O estado da Nação
a Nação do Estado

O Presidente da República considerou hoje que o desenvolvimento da agricultura em Angola é um “imperativo nacional”, para garantir a auto-suficiência alimentar e reduzir as importações e os gastos em divisas. Ainda bem que João Lourenço se lembrou de algo que já é um “imperativo nacional” há… 43 anos.

Por Orlando Castro (*)

Discursando sobre o estado da Nação, que marcou hoje a abertura solene dos trabalhos da segunda sessão legislativa da IV Legislatura da Assembleia Nacional, João Lourenço apelou ao investimento no sector agrícola, lembrando as vantagens para o desenvolvimento económico de Angola fora da esfera petrolífera.

No quadro do Programa de Desenvolvimento Nacional (PDN) 2018/2022, com grande parte dos financiamentos disponíveis, João Lourenço lembrou as oportunidades de exploração agrícola existentes no país, sobretudo nas zonas rurais, salientando que a aposta vai também ajudar no combate à pobreza e à criação de emprego, garantindo, paralelamente, melhor qualidade de vida às populações.

É bom ouvir o Presidente. É mesmo elucidativo. É que ninguém sabia que a agricultura ajuda no combate à pobreza, na criação de emprego e na melhoria da qualidade de vida das populações. Finalmente ficamos esclarecidos…

Nesse sentido, João Lourenço lembrou que estão em curso programas integrados de desenvolvimento local, que, a par de reformas no plano social e educacional, trarão benefícios a médio e longo prazos para as populações mais desfavorecidas.

Na educação, o Presidente destacou os esforços do seu executivo na criação de condições para melhorar o ensino em Angola, quer através da aprovação do Estatuto da Carreira Docente, quer no estabelecimento das novas regras de procedimento para 20 mil novos professores, quer ainda na construção de novas escolas e na recuperação de outras, para melhorar o rácio professores/alunos e o nível de ensino.

Que maravilha. Quanto não vale ter um Titular do Poder Executivo que tem a capacidade de nos indicar o caminho do paraíso. Ou será que ele julga que somos todos matumbos? Não. Nem pensar. Ele está mesmo a dizer-nos que o anterior “escolhido de Deus” abriu o caminho para que, agora, ele (por ter sido o escolhido) vai abrir a porta do paraíso.

As mesmas medidas estão a ser tomadas, segundo João Lourenço, no sector da Saúde, em que o Governo aprovou o Regime Jurídico de Enfermagem e da Carreira Médica, estando aberto o concurso para a inserção de 7.000 novos funcionários médicos e de enfermagem, a par dos 33 projectos em 13 províncias que vão permitir construir ou renovar hospitais.

É claro que, sobretudo no campo da saúde mas também na agricultura, é preciso que os angolanos colaborem e perguntem não o que o Governo pode fazer por eles mas, isso sim, o que eles podem fazer pelo Governo. E o que o Povo pode fazer é, necessariamente, morrer sem ficar doente e viver sem comer. Simples.

Na área do ambiente, João Lourenço destacou as novas medidas de protecção da biodiversidade em Angola, nomeadamente as relacionadas com espécies em vias de extinção que, sendo símbolos nacionais, necessitam de ser revitalizadas, como a palanca negra gigante, o elefante, o hipopótamo e o rinoceronte.

Até dá gosto viver num país sob a liderança de alguém que se preocupa com as espécies em risco de extinção. Só por lapso o Presidente não incluiu nesta categoria uma outra espécie que também corre sérios riscos de extinção: os 20 milhões de angolanos pobres ou miseráveis.

Para João Lourenço, a questão da juventude está também no “centro das preocupações” do Governo, pelo que apelou aos jovens para se concentrarem no estudo, no desporto e no trabalho, aproveitando as novas tecnologias da informação como ferramenta para assegurar o futuro.

Excelente repto aos jovens. Só um Povo culto consegue ser livre e ter capacidade para pensar pela própria cabeça, agir em vez de reagir, pôr o poder das ideias acima das ideias de Poder, pôr a força da razão acima da razão da força. Não seria bem isto que João Lourenço queria dizer, mas…

Na cultura, o Presidente de Angola lembrou estar em curso a revitalização do sector, nomeadamente no reforço da política do livro e da leitura, enquanto, na área da comunicação social, saudou o “maior dinamismo da imprensa, mais próxima das populações”, destacando a legislação que irá permitir a abertura de novos canais de rádio e de televisão no país.

Cá estamos para ver quem tem razão. Se é o Presidente ou o secretário de Estado da Comunicação Social, Celso Malavoloneke, quando diz que o Governo quer um jornalismo mais sério, baseado no patriotismo, na ética e na deontológica profissional o que, aliás, é uma tese adaptada do tempo de partido único.

Cá estamos para ver se o Titular do Poder Executivo, através dos seus membros, sempre nos vai dar lições do que é um “jornalismo mais sério, baseado no patriotismo, na ética e na deontológica profissional”, ou se se limitará – com outros protagonistas e roupagens diferentes – à tese de que patriotismo, ética e deontologia são sinónimos exclusivos de MPLA.

O chefe de Estado lamentou ainda a “degradação precoce” de algumas infra-estruturas desportivas criadas recentemente, numa alusão aos estádios de futebol construídos para a Taça de África das Nações (CAN), competição que Angola acolheu em 2010, bem como de vários pavilhões multiusos, apelando a “contribuições” da sociedade civil e empresarial para que o problema possa ser ultrapassado.

Menos assertivo, o Presidente considera a possibilidade de implementar as autarquias em todo o país, num período de até 10 anos, se bem que a Lei sobre “Organização e Funcionamento das Autarquias Locais” prevê a implementação gradual das autarquias em 15 anos, privilegiando os municípios com maior desenvolvimento sócio-económico. Vamos então com calma, não é Presidente João Lourenço? Devagar, devagarinho, parados e entregues à vontade superior do que Deus, perdão, do que o MPLA quiser.

Segundo o Chefe de Estado, a primeira tendência aponta para a implementação gradual do processo, enquanto a segunda sugere as autarquias em simultâneo. Sobre a segunda, o Presidente disse (e todos sabemos o significa de “disse” no contexto de quem manda no país) que os seus defensores descuram o facto de ser a primeira experiência no país, que tem 164 municípios.

Noutra frente de combate, João Lourenço disse que as barragens hidroeléctricas em Angola estão a produzir 78% da energia eléctrica do país, percentagem que era de 60% há cerca de 12 meses. Bastou a mudança de Presidente e até as barragens ficaram em sentido.

João Lourenço salientou que o aumento da capacidade de produção das barragens tem permitido poupar diariamente cerca de 669 mil litros de combustível, o que representa, segundo os preços atuais no mercado, uma poupança de 258,8 mil euros/dia.

Segundo o chefe de Estado, o aumento de 18,6% na capacidade de produção de energia através das hidroeléctricas permitiu ao país atingir os 4.409 MegaWatts (MW) de potência instalada, sobretudo nas zonas com maior densidade populacional, através das barragens próximas de Luanda, Dundo (Lunda Norte) e Saurimo (Lunda Sul).

Paralelamente, em um ano, só num ano, apenas em 365 dia, unicamente em dois semestres, segundo João Lourenço, foram feitas mais de 36 mil ligações domiciliárias de energia eléctrica. E tudo graças a quem? O Presidente não indicou a percentagem da população que ainda não tem energia eléctrica em casa, mas isso é irrelevante. Relevante é ver que se num ano João Lourenço fez tudo isto, o que não fará se estiver no poder mais umas dezenas de anos…

João Lourenço destacou também os esforços do seu executivo na construção e reparação dos sistemas de canalização e de abastecimento de água, que necessitarão de avultados investimentos para que chegue com qualidade às residências, sobretudo nas cidades mais populosas, como Luanda.

Em relação ao sector da habitação, o chefe de Estado salientou estar em curso um programa habitacional em todo o país com a construção de 5.414 novas residências, que irão beneficiar quase 36.000 angolanos, nomeadamente nas províncias de Benguela, Bié, Namibe, Uíge e Luanda.

“Mas este não é um negócio para o Estado, mas sim para o sector privado, que tem de sair da letargia em que se encontra”, sublinhou João Lourenço.

(*) Com agências

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