“Operação Repatriamento” conta com ajuda europeia

O vice-presidente da República, Bornito de Sousa, solicitou hoje, em Viena (Áustria) o apoio dos Estados europeus para o sucesso dessa árdua missão que bem poderia, até porque está na moda e nos recorda a razão da força do MPLA, chamar-se “Operação Repatriamento” de capitais e fortunas que o regime considera terem sido ilicitamente adquiridas.

Ao intervir no Fórum África-Europa, sob os auspícios da Chancelaria da Áustria, país que exerce a presidência rotativa do Conselho da União Europeia, o governante angolano ressaltou que tal pressuposto requer a cooperação de todos os países, fundamentalmente europeus, incluindo o repatriamento para Angola de fortunas ilicitamente adquiridas e domiciliadas no exterior do país.

Ao ressaltar as reformas levadas a cabo pelo Executivo liderado pelo Presidente João Lourenço, Bornito de Sousa disse que as transformações operadas em Angola visam, no essencial, explorar o seu grande potencial económico, tecnológico, cultural, turístico e de infra-estruturas, a favor de um crescimento que privilegie os índices de desenvolvimento humano.

Perante vários líderes europeus e africanos, entre os quais o anfitrião, Sebastian Kurz, Chanceler da Áustria, Paul Kagame, Presidente do Ruanda e da União Africana, e Jean Claude Junker, Presidente da Comissão Europeia, Bornito de Sousa referiu-se às medidas adoptadas pelas autoridades angolanas com o objectivo de melhorar o ambiente de negócios e torná-lo atractivo ao investimento.

O aumento das exigências e do rigor das regras de transparência, boa governação e luta contra a corrupção estão entre as prioridades do Executivo, disse o vice-presidente da República.

Recorde-se que Parlamento do MPLA aprovou, recentemente, a Lei sobre o repatriamento coercivo e perda alargada de bens, que vai permitir o confisco de “bens incongruentes” domiciliados no exterior do país.

Bornito de Sousa informou os presentes que foi aprovada uma nova Lei do Investimento Privado, que afasta a exigência de participação de 35 por cento de capital angolano nas empresas, assim como uma nova Lei da Concorrência e a estrutura do poder judicial foi ajustada no sentido de agilizar a resolução de eventuais litígios no âmbito comercial e dos negócios.

Lembrou que foram introduzidas medidas para facilitação da obtenção de vistos para Angola, nomeadamente para a exploração do potencial turístico, com realce para criação do visto de investidor.

Segundo o vice-presidente da República, para a melhoria do ambiente de negócios, atrair mais investimento privado e aumentar a oferta de empregos, sobretudo, para os jovens, é necessário adoptar os padrões e referências estabelecidas pelos índices internacionais, incluindo os que regulam a cooperação entre a África e Europa.

Em relação ao aumento sustentado de empregos em Angola (500 mil na legislatura, prometeu João Lourenço) e África, em geral, defendeu que deve assentar na diversificação da economia e no afastamento de economias mono-produtivas, com dependência quase que exclusiva da exploração do petróleo.

A seu ver, “só criando condições sustentáveis de desenvolvimento, de empregabilidade e condições de vida condigna nos países africanos evitaremos a fuga de jovens e a emigração ilegal para Europa e mesmo para países africanos, como está a ser o caso de Angola”.

Por outro lado, Bornito de Sousa referiu que as infra-estruturas e os acordos comerciais têm uma importância fundamental para a promoção de trocas a nível de cada país, regional e africano, bem como na relação África-Europa e do comércio internacional, como o consequente impacto na criação de empresas e na sustentabilidade do desenvolvimento dos países.

O vice-presidente da República deu a conhecer que Angola está empenhada nos Acordos África-Europa e na criação, a curto prazo, da Zona de Livre Comércio da SADC e nas acções em prol da criação da Comunidade Económica Africana.

Disse ainda que a economia digital tem o potencial para África, com a vantagem da possibilidade de localização em áreas remotas e zonas rurais.

Repatriamento do… repatriamento

Importa recordar que o MPLA valeu-se do facto de ser dono da Assembleia Nacional para, mais uma vez e sempre que for conveniente (para o partido), ordenar a aprovação da Lei sobre o Repatriamento de Recursos Financeiros Domiciliados no Exterior do País.

Na impossibilidade de usar – como o MPLA – a razão da força, a UNITA bem tentou jogar a cartada da força da razão, com o seu projecto de Lei do Regime Extraordinário de Regularização Patrimonial (RERP). Não resultou. A ser aprovado este projecto da UNITA poderia mexer no bolso, pelo menos no bolso, dos altos dignitários do regime e isso o MPLA nunca permitirá.

“A aprovação da proposta e do projecto em sede da generalidade ocorrida na 2ª reunião plenária extraordinária que teve lugar no dia 22/02/2018 admitiu ambos para discussão na especialidade e a reunião tacitamente recomendou a fusão de ambos e retirou o carácter de urgência requerido pela UNITA para possibilitar uma ampla consulta da sociedade sobre o assunto. Neste período assistiram-se a movimentos de franjas da sociedade apelando por uma Lei de Repatriamento que não favorecesse a impunidade e que fosse de facto uma ferramenta potente no combate à corrupção”, escreveu o deputado da UNITA, Maurílio Luiele, em artigo publicado no Jornal de Angola no dia 19 de Maio de 2018.

“A forma como a maioria parlamentar conduziu a discussão na especialidade da proposta e do projecto de lei denunciava já a falta de vontade política do MPLA em ver aprovada uma Lei que fosse efectivamente contra a impunidade e as razões não são difíceis de adivinhar”, afirmou Maurílio Luiele, acrescentando “que a maioria não permitiu uma discussão a favor da fusão da proposta e do projecto, apesar dos reiterados apelos neste sentido, vindos da oposição, as Comissões especializadas acabaram por remeter para a plenária ambas propostas que como é óbvio, por tratarem da mesma matéria não poderiam ser as duas aprovadas”.

Quais as fragilidades da Lei sobre o Repatriamento de Recursos Financeiros Domiciliados no Exterior, segundo Maurílio Luiele?

– A Lei limita o seu âmbito a activos financeiros o que significa que com a publicidade que se fez da Lei alguém que eventualmente tenha ilicitamente domiciliado dinheiro no exterior se tiver convertido este dinheiro em património imobiliário, por exemplo, não terá nada para repatriar. Daqui a três anos fará a operação inversa e não terá obrigação de repatriar coisa alguma.

– O Governo declarou durante a discussão na especialidade que não sabe quanto dinheiro prevê repatriar ao abrigo desta Lei nem sabe sequer quem são os sujeitos que devem fazê-lo, ou seja, O Governo está na verdade a dar um tiro no escuro a ver se caça alguma coisa. Nada mais falso e irresponsável. A ser verdade, todo o exercício no sentido da aprovação da Lei terá sido fútil e absolutamente desnecessário.

– Os sujeitos candidatos a repatriar capital não são obrigados a fazer qualquer declaração estando toda a operação de repatriamento submetida à regra do sigilo bancário. Os valores repatriados ainda que obtidos e domiciliados no exterior de forma ilícita pertencem integralmente a pessoa que cometeu tais ilícitos, abrindo o Estado mão de qualquer ressarcimento. Isto, de qualquer ângulo que se analise é indiscutivelmente uma acção de branqueamento de capitais.

– A Lei promete, enfim o repatriamento coercivo se ao cabo de 180 dias as pessoas sem nome e sem rosto não procederem ao repatriamento dos seus activos financeiros domiciliados no exterior. Nada mais falacioso!”

Por outras palavras, “esta Lei é uma verdadeira oração à impunidade e, portanto, frontalmente contrária ao combate à corrupção. Não há de resto, combate à corrupção que resista à impunidade”,

Folha 8 com Angop

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