Preços em alta. Povo em baixa. Explosão à vista

Os preços em Luanda subiram 26,41% nos últimos 12 meses, até Abril, renovando máximos históricos ao dispararem 3,14% face ao mês anterior de Março, influenciados por sectores como a água, a electricidade ou os combustíveis.

Ainformação consta do relatório do Instituto Nacional de Estatística (INE) de Angola sobre o comportamento da inflação, que destaca que a inflação estava em Abril de 2016, face ao mesmo mês do ano anterior, 18,18 pontos percentuais mais alta.

Neste relatório do Índice de Preços no Consumidor (IPC), Luanda apresentou aumentos, no espaço de um mês, nas classes “Bens e Serviços Diversos”, com 4,17, na “Habitação, Água, Electricidade e Combustíveis”, com 3,98%, em “Hotéis, cafés e restaurantes”, com 3,94%, e nas “Bebidas alcoólicas e tabaco”, com 3,62%.

No Orçamento Geral do Estado para 2016, o executivo angolano prevê uma taxa de inflação (a 12 meses, Janeiro a Dezembro) de 11%.

O Fundo Monetário Internacional (FMI) anunciou a 6 de Abril que Angola solicitou um programa de assistência para os próximos três anos, cujos termos foram debatidos nas reuniões de primavera, em Washington, prosseguindo durante uma visita ao país, em Maio.

O ministro das Finanças de Angola, Armando Manuel, esclareceu entretanto que este pedido será para um Programa de Financiamento Ampliado para apoiar a diversificação económica a médio prazo, negando que se trate de um resgate económico.

Angola vive uma profunda crise financeira, económica e cambial, devido à quebra das receitas com a exportação de petróleo, o que fez disparar o custo de vários produtos alimentares, o que levou algumas superfícies a racionalizar as vendas em Luanda.

Luanda é considerada em estudos internacionais como a capital mais cara do mundo.

Já o Índice de Preços no Consumidor Nacional (IPCN) – não há dados agregados para um ano no registo de todo o país – registou uma variação de 3,10% entre Março e Abril.

Além de Luanda, as subidas no último mês foram lideradas pelas províncias do Bengo (3,14%) e da Lunda Norte (3,03%), enquanto na posição oposta figuraram as províncias do Huambo (2,33%), Uíge (2,60%) e Cunene (2,64%).

O Ministério das Finanças justificou o pedido de ajuda externa ao FMI com a necessidade de aplicar políticas macroeconómicas e reformas estruturais que diversifiquem a economia e respondam às necessidades financeiras do país.

Em Fevereiro do ano passado, o FMI dizia que não via necessidade de um apoio financeiro a Angola, devido à quebra na cotação do barril do petróleo, mas advertia que, para ultrapassar as dificuldades, seria necessária uma distribuição dos sacrifícios.

Por outras palavras, o FMI dizia a todos nós que o Povo deve ficar com os prejuízos e os governantes com os lucros. Nada de novo, portanto.

“Com o objectivo de desenhar políticas macroeconómicas e reformas que restaurem o crescimento económico forte e sustentável, de fortalecer a moldura institucional que suporta as políticas económicas, de lidar com as necessidades da balança de pagamento, e manter um nível adequado de reservas internacionais, o Governo pediu o apoio do FMI para complementar a atempada resposta ao declínio dos preços do petróleo”, lia-se num comunicado do Ministério das Finanças.

A posição de Fevereiro de 2015 foi assumida pelo chefe da missão de assistência técnica do FMI a Angola, Ricardo Velloso, na conclusão de uma semana de reuniões de trabalho com o Executivo angolano, no âmbito da supervisão financeira do país.

O economista brasileiro afirmou que um apoio financeiro do FMI a Angola, como aconteceu depois da crise petrolífera de 2009, não foi abordada. “Angola é um país muito importante para o FMI e, neste momento, o apoio, através deste diálogo e através do nosso programa de assistência técnica, está a ter efeitos muito positivos no país e não vemos, no momento, necessidade de um apoio financeiro”, disse o responsável do FMI.

Pouco mais de uno depois, o que então era verdade passou a ser mentira. Ou falhou o FMI (“através do nosso programa de assistência técnica, está a ter efeitos muito positivos no país e não vemos, no momento, necessidade de um apoio financeiro”) ou, como sempre, as autoridades angolanas estiveram-se nas tintas para as recomendações.

Esta visita decorreu em pleno processo de revisão do OGE para 2015, motivado pela forte quebra na cotação internacional do barril de petróleo.

“As nossas impressões são de que Angola vai realmente passar por um ano difícil e é preciso que todos os angolanos contribuam para o ajuste fiscal que está sendo feito. É muito importante para que isso dê certo. O Governo tomou medidas importantes nesse sentido”, assumiu o chefe da missão do FMI. Referindo-se à revisão do OGE, Ricardo Velloso admitiu tratar-se de um documento “duro”, mas “positivo”. “Infelizmente são as medidas necessárias”, apontou.

Conclusão. O diagnóstico até estava certo, mas a medicação revelou-se um fracasso total. Fracasso que tem origem na atávica certeza do regime que, desde 1975, supostamente acreditava que o preço do petróleo nunca desceria e que, por isso, a diversificação da economia era uma tese de gente ignorante.

Nesse mês, Fevereiro de 2015, e a propósito da então nova estimativa do barril de petróleo – utilizada para calcular as receitas fiscais potenciais -, que estava abaixo da cotação internacional (próxima dos 60 dólares por barril), Ricardo Velloso disse tratar-se de uma “medida acertada”, dada a “volatilidade” do mercado.

Garantindo que Angola “tem um futuro brilhante à sua frente”, o chefe desta delegação do FMI apontou a necessidade da “melhoria do clima de negócios” no país e a conclusão dos investimentos nas infra-estruturas do país, para que estes se tornem reprodutivos na economia.

O documento agora revelado pelo Governo não anuncia qual o valor da assistência financeira, centrando-se antes na assunção de um conjunto de repetidos compromissos políticos que passam pelo aumento da transparência das contas públicas, maior diversificação económica e pela promessa de um reforço da aposta nas áreas da agricultura, pescas, minas, educação, serviços financeiros, água, serviços básicos e saúde.

Ou seja, reedita tudo aquilo que há décadas é defendido pelos especialistas, mesmo alguns afectos ao regime, mas que o poder instituído mandou para as calendas, convicto de que era e é dono da verdade.

“O Governo está, assim, empenhado nos objectivos da diversificação económica expostos no Plano Nacional de Desenvolvimento 2013-2017 e considera que a preservação da estabilidade macroeconómica e a implementação de uma agenda de reformas estruturais ambiciosa são elementos essenciais para a estratégia de obtenção destes objectivos”, acrescentava o comunicado divulgado pelo Ministério das Finanças.

Com o título “Angola está empenhada na diversificação económica com o apoio do FMI”, o texto assume que “o Governo está consciente da forte dependência que o sector petrolífero representa para a vulnerabilidade das finanças públicas e para a economia, mais globalmente”, argumentando que os esforços para diversificar a economia começaram “há muitos anos”.

“Os esforços sustentados desde há muitos anos para promover a diversificação económica já resultaram num significativo aumento da contribuição do sector não petrolífero no PIB de 68,1% hoje, comparado com os 40% dos anos 80, mas o petróleo representa ainda mais de 95% das receitas das exportações e 52% da receita fiscal em 2015″, pode ler-se no comunicado.

O documento indica o empenho do Governo em garantir que está comprometido com um conjunto de reformas para reforçar a estabilidade macroeconómica e financeira, bem como a transparência no sector bancário e nas finanças públicas, para além de melhorias na tributação.

“A curto prazo, os nossos esforços de diversificação vão estar focados na agricultura e pescas, minas, educação, serviços financeiros, água, saneamento básico e sectores da saúde”, lê-se no texto governamental, argumentando que “a expansão destes sectores é uma ferramenta importante na melhoria do emprego em todo o país, particularmente nas áreas rurais”.

Mais recentemente (Novembro de 2015), o FMI considerou que Angola só vai recuperar dos efeitos da queda do petróleo daqui a dois anos, e mesmo assim aponta riscos a esta previsão, nomeadamente uma nova descida nos preços.

“A perspectiva é para uma recuperação que vai começar em 2017, mas há riscos negativos, incluindo uma descida mais acentuada nos preços do petróleo”, considerou Ricardo Velloso, que liderou mais uma missão do FMI a Angola quando, em Agosto de 2015, o país foi avaliado ao abrigo do artigo IV, uma análise anual à economia de cada um dos 188 estados membros do FMI.

Na avaliação, os peritos consideraram que a economia de Angola “foi severamente afectada pelo forte declínio dos preços no ano passado”, mas salientam que “um nível de reservas internacionais confortável permitiu equilibrar as consequências da queda do petróleo de forma mais suave do que em 2008-2009″, quando a recessão mundial fez os preços do petróleo caírem também de forma significativa.

Para além de insistir na diversificação económica (a tal que o regime diz agora estar a fazer “desde há muitos anos) para compensar a forte dependência do país do petróleo, o FMI mostrou a dimensão da crise em Angola, dizendo que “a actividade económica deve abrandar por causa do ajustamento que os sectores industrial, da construção e dos serviços têm de fazer aos cortes no investimento público e no consumo privado, num cenário de forte redução da disponibilidade de moeda estrangeira”.

Isto significa que todos os sectores em Angola são afectados, e a recuperação só pode surgir se as políticas públicas levarem em consideração vários factores ao mesmo tempo, a começar na despesa: “Será crítico trazer a factura com o sector público, medido em percentagem do PIB, para valores mais em linha com a nova realidade das receitas do orçamento”.

A política orçamental, diz o FMI, deve privilegiar a despesa pública de qualidade, mais racional e sistematizada, o que significa que é preciso “avaliar, seleccionar e monitorizar os projectos do programa de investimentos públicos”.

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