Amanhã, 4 de Abril, é dia da Paz e Reconciliação nacional em Angola. Nesta data, há 16 anos, o Governo do MPLA e a UNITA assinavam o acordo de paz em Luanda. O Governo e a UNITA assumiam solenemente o compromisso perante o povo angolano, que a guerra terminava, e começava uma era de segurança e de reconstrução do país.
Por José Marcos Mavungo (*)
A seguir, Angola viverá um “boom” económico graças ao petróleo (2002 – 2012); e ouvir-se-á, frequentemente, em quase todos os momentos e actos discursivos que a economia do país era “robusta” e que Angola se tornara em “um canteiro de obras”. Esta expressão se transformará em refrão proferida com todo o orgulho e vaidade pela classe política dominante.
As envaidecidas entidades revelaram-se imediatistas, e incarnarão uma progressiva hipertrofia do terciário e todo o tipo de desvarios – o poder absoluto e o culto do chefe, o feudalismo e a ditadura da maioria, a falta de transparência e da cultura da Lei, os instintos políticos e militares a subjugar a razão jurídica, a violência e o crime.
A tal ponto que acabarão por marginalizar dois elementos «sine qua non» para o desenvolvimento do país:
1) Instauração de um verdadeiro Estado de Direito Democrático, com instituições fortes que resistissem a paixões individualistas e interesses partidocráticos;
2) A produção interna que deveria realmente sustentar a robustez da economia, em especial as outras actividades produtivas (agricultura, indústria e criação de gado), e, assim, reduzir a dependência do petróleo.
Hoje, em Angola vive-se um período de vacas magras, uma situação de instabilidade social, uma paz precária. O país está configurado por uma deriva da corrupção, assumindo a forma de uma repugnante cleptocracia, que reduz as populações a uma vida caótica e indigna. Enquanto as disparidades de rendimentos aumentam de dia para dia e os níveis de extrema pobreza se acentuam, boa parte da classe política dominante está sendo apontada para passar na barra dos tribunais, responder acusações de corrupção e de desvios de fundos públicos.
Hoje, Angola tem o paradoxo da maioria das pessoas a viver na miséria num país potencialmente rico, com valores económicos aliciantes, mas que, nestes últimos anos de paz e de governação do MPLA, a condição de 70 % da população é de levar uma vida com menos de 2 dólares por dia. O cidadão é habitado pelo sentimento de que a paz não lhe enche a barriga, e que justiça social está longe de ser realidade em Angola.
Os homens do regime «en place» esqueceram-se nestes últimos 16 anos que o discurso sobre a paz, de per si, não é sinónimo de existência de uma paz de facto. E encararam o quotidiano como se a corrupção, a pobreza, as injustiças, as debilidades do sistema judiciário, o despotismo feudal não perigassem a paz.
Não tiveram em conta que «A Paz será obra da justiça, e o fruto da justiça será a tranquilidade para sempre» (Is.32, 17).
(*) Activista dos Direitos Humanos