O chefe da diplomacia angolana, Manuel Augusto, realçou hoje o retomar das boas relações entre Angola e Portugal, depois de “um momento menos bom”, sublinhando a importância do respeito mútuo entre Estados, princípio fundamental nas relações internacionais. Claro que sim. Portugal cumpriu as ordens do MPLA e, portanto, siga a farra.
Manuel Augusto, que procedeu hoje, em conferência de imprensa, a um ponto de situação da actividade diplomática de Angola, referiu-se à visita do primeiro-ministro de Portugal, António Costa, a Angola, entre 17 e 19 de Setembro próximo, no quadro das relações bilaterais e de cooperação.
“Angola e Portugal saíram agora de um momento menos bom, mas que felizmente teve o desfecho que, pelo menos da parte de Angola, e acreditamos também que da parte do Governo português, parecia o mais lógico”, disse Manuel Augusto.
O ministro das Relações Exteriores de Angola referia-se ao recente episódio que marcou pela negativa as relações entre os dois países, devido a uma acusação da justiça portuguesa ao Presidente da Sonangol na altura dos factos e depois vice-presidente de Angola, Manuel Vicente, sobre crimes de corrupção activa, branqueamento de capitais e de falsificação de documento.
Com relação ao caso, o Governo de Angola manteve a sua posição, exigindo que o processo fosse transferido para a justiça angolana, o que acabou por ser decidido, em Maio, pelo Tribunal da Relação de Lisboa que acabou – como esperado – por ceder às pressões do poder político.
Segundo Manuel Augusto, numa relação entre dois países “há sempre momentos altos e momentos baixos”.
“Mas, o importante é que ambas as partes tenham a capacidade de identificar os obstáculos, os elementos perturbadores e encontrar as formas de superá-las”, frisou. Mais exactamente, que Portugal tenha encontrado a forma de se ajoelhar e assinar a rendição jurídica perante o poder do MPLA e do Presidente da República, João Lourenço.
“O papel dos vários poderes que conformam um Estado está estabelecido por cada uma das Constituições, que têm como denominador comum a independência dos poderes. Mas essa independência dos poderes não exclui um outro princípio, a unicidade do Estado, que resulta da combinação dos três poderes. Se um dos poderes se tornar num factor obstaculizador da acção e dos interesses do Estado, alguma coisa não funciona bem”, disse o ministro Manuel Augusto.
Por alguma razão, em Angola, o Presidente da República é também o Titular do Poder Executivo e, em breve, Presidente do MPLA. Seria como Marcelo Rebelo de Sousa ser Presidente da República, primeiro-ministro e Presidente do PSD…
O governante do MPLA salientou que o desfecho foi o que pareceu a Luanda “o mais lógico”, pelo que será retomado o nível de contactos das instituições. O resultado não pareceu a Luanda “o mais lógico”. Foi, apenas, o que Luanda determinou que tinha de ser.
“A visita do primeiro-ministro será o primeiro acto desta retomada, ao que se seguirá uma visita do Presidente João Lourenço, a Portugal, cujas datas já estamos a negociar e, provavelmente, depois, uma visita oficial do Presidente Marcelo Rebelo de Sousa a Angola”, disse.
O chefe de Estado português esteve em Luanda, em Setembro de 2017, na cerimónia de posse de João Lourenço como chefe de Estado angolano.
A nível diplomático e técnico, Manuel Augusto disse que continuam os trabalhos para o incremento das relações comerciais, para a participação de Portugal no programa de Angola que visa a diversificação económica, e também para o incentivo dos empresários angolanos a investirem em Portugal, em áreas que julguem de interesse.
“Particularmente aquelas, por exemplo, que servem de base à produção de mercadorias exportáveis para Angola. Será muito bom que haja empresários angolanos a participar na produção do vinho e de outros itens que Angola hoje é grande importadora de Portugal”, apontou.
De acordo com o chefe da diplomacia angolana, essas perspectivas estão abertas, “mas que tudo se faça na base de um princípio que é fundamental nas relações internacionais, o respeito mútuo, a não ingerência nos assuntos externos de cada Estado e os benefícios mútuos”.
Se cumprirem o que o MPLA manda…
Recorde-se que Manuel Augusto avisou, em Novembro de 2017, que enquanto o caso que envolvia a Justiça portuguesa e Manuel Vicente não tiver um desfecho, Angola “não se moveria nas acções de cooperação com Portugal”.
Nessa altura, tal como hoje, tal como desde Novembro de 1975, ficou visível que a ditadura e a impunidade estão no ADN do MPLA e João Lourenço tem nos genes essas características.
Enquanto o caso não tiver um desfecho, o Estado angolano não se moverá nas acções, que todos precisamos, de colaboração com Portugal”, disse então Manuel Augusto, em entrevista à Lusa e à rádio francesa TF1, à margem da cimeira entre a União Europeia e a União Africana, que decorria em Abidjan, na Costa do Marfim.
“Este já não é um caso individual de justiça, é um caso do Estado angolano e enquanto não tiver um desfecho, o Estado angolano não se moverá nas acções de cooperação com Portugal, e competirá às autoridades do Estado português verem se vale a pena esta guerra”, vincou o diplomata.
Cobardemente, o que também é uma característica do MPLA, o ministro Manuel Augusto não disse que o entendimento do Governo de João Lourenço é que “desfecho” significa arquivamento.
“Não fomos nós que a escolhemos, porque há elementos para tornar este caso num caso normal de justiça, mas a nossa posição é clara: enquanto não houver um desfecho não há cooperação nem encontros a alto nível, nem nenhum passo da nossa parte”, acrescentou Manuel Augusto.
Nessa altura o chefe da diplomacia angolana repetia que as relações entre os dois países “são excelentes”, mas estas estão “ensombradas por um caso específico que releva da actuação da justiça portuguesa”.
“Angola respeita a separação de poderes, mas a única que queremos é que o poder judicial português deve ter em conta os interesses de Portugal e de Angola”, disse.
“A razão de Estado aplica-se aqui; enquanto o poder judicial português entender que as relações entre dois Estados são menos importantes do que o cumprimento deste processo na direcção em que estão a levar, nós aguardaremos”, alertou.
Questionado sobre se a razão de Estado deve sobrepor-se ao poder judicial, Manuel Angola disse que “a justiça não se deve pôr nem por cima nem por baixo”.
“O que se passa é que houve essa diligência em Portugal e o Ministério Público não é favorável, ou recusa-se a fazer, na argumentação de que não confia na justiça angolana, que terá havido uma amnistia e que o processo podia enquadrar-se nessa amnistia”, lamentou o diplomata.
Só que, apontou, “aqui já há um juízo de valor sobre a justiça angolana, porque se não confiavam, não deviam ter assinado o acordo judiciário”, argumentou Manuel Augusto.
O que importa a Angola e não incomoda Portugal é que Lisboa aceita “ad aeternum” que só pode haver uma sentença em relação a qualquer questão que envolva altos dignitários do regime: arquive-se.
Folha 8 com Lusa