade financeira das empresas prestadoras de serviços e de promover o adequado tratamento das águas residuais.

Pareceu até, durante breves momentos, que o Governo estaria mesmo preocupado e que, afinal, Angola era um Estado de Direito. Não era, infelizmente, o caso. A culpa não é, contudo, dos governantes do MPLA. É que, bem vistas as coisas, o partido de João Lourenço só chegou a Poder em… 1975. Falta-lhe, portanto, tempo para fazer que o deveria estar feito há décadas.

Bornito de Sousa defendeu soluções estruturantes que acabam por ser, a prazo, mais económicas do que repetidas medidas de emergência para as situações da seca e escassez de recursos hídricos no Centro e Sul do país que afectam a qualidade de vida das pessoas, culturas, animais e indústrias. Quem diria, não é?

O Vice-presidente referiu também que os objectivos de desenvolvimento sustentável para 2030 (ano em que previsivelmente o MPLA continuará no Poder) assinalam como prioridade garantir a disponibilidade e a gestão sustentável de água e saneamento para todos… mesmo (eventualmente) para os angolanos de segunda categoria.

A água é um bem essencial, mas escasso, sublinhou o Vice-presidente, adiantando (numa brilhante prova dos seus vastos conhecimentos) que apesar de 75% da superfície da terra ser coberta por água, apenas três por cento é de água doce e, desta, apenas um terço está acessível.

Bornito de Sousa disse também que Angola, felizmente, é um dos poucos países com uma rede de rios, lagoas, lagos e águas subterrâneas, uma costa de 1.750 quilómetros e uma zona económica marítima que pode estender-se até 350 milhas náuticas, no quadro de facilidades proporcionadas pela ONU.

Angola possui 77 bacias hidrográficas, das quais 47 principais, 30 secundárias, incluindo as que partilha com outros países, designadamente, as cinco bacias hidrográficas internacionais ou transfronteiriças dos rios Cunene, Cuvelai, Cubango/Okavango, Zaire/Congo e Zambeze.

Com toda a propriedade e sentido patriótico, Bornito de Sousa apontou a título de exemplo, o rio Zambeze que exige uma gestão partilhada entre a Angola, Zâmbia, Namíbia, Botswana, Zimbabwe e Moçambique, lembrando que o Conselho Nacional de Águas é um mecanismo para aplicação de instrumentos reguladores de gestão nacional e internacional partilhada dos recursos aquáticos.

Na sua primeira reunião ordinária, o Conselho Nacional de Águas apreciou os projectos, regime jurídico da taxa de captação de água e dos regulamentos do fundo Nacional de recursos hídricos e dos conselhos das bacias hidrográficas.

Estiveram também em análise os planos gerais de utilização e desenvolvimento das bacias hidrográficas dos rios Cuanza e Zambeze e os projectos estruturantes relacionados com a estiagem em províncias do Sul de Angola.

Coordenado pelo Vice-presidente da República, tem como atribuições, entre outras, assegurar a compatibilização da política de gestão de recursos hídricos com as políticas de ordenamento da orla costeira e promover a participação das comunidades locais na gestão dos recursos hídricos, através dos Conselhos Regionais de Bacias Hidrográficas.

Primaveras é que não

O Governo reconheceu no dia 11 de Novembro de… 2015 que o país tinha “muito por fazer”, mas alertando para a “oferta de primaveras” que resultaram em “infernos destruidores”.

A posição foi assumida na altura (2015) pelo ministro da Administração do Território, Bornito de Sousa, e então coordenador da comissão interministerial organizadora dos festejos da independência nacional, no discurso que marcou o acto central das comemorações.

Poderia igualmente ter sido feita pelo embaixador itinerante de Eduardo dos Santos, António Luvualu de Carvalho, ou pelo ministro da Defesa, João Lourenço.

Bornito de Sousa admitiu que em Angola, como em toda a parte, nem tudo é perfeito, havendo ainda muitas realizações por se executar.

Segundo o então ministro e hoje Vice-presidente da República, a paz foi a maior conquista alcançada pelos angolanos depois da proclamação da independência, salientando que as vitórias que se lhe seguiram são resultado do empenho e dedicação de milhões de angolanos e angolanas.

Para a tarefa do desenvolvimento, o político sublinhou a importância do papel da juventude angolana (certamente purgada de perigosos “terroristas”), que sob o espírito de unidade, é chamada a tratar dos desafios de Angola em prol do trabalho, nomeadamente do empreendedorismo, da diversificação da economia da melhoria do ensino e saúde, da transparência das instituições públicas.

Bornito de Sousa lembrou que as gerações do pan-africanismo, das independências, e de defesa da pátria e da integridade territorial também eram jovens, “mas a sua luta foi para a promoção do progresso e não do retrocesso, da provocação política, da injúria ou do apelo a mudanças desconformes ou contrárias à Constituição”.

Razão continua a ter Kim Jong-un pois ele cumpre a Constituição da República Popular Democrática da Coreia (do Norte) e, por isso, ninguém o pode criticar.

O governante angolano referiu ainda desconhecer “Estado algum no mundo, onde todos e cada um dos seus cidadãos estão unanimemente de acordo com os seus governantes”, realçando que em todos os casos o melhor caminho a seguir é o respeito pela escolha da maioria dos cidadãos feita em critérios da democracia pluralista e normas constitucionais. Sobretudo, como nos aconteceu mais uma vez em 2017, a batota e a fraude são instituições nacionais que só servem a um dono – o MPLA.

Luvualu de Carvalho não sabia, mas talvez Bornito de Sousa nos possa dar um exemplo – só um – de uma democracia que tenha tido mesmo presidente durante 38 anos e sem nunca ter sido nominalmente eleito.

“Os angolanos rejeitam assim as iniciativas no sentido de se cortar atalhos para perturbar a regularidade eleitoral já alcançadas a troco da oferta de primaveras, que noutros países demonstraram ser infernos destruidores”, destacou Bornito de Sousa.

Citando os exemplos da Síria e da Líbia (Luvualu de Carvalho acrescentou a Tunísia), países de médio desenvolvimento que “recuaram literalmente à pré-história”, Bornito de Sousa disse que os efeitos dessas primaveras seriam sempre “terríveis e devastadores para todos os angolanos e um retrocesso para as conquistas já alcançadas”.

“Os que nos estão a tentar vender essas soluções querem, na verdade, deitar fora o bebé com a água do banho, mas isso não acontecerá”, reafirmou, referindo que “a paz em Angola só se fez quando tratada entre angolanos e no respeito da Constituição e das leis”.

E Bornito de Sousa tinha razão. Por alguma razão chegou a Vice-presidente…

Folha 8 com Lusa

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