“Num país em que o seu primeiro-ministro, Justin Trudeau, tanto tem “denunciado o seu vizinho por não permitir a entrada a migrantes” e recebe-os todos (e sem condições financeiras) e, por sinal, um vizinho que tem franqueado, bastas vezes a entrada de Rafael Marques, sem problemas e como um activista de Direitos Humanos Angolano, é no mínimo estranha esta atitude da embaixada do Canadá, na África do Sul”, diz o angolano Eugénio Costa Almeida, investigador do Centro de Estudos Internacionais do ISCTE do Instituto Universitário de Lisboa.
Recorde-se que a ex-primeira-ministra do Canadá, Kim Campbell, e o líder do movimento estudantil de Hong Kong foram, em Novembro de 2015, alguns dos subscritores de uma petição dirigida às autoridades angolanas sobre liberdade de expressão em Angola apresentada por Rafael Marques em Seul.
“Nós, os peticionários apelamos ao presidente José Eduardo dos Santos para anular as acusações políticas e libertar os presos políticos”, diz-se na petição, em referência aos 15 jovens detidos então detidos em Luanda.
No documento, que foi apresentado por Rafael Marques durante os trabalhos do fórum, pedia-se ao chefe de Estado angolano, na altura há 36 anos no poder sem nunca ter sido nominalmente eleito, para deixar de utilizar o sistema judiciário “como ferramenta política para silenciar os dissidentes” e que termine com a “violenta repressão” contra o direito de reunião e associação que a Constituição garante aos cidadãos angolanos.
“No dia 11 de Novembro, Angola vai celebrar 40 anos de independência. Esta data está a ser ensombrada por uma série de ataques contra a liberdade de expressão e direitos humanos através do uso do sistema judiciário que persegue aqueles que criticam o presidente José Eduardo dos Santos”, diz-se ainda na referida petição.
O documento foi assinado, entre outros, por Kim Campbell, ex-chefe do executivo do Canadá e presidente do Conselho do Movimento Mundial para a Democracia, por Law Kwun Chung, secretário da Federação dos Estudantes de Hong Kong (líder dos protestos na região administrativa especial no sul do China), pelo sociólogo Larry Diamond, da universidade norte-americana de Stanford, por Celine Assaf, da Human Rights Foundation (EUA), e Steve Leslie, da organização Civil Society Forum Access da África do Sul.
No texto da petição denunciavam-se ainda as detenções do “blogger” António Domingos Magno e do advogado de Cabinda Arão Bula Tempo, acusado de ter convocado jornalistas congoleses para a cobertura de um protesto que “nunca aconteceu”, incorrendo numa pena de 12 anos de prisão.
O documento frisava também a situação dos 17 activistas presos em Luanda acusados de rebelião de tentativa de assassinato do presidente José Eduardo dos Santos quando se encontravam a estudar um manual sobre não-violência do académico angolano Domingos da Cruz.
“A determinação dos 15 detidos gerou atenção internacional quando um deles, Luaty Beirão, se submeteu a uma greve de fome que se prolongou durante 36 dias. Durante a detenção, alguns dos prisioneiros foram alvo de tortura”, sublinhava-se no texto da petição apresentada aos membros do Movimento Mundial para a Democracia.
Hoje, Rafael Marques criticou o facto de o Canadá lhe ter negado visto para entrar no país, para visitar o filho, alegando que nas viagens que fez por todo o mundo nunca pediu asilo (ler texto: “Mas o que é isto Sr. Trudeau?”).
Em declarações à agência Lusa, em Luanda, Rafael Marques explicou que a recusa ao pedido de visto que apresentou na embaixada do Canadá na África do Sul foi comunicada nos últimos dias e justificada com a sua condição financeira.
“A carta que eu recebo diz que não satisfaço os requisitos para visitar o Canadá, porque não tenho propriedades, ou seja porque sou pobre. Como é que eles esperam que um activista que combate a corrupção tenha propriedades”, questionou, indignado, Rafael Marques.
“Não tenho vergonha em dizer que não tenho propriedades”, afirmou ainda o jornalista, que está a ser julgado no Tribunal Provincial de Luanda por supostos crimes de injúria e ultraje a um órgão de soberania, o ex-Procurador-Geral da República (do MPLA), general João Maria de Sousa, na sequência de uma queixa apresentada em 2017, devido a uma notícia que Rafael Marques publicou no portal Maka Angola.