António Costa, (ainda) primeiro-ministro português, salientou hoje que Portugal terá dois novos espaços para preservar a sua memória histórica, o Museu Nacional da Resistência, na Fortaleza de Peniche, e o Centro Interpretativo 25 de Abril em Lisboa. Não está mal, apesar de – no caso de Angola, por exemplo – os sucessivos governos lusos não terem memória mas apenas e só uma vaga ideia.
António Costa falava aos “porta-microfones” (há quem lhes chame “jornalistas”) após ter visitado juntamente com o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, o Museu do Apartheid, em Joanesburgo.
“É muito importante preservar a memória histórica. Como nos disse o guia da visita, [o actor John Kani] ele próprio uma vítima do apartheid, é essencial para as novas gerações, para as crianças e jovens saberem o que se passou”, acentuou o líder do executivo português, em declarações aos jornalistas, no final de uma visita de uma hora ao Museu do Apartheid.
Tendo ao seu lado os ministros dos Negócios Estrangeiros, João Gomes Cravinho (o tal que disse que Jonas Savimbi foi um Hitler africano), da Defesa, Helena Carreiras, e o secretário de Estado das Comunidades, Paulo Cafofo, António Costa referiu que, na terça-feira, em Luanda, durante a sua visita oficial a Angola, teve a oportunidade de salientar a participação portuguesa na reabilitação da Fortaleza de São Francisco do Penedo.
“Vai ser o futuro Museu da Luta pela Libertação de Angola. E essa é uma forma de celebrarmos estas lutas de libertação gémeas: a libertação pela democracia e pelo fim do colonialismo”, apontou. Se em vez de uma vaga ideia tivesse mesmo memória, diria que no caso de Angola não houve libertação mas, apenas, a substituição do colonialismo português pelo colonialismo do MPLA.
Depois, o primeiro-ministro referiu que o futuro Centro Interpretativo 25 de Abril, em Lisboa, é um projecto que terá financiamento por parte do Estado.
“Vamos ceder as instalações que neste momento estão ocupadas pelo Ministério da Administração Interna, na Praça do Comércio. Vai ser um projecto conduzido directamente pela Associação 25 de Abril. Será um momento marcante do dia 25 de Abril”, frisou.
Ainda de acordo com António Costa, para o ano será inaugurado o Museu Nacional da Resistência, que está a ser construído na Fortaleza de Peniche”. “Contará a História da Resistência à ditadura, desde 1926 até ao dia 25 de Abril de 1974”, assinalou.
Da sua visita ao Museu do Apartheid em Joanesburgo, na companhia de Marcelo Rebelo de Sousa, António Costa destacou como momento mais marcante as imagens sobre a antiga escola sul-africana, em que as crianças pretas não tinham direito a cadeiras, nem a secretária, e aprendiam sentadas no chão ou de joelhos.
Para chegar a tão opaca conclusão, não precisava de ter ido tão longe. No reino do seu querido amigo João Lourenço, independente há 48 anos, as crianças que vão à escola (há cinco milhões que estão fora do sistema escolar) têm de se sentar em pedras…
“Foi muito emocionante observar as marcas concretas da discriminação. O apartheid traduzia-se nas coisas mais ínfimas da vida de uma pessoa, como quando uma criança chegava à escola”, acrescentou.
Custa a crer, mas é verdade que os políticos portugueses sabujam-se alegremente para procurar legitimar e branquear o que se passa de mais errado com o MPLA, organização que está no Poder desde a independência graças, recorde-se, à criminosa violação do Acordo de Alvor por parte dos políticos portugueses.
Alguém ouviu alguma vez António Costa dizer que 68% da população angolana é afectada pela pobreza, que a taxa de mortalidade infantil é das mais altas do mundo, com 250 mortes por cada 1.000 crianças? Alguém o ouviu dizer que apenas 38% da população angolana tem acesso a água potável e somente 44% dispõe de saneamento básico?
Alguém ouviu alguma vez António Costa dizer que apenas um quarto da população angolana tem acesso a serviços de saúde, que, na maior parte dos casos, são de fraca qualidade? Alguém o ouviu dizer que 12% dos hospitais, 11% dos centros de saúde e 85% dos postos de saúde existentes no país apresentam problemas ao nível das instalações, da falta de pessoal e de carência de medicamentos?
Alguém ouviu alguma vez António Costa dizer que 45% das crianças angolanas sofrerem de má nutrição crónica, sendo que uma em cada quatro (25%) morre antes de atingir os cinco anos? Alguém o ouviu dizer que, em Angola, a dependência sócio-económica a favores, privilégios e bens, ou seja, o cabritismo, é o método utilizado pelo MPLA para amordaçar os angolanos?
Alguém alguma vez ouviu António Costa dizer que, em Angola, o acesso à boa educação, aos condomínios, ao capital accionista dos bancos e das seguradoras, aos grandes negócios, às licitações dos blocos petrolíferos, está limitado a um grupo muito restrito de famílias ligadas ao regime no poder?
Alguém ouviu alguma vez António Costa dizer que Angola é um dos países mais corruptos do mundo e que tem 20 milhões de pobres?
Ninguém ouviu. Dir-se-á, e até é verdade, que esse silêncio é condição “sine qua non” para cair nas graças do dono de Angola, até porque todos sabemos que nenhum negócio se faz sem a devida autorização do general João Lourenço.
Portugal consegue assim não o respeito mas a anuência do regime para as suas negociatas. Esquece-se, contudo, de algo que mais cedo ou mais tarde lhes vai sair caro: o regime não é eterno e os angolanos têm memória.