MPLA, DE PARTIDO ÚNICO A… ÚNICO PARTIDO

O presidente da UNITA, Adalberto da Costa Júnior, criticou hoje os “angolanos com responsabilidades” que continuam a “querer atirar irmãos contra irmãos”, apelando a um perdão “genuíno” e à criação de uma comissão de verdade e reconciliação.

Adalberto da Costa Júnior, que discursava hoje em Luanda, no âmbito das comemorações do 58.º aniversário da fundação da UNITA, afirmou que “50 anos depois, angolanos com responsabilidades relevantes continuam a querer dividir angolanos. Cinquenta anos depois, angolanos continuam a pretender atirar irmãos contra irmãos”, acusou o dirigente, criticando implicitamente o MPLA, partido no poder desde 1975.

O líder da UNITA salientou que “ninguém neste país” – onde MPLA e UNITA se confrontaram numa longa guerra civil de quase 30 anos — “está em condições de se expurgar de responsabilidades e de arremessar pedras aos telhados dos vizinhos”, insistindo na criação de uma comissão de verdade e reconciliação “capaz de expurgar os fantasmas”.

Adalberto da Costa Júnior considerou que tem faltado “humildade, coragem, sentido de justiça e patriotismo a muitos companheiros” e explicou que a UNITA se retirou da Comissão de Reconciliação em Memória das Vítimas dos Conflitos Políticos (Civicop) “por respeito à memória de quantos já não estão aqui”, nomeadamente à memória do fundador da UNITA, Jonas Savimbi.

“É inaceitável que nem os mortos deixem descansar. Retiramo-nos depois de termos convidado ao relançar dos objectivos da comissão, o que, infelizmente, não foi realizado”, frisou o político.

A UNITA anunciou a sua saída da Civicop em Dezembro por “violação de princípios” por parte do Governo angolano, considerando que o organismo “permanece refém dos interesses espúrios do regime”.

Durante vários meses a Televisão Pública da do MPLA (TPA) exibiu reportagens que mostravam imagens da Jamba, antigo território da UNITA no período do conflito armado, onde técnicos da Civicop faziam escavações em busca de ossadas de alegadas vítimas de Jonas Savimbi.

Adalberto da Costa Júnior disse hoje que a UNITA se tem reunido com famílias que carregam a perda dos seus entes, “vítimas dos processos internos”, e homenageou, entre outros, os generais “Bock” e o comandante António Vakulukuta e “todos quantos se bateram pela causa”, pedindo perdão aos familiares pela dor e sofrimento causados.

“Procuramos um perdão genuíno e um abraço verdadeiro entre filhos da mesma pátria, uma verdadeira reconciliação nacional”, disse o líder da UNITA, considerando que estas condições são fundamentais para um estado democrático e de direito que Angola, quase 50 anos depois da independência, ainda não é.

Adalberto da Costa Júnior lamentou que a Civicop não tenha resistido “aos baixos jogos partidários”, considerando que foi destruída por “algumas mentes não reconciliadas e com relevante responsabilidade nacional”.

“Angola, quase 50 anos depois dos corações nos frigoríficos e da propaganda negativa dos dias da independência, voltou a assistir com tristeza e com rejeição nacional à divulgação do ódio e mais condenável propaganda nas nossas televisões”, criticou.

Adalberto da Costa Júnior destacou ainda que o desenvolvimento de Angola é indissociável do desenvolvimento dos angolanos e que ambos “implicam um clima de paz, democracia e estado de direito”.

Em 15 de Setembro de 2022, João Manuel Gonçalves Lourenço tomou posse pela segunda (e espera-se que última) vez como Presidente da República de Angola.

O Presidente tomou posse no meio de um clima sombrio e de forte desconfiança do eleitorado que se manifestava inconformado com os resultados eleitorais oficiais anunciados pela Comissão Nacional Eleitoral do MPLA (CNE) como sendo a vontade dos inconformados cidadãos.

No acto de posse o Presidente general João Lourenço jurou cumprir e fazer cumprir a Constituição da República de Angola e as leis do País; jurou defender a democracia e promover a estabilidade, o bem-estar e o progresso social de todos os angolanos.

Na altura, a Presidente do Tribunal Constitucional, que conferiu posse ao novo Presidente, instou o empossado a governar para todos, para os que votaram nele, para os que não votaram nele e também para aqueles que simplesmente não votaram em ninguém.

Hoje, qualquer balanço minimamente isento mostra que João Lourenço governa com autoritarismo, governa contra a Constituição, governa contra a democracia, governa contra o bem-estar de todos os angolanos. A corrupção aumentou, o custo de vida elevou-se vertiginosamente, o desemprego continua a subir, as soluções ensaiadas pelo Governo mostram-se ineficazes e o Povo perdeu a confiança no Presidente da República. O futuro das nossas crianças está seriamente ameaçado. O sentimento geral dos cidadãos é de que o Presidente da República traiu o juramento que fez e ainda não percebeu que não é uma solução para o problema ma, isso sim, um problema para a solução.

Pela orientação política que fixou na governação, enquanto Titular do Poder Executivo, o Presidente da República não só falhou em alcançar os objectivos do Plano de Desenvolvimento Nacional (PDN) como fez pior: subverteu o processo democrático, tendo consolidado um regime monolítico, que atenta contra a paz e contra os direitos fundamentais dos angolanos.

O general João Lourenço, na ânsia atávica de querer demonstrar que o MPLA fez mais em 50 anos do que os portugueses em 500, eliminou o já fraco pluralismo que existia nos órgãos públicos de comunicação social; consolidou as desigualdades de oportunidades e de tratamento das diversas correntes de opinião política no espaço público. Consolidou também as desigualdades no acesso à riqueza entre os diferentes grupos políticos, sociais e religiosos. Subverteu a Constituição, transformando Angola numa República de um só poder, o Partido-Estado, que se apropria também da riqueza nacional, a olho nu, por via dos mais variados, ardilosos e fraudulentos esquemas.

João Lourenço aboliu o Estado Democrático de Direito que a Constituição consagra e, no seu lugar, consolidou um Estado autocrático e securitário que viola sistematicamente os direitos e liberdades fundamentais dos angolanos. Tal subversão, constitui um crime de violação da Constituição que atenta gravemente contra o Estado Democrático de Direito, por isso, passível de destituição e responsabilização.

Acumulam-se também as evidências de violação dos princípios constitucionais da legalidade, da transparência, da boa governação e da responsabilização, da parte do Presidente da República, na execução do Orçamento Geral do Estado. As contas que o Presidente apresenta à Assembleia Nacional não batem certo. O Tribunal de Contas emite pareceres altamente críticos sobre a Conta Geral do Estado. Além disso, o Presidente não informa ninguém sobre o paradeiro do dinheiro em excesso que resulta do diferencial entre o preço do barril de petróleo estimado, que é utilizado para elaborar o orçamento, e o preço real.

O Presidente escolhe empresas de amigos ou de pessoas do seu grupo político para se beneficiarem dos principais contratos públicos em todos os sectores da economia. Deixou de fazer concursos públicos, passou a fazer adjudicações directas como regra e os concursos como excepção, exactamente o contrário do que manda fazer a Lei.

O desempenho do Presidente da República enquanto Chefe de Estado também é negativo. Nomeou uma pessoa que não tem currículo mas apenas e só cadastro criminal para exercer o cargo de juiz de um tribunal superior, mesmo sabendo que tal pessoa acabava de ser acusada e condenada pelo crime de peculato.

Como Chefe de Estado, João Lourenço interferiu negativamente no regular funcionamento de outras instituições do Estado, designadamente, a Assembleia Nacional, a Televisão Pública de Angola, a Rádio Nacional de Angola, a Comissão Nacional Eleitoral, o Tribunal de Contas, o Tribunal Supremo, o Banco Nacional de Angola e outras. A soberania política, sobretudo financeira da Assembleia Nacional e dos Poder Judicial foi sequestrada.

João Lourenço mandou às malvas a definição de que o Presidente simboliza unidade, a identidade, os valores e as aspirações da Nação, chamando a si (e só a si) todos os poderes, ao ponto de “decretar” que os tribunais (que são igualmente órgãos de soberania) violem a Constituição ou a Lei do Orçamento Geral do Estado.

João Lourenço esquece-se que o Chefe de Estado não é “chefe” dos demais órgãos do Estado no sentido literal do termo, pois os titulares dos demais órgãos de soberania não são seus subordinados. O chefe supremo de todos é o Povo Soberano de Angola e a Constituição da República. Todos estão (ou deveriam estar) sujeitos à Constituição e à Lei. Todos subordinam-se à Constituição e à vontade do Povo Soberano, e não aos homens e mulheres dos poderes constituídos de modo temporário. Por esta razão o Chefe de Estado não promove pactos de silêncio nem constrói alianças para subverter a Constituição, os processos eleitorais ou os julgamentos judiciais. O Chefe de um Estado Democrático de Direito, não permite que o Estado se subordine ou se confunda com um partido político.

Mas João Lourenço permite, apoia e estimula que isto aconteça. Subverte a Constituição, atenta contra o Estado de Direito, ou seja, promove e sustenta permanentemente golpes de Estado institucionais.

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