A ministra da Justiça portuguesa, Francisca Van Dunem, considerou hoje, em Luanda, que a visita de trabalho (subserviência será sinónimo de “trabalho”?) de três dias a Angola “excedeu” as melhores expectativas, pois trouxe resultados concretos na cooperação e aprofundou as relações políticas. O Departamento de Informação e Propaganda do MPLA não diria melhor.
“E xcedeu as minhas expectativas. Tinha boas expectativas relativamente a esta visita, mas devo dizer que saio daqui reconfortada, sobretudo com a ideia de que a visita excedeu tudo aquilo que pudesse pensar, não só em termos de proximidade emocional, mas também em termos de resultados operacionais, de trabalho, de procedimento, de actividades de cooperação entre os dois países. Foi um aprofundamento muito grande”, salientou Francisca Van Dunem.
Num balanço aos jornalistas, a governante portuguesa declarou que o essencial da visita tinha a ver com a necessidade que existia de concretizar as acções que estão previstas em protocolos. Certo. É isso mesmo que sempre dizem os políticos portugueses, governantes ou ex-governantes, que vêm a despacho a Luanda.
“Avançamos bastante na área da Justiça já com as equipas no que diz respeito ao registo e notariado e há também a ideia de trocarmos experiências no que respeita à introdução do novo mapa judiciário. Angola iniciou agora um processo, diria que experimental, uma vez que é um processo gradual, com a instalação de Tribunais de Comarca em todo o país”, afirmou.
“Fomos à província de Benguela, à cidade do Lobito, onde está já a funcionar o novo sistema de comarcas – estivemos nos dois [Lobito e Benguela] – em que há similitudes e daí a necessidade de troca de experiências”, acrescentou.
No domínio do Ministério do Interior angolano que, ao contrário de Portugal, tem sob tutela o sistema prisional e a (suposta) reintegração social dos detidos, foi também “fortalecida” a relação bilateral, estando previstas acções de cooperação nas duas áreas.
Francisca Van Dunem adiantou ainda ter tido uma última reunião, já ao fim da tarde, em Luanda, com o seu homólogo Francisco Queiroz, em que ficou a possibilidade, “para muito em breve”, de um encontro técnico de trabalho em Lisboa, a nível de secretários de Estado, para se dar continuidade ao trabalho.
“Do ponto de vista da cooperação entre os dois países, a visita foi profundamente frutuosa. Esta aproximação demonstrou também que as autoridades angolanas têm um grande empenho na cooperação com Portugal, que manifestou total disponibilidade naquelas matérias que Angola entenda que é útil”, referiu.
Questionada sobre o balanço político que se pode fazer da visita a Angola, Francisca Van Dunem considerou-a “relevante”.
“A visita foi relevante politicamente, na medida em que nos apercebemos que não só houve o envolvimento dos ministros da Justiça e do Interior, como também houve um encontro com o Presidente de Angola, que muito nos honra e que também mostra a dimensão que Angola dá a esta visita”, destacou.
Tratou-se da primeira visita que Francisca Van Dunem efectuou a Angola depois de ultrapassado o “irritante” (a submissão do Poder Judicial ao Político como questão “sine qua non” para o MPLA) nas relações luso-angolanas, relacionado com a tentativa de julgar em Portugal o antigo vice-presidente de Angola Manuel Vicente, razão pela qual a ministra portuguesa foi “intimada” pelo Governo de João Lourenço a adiar, em Fevereiro de 2017, a deslocação.
No entanto, em Novembro do ano passado, durante a visita de João Lourenço a Portugal, os dois governos assinaram, no Porto, vários acordos de cooperação que estavam por formalizar há vários anos, que Francisca Van Dunem rubricou com o ministro do Interior, Ângelo da Veiga Tavares, e com o chefe da diplomacia Manuel Augusto.
Os acordos assinados abrangem desde o intercâmbio na reinserção social de presos que tenham cumprido penas à colaboração entre a Polícia Judiciária portuguesa e o Serviço de Investigação Criminal (SIC) angolano.
Antes existia um conjunto de protocolos já assinados – apesar de os serviços prisionais, judiciários e de investigação criminal terem tutelas diferentes nos dois países -, que passam também pela colaboração entre os tribunais, além de outros ligados ao sistema judicial e judiciário.
Durante a estada em Luanda, Francisca Van Dunem efectuou também visitas de cortesia a órgãos do poder judicial do MPLA – Tribunal Supremo, Tribunal Constitucional, Tribunal de Contas e Procuradoria-Geral da República -, e proferiu uma palestra na Universidade Agostinho Neto.
Certamente que foi mera coincidência o adiamento da referida visita de Francisca Van Dunem ter surgido cinco dias após o Ministério Público ter acusado formalmente Manuel Vicente da alegada prática dos crimes de corrupção activa na forma qualificada, branqueamento de capitais e falsificação de documento.
Certamente que foi mera coincidência o adiamento surgir horas depois de alguma Imprensa, entre a qual está o Folha 8, ter recordado que ministra portuguesa é irmã de José Van Dunem, do sector ortodoxo e de obediência soviética do MPLA, partido no poder desde 1975, e cunhada da militante comunista Sita Valles, ambos mortos na sequência dos massacres de 27 de Maio de 1977, levados a cabo pelos radicais do MPLA, liderados por Agostinho Neto, alegando uma tentativa de golpe de Estado por parte de Nito Alves.
“Apesar da sua verticalidade e probidade jurídica, Francisca Van Dunem poderá ter como óbice – ainda que não da parte dela, mas de terceiros e externos – o facto de ser uma das vítimas do nunca esclarecido e sanado massacre do 27 de Maio”, escrevia i Folha 8 sob o título “Seja bem-vinda Senhora Ministra!”.
Como não acreditamos nestas coincidências, e de acordo com algumas das nossas fontes, a decisão das autoridades angolanas teve a ver com a ideia do regime do MPLA de que em Portugal tudo funciona à imagem e semelhança de Angola. Embora ande perto, não é bem assim. O caso Manuel Vicente violou as “ordens superiores” que o Luanda mandou para Lisboa.
Ao contrário do que se passa no reino do MPLA, o Governo português não controlava o Ministério Público. É que, apesar de toda a subserviência e bajulação do Executivo de Lisboa perante o regime do MPLA, ainda havia limites.
Havia mas, é claro, deixou de haver.
Folha 8 com Lusa
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