Uma delegação angolana participa, de 13 a 17 do corrente mês, na Reunião Intercalar do Processo Kimberley, a decorrer no Dubai, nos Emirados Árabes Unidos (EAU). A comitiva angolana vai ser chefiada pelo coordenador executivo da Comissão Nacional do Processo Kimberley (CNPK), Estanislau Buio, e conta com quadros do Ministério dos Recursos Minerais, Petróleo e Gás, administradores executivos da Endiama, SODIAM, entre outros técnicos.
O evento vai reunir representantes de 85 países participantes do Sistema Internacional de Certificação do Processo Kimberley (SCPK), Indústria Extractiva e sociedade civil.
Com a duração de cinco dias, o certame servirá para discussão de propostas de decisões administrativas, no quadro da Revisão e Reforma do Processo Kimberley em curso, com destaque para a discussão e aprovação do início da actividade do secretariado permanente, previsto para Junho próximo, em Gaberone, no Botsuana.
Constam da agenda, a discussão da proposta da Definição de Diamante de Conflito, debate da proposta de implementação da co-presidência e co-vice-presidência no SCPK.
A discussão e aprovação da data da Missão de Avaliação na República Centro-Africana e da proposta do novo logotipo do Processo Kimberley faz parte da agenda, na qual aparece igualmente a apresentação de várias tecnologias de rastreabilidade de diamantes brutos para serem debatidas.
À margem da reunião será realizado um fórum sobre tecnologia, no dia 16, ao mesmo tempo que serão convidados os embaixadores dos países membros do G7, acreditados nos Emirados Árabes Unidos, para dar a conhecer sobre as valências dos equipamentos de rastreabilidade que todos os participantes no SCPK podem possuir para permitir a certificação da origem dos seus diamantes brutos.
A ideia é evitar a obrigação por parte dos produtores que todos os diamantes brutos sejam enviados para Antuérpia para o processo de rastreabilidade e, consequentemente, a sua certificação.
O Sistema Internacional do Processo Kimberley é o órgão de certificação de origem dos diamantes brutos, estabelecido através da Resolução 55/56 de 2000, da Assembleia Geral das Nações Unidas, que visa evitar a compra e venda de diamantes provenientes de áreas em conflitos.
Em 2000, diversos países aceitaram o Processo Kimberley, comprometendo-se a adquirir somente diamantes brutos certificados (com procedência confirmada por certificado oficial) e a recusar importações vindas de áreas de conflito.
O ministro dos Recursos Minerais, Petróleo e Gás, Diamantino Azevedo, destacou em Novembro de 2021 o papel de Angola na erradicação dos “diamantes de sangue” e salientou a importância deste mineral para a economia angolana, com a recuperação dos preços a abrir perspectivas positivas.
Diamantino Azevedo discursava na abertura da “Angola International Diamond Conference” (AIDC), que decorreu no Polo de Desenvolvimento Diamantífero de Saurimo, capital da Lunda Sul, província que se destaca pela sua riqueza neste recurso mineral, bem como na miséria das populações locais.
O governante salientou a “visão futurista do executivo” de tornar Angola a médio prazo num produtor global de diamantes “relevante, estável e responsável”, apontando o polo construído em 18 meses como um reflexo desta vontade de rápido desenvolvimento económico e social tendo o diamante como mola impulsionadora.
Diamantino Azevedo disse ainda que Angola foi um dos precursores e membro fundador do sistema de certificação do processo Kimberly, enquanto órgão das Nações Unidas que trabalha na prevenção dos conflitos políticos relacionados com uso abusivo dos diamantes e violação dos direitos humanos nas comunidades e regiões onde são extraídos. Esqueceu-se, obviamente, de referir que as Lundas são províncias onde o Governo mais viola os direitos humanos.
“Com isso, Angola desempenha um papel importante para a erradicação dos diamantes de sangue”, apontou.
Diamantino Azevedo mostrou-se também optimista quanto aos sinais de recuperação do preço do diamante, após alguma instabilidade do mercado fruto da pandemia, para o estímulo desta actividade abrindo perspectivas mais positivas para o desenvolvimento da cadeia de valor deste mineral.
A nível interno, apontou medidas de reestruturação do sector que garantem maior transparência do sistema de comercialização, bem como negociação justa entre os intervenientes de acordo com as regras de mercado, que, além de estimular a produção de diamantes, concorrem também para a melhoria da arrecadação de receitas.
Outros dos objectivos da estratégia gizada para acrescentar valor nesta cadeia são a implementação da bolsa de diamantes e o desenvolvimento da indústria de lapidação.
“O diamante como segunda fonte actual de exportação e de divisa do nosso país é um bem essencial para a recuperação económica e desenvolvimento, quer como factor de empregabilidade, quer como para arrecadação de receitas do Estado”, frisou, acrescentando que a juventude deve ter formação profissional direccionada para esta área.
Diamantino Azevedo dirigiu também um apelo aos responsáveis das empresas do sector, garantindo que “Angola é o destino certo para investimentos na indústria diamantífera” e que executivo assegura todo o apoio institucional, traduzido na desburocratização e na “lisura e transparência de acções”. Angola é o quinto maior produtor mundial de diamantes e ocupa a segunda posição em África, a seguir ao Botsuana.
A outra face da riqueza
Em Fevereiro de 2018, a Human Rights Watch disse ser necessário que as multinacionais de joalharia dêem passos para garantir que adquirem ouro e diamantes a fornecedores que respeitem os direitos humanos, sendo que nenhuma das empresas que analisou cumpre totalmente os critérios da organização.
O que terá Angola a ver com isso?
A organização de direitos humanos solicitou a 13 multinacionais do sector da joalharia informação detalhada sobre as suas práticas de verificação de fornecedores, nomeadamente se respeitam os direitos humanos nos locais de mineração, informação que reuniu num relatório então divulgado.
“As 13 companhias escolhidas incluem algumas das maiores e mais conhecidas da indústria da joalharia e da relojoaria, reflectindo ainda os diferentes mercados por geografias”, dizia a HRW no seu relatório.
As empresas seleccionadas foram a Pandora (Dinamarca); Cartier (França); Christ (Alemanha); Kalyan, TBZ Ltd. e Tanishq (Índia); Bulgari (Itália); Chopard e Rolex (Suíça); Boodles (Reino Unido); Harry Winston, Signet e Tiffany (Estados Unidos da América). Destas multinacionais, todas responderam às perguntas da HRW menos a Rolex, a Kalyan e a TBZ.
De acordo com a HRW, “algumas das companhias de joalharia analisadas fizeram esforços significativos para obter o seu ouro e diamantes a partir de fornecedores responsáveis, enquanto outras tomaram medidas muito mais fracas”.
“A Human Rights Watch descobriu que nenhuma das companhias cumpre na totalidade os nossos critérios para um fornecimento responsável. Os problemas principais são: falhas na avaliação de riscos relacionados com direitos humanos” bem como falta de transparência, indicou a organização.
Por exemplo, “nenhuma das empresas que respondeu à HRW consegue rastrear por completo o ouro e os diamantes que compra até às minas de origem, assegurando assim a cadeia de responsabilidade”.
“Uma companhia, a Tiffany, consegue essa cadeia completa de responsabilidade para o ouro, uma vez que compra o seu ouro apenas a uma mina, a Mina de Bingham Canyon, no Utah [Estados Unidos]”, salienta.
Um ranking feito pela ONG norte-americana aponta apenas uma companhia – a Tiffany – como tendo dado passos “muito fortes” para garantir a proveniência segura das suas matérias-primas.
Na resposta à HRW, a Tiffany salientou que não comprava diamantes a Angola ou ao Zimbabué “devido a crescentes riscos de direitos humanos”.
Na categoria das empresas que deram passos “moderados” na verificação do risco de direitos humanos constam a Bulgari, a Pandora, a Cartier e a Signet.
A Boodles, a Christ, a Chopard e a Harry Winston estão no nível “fraco”, enquanto a indiana Tanishq está no “muito fraco”. A Kalyan, a Rolex e a TBZ ficam de fora do quadro por não terem dado resposta.
Estas 13 empresas representam cerca de 10 por cento das vendas mundiais de joalharia, com receitas globais combinadas estimadas em mais de 30 mil milhões de dólares.
A produção anual de diamantes no mundo alcançava na altura os 130 milhões de quilates em bruto, com qualidade para gemas ou diamantes de uso industrial. Cerca de 70% têm qualidade para gemas.
Os maiores produtores de diamantes do mundo são a Rússia, o Botsuana, o Canadá e a Austrália, e a indústria dos diamantes é dominada por duas companhias mineiras, a Alrosa (da Rússia e que opera em Angola) e a De Beers, que opera no Botsuana, Canadá, Namíbia, Angola e África do Sul. As duas companhias representam cerca de metade das vendas de diamantes em bruto em todo o mundo.
Nós por cá…
Angola, como todo o mundo sabe mas que poucos dizem que sabem, é actualmente aquele país que para uma população de pouco mais de 35 milhões pessoas tem mais de 20 milhões de pobres, tem um enorme potencial diamantífero nas regiões norte e nordeste do país, com dados que indicam para a existência de um total de recursos em reservas de diamantes superior a mil milhões de quilates.
Esta informação foi divulgada no dia 30 de Junho de 2017 durante a apresentação de um estudo sobre o “Potencial Diamantífero de Angola: Presente e Futuro”, realizado pelos serviços geológicos das diamantíferas russa, Alrosa, e da angolana estatal, Endiama.
No que diz respeito aos kimberlitos, são responsáveis por 950 mil milhões de quilates, enquanto que os aluviões correspondem a mais de 50 mil milhões de quilates.
O director-adjunto da Empresa de Investigação científica na área de pesquisa e prospecção geológica da Alrosa, Victor Ustinov, que apresentou o estudo, referiu que esses dados demonstram que o potencial kimberlítico de Angola é 15 vezes superior ao potencial aluvionar.
“Ao mesmo tempo, podemos dizer que em Angola existem territórios com muito boa probabilidade de descoberta de novos jazigos de diamantes”, disse, acrescentando que a empresa conjunta da Alrosa e Endiama, a Kimang, estava a realizar os seus trabalhos de prospecção geológica numa dessas áreas. O estudo refere que Angola tem territórios com grandes probabilidades de descoberta de diamantes.
Os resultados da pesquisa apontam que os territórios, que abrangem as províncias da Lunda Norte, Lunda Sul, Malange e Bié, apresentam alto potencial diamantífero, e sem probabilidades de existência de diamantes as províncias do Uíge, Zaire, Luanda e Bengo.
Com potencial provável, o estudo indicava os territórios integrados pelas províncias do Cuanza Norte, Cuanza Sul, Huambo, Huíla, Benguela, onde poderão ser descobertas reservas kimberlíticas com teor médio de diamantes e reservas aluvionares de média dimensão.
Ainda por esclarecer estava o potencial nas províncias Cuando Cubango, Moxico e Namibe, devendo ser realizado trabalhos de investigação científica, defendeu o responsável.
Victor Ustinov sublinhou que uma vez realizados estudos de investigação adicionais é possível aumentar o potencial diamantífero de Angola em pelo menos 50%.
“Com o potencial de 1,5 mil milhões de quilates de diamantes podemos estar seguros que o sector de mineração vai se desenvolver de forma significativa”, disse, indicando trabalhos que devem ser desenvolvidos nesse sentido.
“É necessário desenvolver novos métodos de prospecção que permitam descobrir jazigos kimberlíticos e aluvionares a grandes profundidades, usando métodos de estudos geofísicos, geoquímicos, análises de imagens espaciais e estudos analíticos”, disse.
A finalizar, Victor Ustinov sublinhou que o potencial diamantífero de Angola “é muito alto e nos próximos anos o país será palco de grandes descobertas”.
No final dessa apresentação, em declarações à imprensa, o então ministro da Geologia e Minas de Angola, Francisco Queiroz, disse que a informação apresentada era de grande utilidade para Angola, “não só para efeitos pedagógicos, científicos, como também para o trabalho que se está a realizar de recolha de informação ao nível do Plano Nacional de Geologia (Planageo)”.
Francisco Queiroz disse que Angola estava a trabalhar com as autoridades da Rússia para a recolha geológica em posse russa, trabalhos realizados para integrar na base de dados do Planageo.
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