O analista cabo-verdiano Corsino Tolentino defende que Cabo Verde sobreviveu no “fio da navalha” em 2014 e precisa, para 2015, de um “novo GPS”, uma “governação mais credível, paz duradoura e segurança interna e externa”.
E m entrevista à agência Lusa, o também diplomata, investigador e antigo director-geral da Fundação Calouste Gulbenkian salientou que, em 2014, o Governo manteve um programa de infra-estruturação do país com base em estradas, barragens, portos, aeroportos e habitação subvencionada.
No entanto, referiu, “apesar da bondade social das escolhas”, existem dúvidas sobre a sua eficiência e a certeza de que não alavancam imediatamente a economia, criam poucos postos de trabalho e contribuem para aumentar o endividamento externo para valores superiores a 100%.
“A este quadro preocupante, juntaram-se um ano sem chuvas, a erupção do vulcão da ilha do Fogo e o conservadorismo dos partidos políticos, que foram incapazes de se entenderem sobre as grandes opções da comunidade nacional. A democracia formal funcionou, mas é pouco”, afirmou.
Para 2015, segundo Corsino Tolentino, Cabo Verde terá, por isso, de suportar “mais um ano difícil” do ponto de vista económico, financeiro e social.
No plano político, além da coabitação entre o primeiro-ministro José Maria Neves (ex-líder do Partido Africano da Independência de Cabo Verde – PAICV – que permanecerá até às eleições legislativas de 2016) e o presidente Jorge Carlos Fonseca (apoiado pelo Movimento para a Democracia — MpD – oposição), vai haver, pela primeira vez, um líder do PAICV a entender-se com um chefe do executivo do mesmo partido.
A primeira novidade de 2015 será de natureza política, depois da eleição, no domingo, de Janira Hopffer Almada como líder do PAICV, com mais de 50% dos votos.
Para Corsino Tolentino, um dos “históricos” do PAIGC/PAICV, a escolha da nova líder “não foi indiferente à capacidade de resistência e inovação do partido”, principalmente como Governo ou como oposição, a partir de 2016.
“A governação de Cabo Verde vai enfrentar anos duros e os partidos políticos terão de encontrar um novo modelo de gestão. Desde a década de 90 do século passado que, entre os dois partidos do chamado círculo do poder, MpD e PAICV, predominou a alternância a todo o custo e uma espécie de jogo de soma nula no debate”, frisou.
No seu entender, terá, assim, de haver “um novo jeito” de governar um país “muito frágil”, que terá de passar pela construção de um consenso sério, antes ou depois das eleições gerais de 2016, que envolva também a União Cabo-Verdiana Independente e Democrática (UCID), terceira força no Parlamento.
Corsino Tolentino realçou também a possibilidade de Cabo Verde atingir, até ao final de 2015, todos os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio (ODM) e a subida dos indicadores de Direitos Humanos nos “rankings” internacionais, embora “careçam de sustentabilidade”.
“Toda a gente sabe que não são sustentáveis. A educação, a saúde, a segurança e os direitos humanos carecem de uma base económica e de mais qualidade. A relação com o ambiente também evolui, mas precisa de maior coerência. A falta de chuvas, a erupção do Fogo e as fraquezas de previsão e gestão de recursos e expectativas mostram que temos de trilhar novos caminhos, mas os partidos políticos decidirão”, concluiu.