UNITA parte a louça

O presidente do grupo parlamentar da UNITA, Adalberto da Costa Júnior, desafiou hoje o Ministério Público do MPLA (se fosse Ministério Público de Angola outro galo cantaria) a investigar as acusações relacionadas com a corrupção e branqueamento de capitais, que surgem em Portugal e que de há muito envolvem altos dirigentes do regime.

“O conjunto de indicadores que algumas dessas reportagens que vêm de Portugal obrigam a Procuradoria-Geral da República de Angola a investigar. Ou então estará a desviar o seu olhar daquilo que é a sua responsabilidade”, afirmou Adalberto da Costa Júnior.

O dirigente a UNITA, para além de achar que Angola é aquilo que nunca foi nos últimos 41 anos – uma democracia e um Estado de Direito, revela alguma miopia. Isto porque essas notícias também foram e são dadas por alguma comunicação social angolana, como é o caso do Folha 8.

O líder parlamentar da UNITA falava em Luanda, em conferência de imprensa, tendo comentado notícias nomeadamente sobre o caso do Banco Espírito Santo Angola (BESA) e envolvimento de altos responsáveis do regime, considerando que tais abordagens afectam a imagem do país. Afectam sobretudo a imagem do regime que, de facto, é diferente da imagem do país.

“Algumas dessas reportagens conformam gravíssimas violações à lei, saídas milionárias do Banco Nacional de Angola, absolutamente ilegais que criam pobrezas, sofrimentos, danos e que maltratam a imagem do país, com puro silêncio das instituições. Isto não pode continuar no futuro, porque estas acções atentam efectivamente a todos nós”, observou o deputado da UNITA.

Esta posição surge igualmente depois de o Ministério Público português ter acusado formalmente, mais uma vez em Fevereiro, entre outros, o vice-Presidente de Angola (e ex-presidente da petrolífera Sonangol) Manuel Vicente, no âmbito da “Operação Fizz”, relacionada com corrupção e branqueamento de capitais, quando ainda estava na petrolífera do regime.

Na ocasião, o Governo angolano classificou como “inamistosa e despropositada” a forma como as autoridades portuguesas divulgaram a acusação do Ministério Público de Portugal ao vice-Presidente de Angola e alertou que essa acusação ameaça as relações bilaterais.

“Hoje temos fora do país valores financeiros saídos ilegalmente, superiores às reservas que o país oficialmente tem para responder as necessidades de gestão nacional. Isto é muito grave e deve-se pôr um ponto final nesta matéria”, criticou ainda Adalberto da Costa Júnior.

Questionado sobre a actuação dos órgãos judiciais angolanos, o líder parlamentar da UNITA considerou que os mesmos estão “absolutamente corrompidos, fora do prazo” e com “falta de legitimidade”.

“O que faz o Tribunal de Contas? O Tribunal Supremo fala mas não age. O Tribunal de Contas e o Tribunal Constitucional estão fora do prazo, não têm falta de legalidade, mas sim de legitimidade. O nosso sistema judicial está absolutamente corrompido do topo à base, não só na visão da UNITA mas na visão de qualquer cidadão isento. Temos dirigentes com bens que não justificam o seu rendimento legal”, acusou.

Adalberto da Costa Júnior aproveitou o momento para tecer duras críticas sobre a actuação do parlamento do MPLA que – supostamente – deveria ser de Angola, considerando mesmo que “não serve o interesse do cidadão”, até porque as transmissões das reuniões plenárias que são apresentadas à comunicação social – que acompanha o evento numa sala à parte dentro da Assembleia Nacional – serão censuradas.

“Nós descobrimos que aquilo que vocês [jornalistas] vêem na sala é uma transmissão censurada e não é uma realidade da plenária. Porque há questões que se passam na sala e que vocês não vêem, por existirem quatro filtros em áudio e vídeo, que censuram toda informação que é passada à comunicação social que vai à cobertura das actividades parlamentares”, concluiu o deputado da UNITA.

Em Junho de 2016, a UNITA pediu um inquérito parlamentar à Sonangol, afirmando que a petrolífera do regime “tem sido utilizada como veículo para várias transacções” em “desconformidade com a sua missão e em violação à lei”.

“Desconformidade”, diz a UNITA. Corrupção, branqueamento e desvio do erário público, dizemos nós.

O pedido de investigação parlamentar aos negócios da estatal Sonangol já deu entrada uma semana depois de Isabel dos Santos ter tomado posse como Presidente do Conselho de Administração da petrolífera do regime, nomeada para o cargo pelo pai, presidente do MPLA, Titular do Poder Executivo e chefe de Estado, José Eduardo dos Santos, no âmbito da suposta reestruturação do sector petrolífero nacional.

Acrescentou na altura a UNITA que este pedido de inquérito é apoiado por um memorando identificando “alguns dos negócios executados através da Sonangol ou da família do Presidente José Eduardo dos Santos”, com a China International Fund Limited (CIF), “que passou a gerir as linhas de crédito e os projectos de reconstrução sob a alçada do general Hélder Vieira Dias ‘Kopelipa’ [ministro de Estado e chefe da Casa de Segurança da Presidência]”.

O maior partido da oposição aponta ainda casos como a “transferência da riqueza que Angola detinha no banco português BPI para a filha do Presidente da República, Isabel dos Santos”, a compra em Portugal da empresa Zon Multimédia pela mesma empresária, em 2012, ou a “transferência da riqueza que Angola detinha na Sonangol Pesquisa e Produção para a senhora Marta dos Santos, irmã do Presidente Eduardo dos Santos, através da empresa Prodoil”.

“A UNITA pretende que o inquérito parlamentar apure e documente a origem do dinheiro que Isabel dos Santos utilizou nos negócios privados que estabeleceu, no país e no estrangeiro, e o papel desempenhado pela Sonangol EP [Empresa Pública] nessas transacções”, lê-se no comunicado da UNITA.

Para o maior partido da domesticada e ultra minoritária oposição angolana, a “necessidade de defesa do interesse nacional impõe que a Assembleia Nacional, no exercício da sua competência de controlo e fiscalização política, apure e analise tais factos em fórum próprio “, na “protecção do interesse nacional associado à valorização dos recursos mineiros, à racionalização dos recursos petrolíferos e ao aumento da competitividade do país no mercado internacional”.
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O inquérito requerido pela UNITA pretendia igualmente avaliar a transparência dos fluxos financeiros e patrimoniais entre a Sonangol e o Estado (são uma e a mesma coisa) ou outras entidades públicas e privadas, apurando eventuais “actos que são inoportunos na prossecução do interesse público, a probidade e o respeito pelo património público”.

Estas correctas acções da UNITA mostram, mais uma vez, que o partido dirigido por Isaías Samakuva vive (muito bem) num país que não existe, num país de faz de conta. Ou seja, está a dar a entender que Angola é aquilo que, de facto, não é: uma democracia e um Estado de Direito.

A estratégia da UNITA corresponde, aliás, ao que o regime deseja. Isto é, uma oposição entretida com as regras democráticas, legalistas e ingénua. Essa foi a “ponte” que o MPLA lhe forneceu para ela atravessar o rio. Um dias destes, talvez em Agosto, quando estiver no meio do rio, a UNITA vai descobrir que, afinal, nem sequer existe… ponte.

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