A UNITA, o maior partido da oposição que o MPLA (ainda) permite em Angola, denunciou hoje a existência de cerca de 15.000 “supervisores logísticos estranhos” às eleições gerais previstas para Agosto, cuja “idoneidade, nacionalidade e identidade são”, supostamente, “desconhecidas” pela Comissão Nacional Eleitoral (CNE).
“Estas pessoas, que totalizam cerca de 15.000, são designadas no caderno de encargos por ‘supervisores logísticos’. A sua nacionalidade, identidade e idoneidade não são conhecidas. Consequentemente, não podem ser civil e criminalmente responsáveis pelos actos praticados no exercício das suas actividades”, afirmou hoje o presidente do grupo parlamentar da UNITA, Liberty Chiyaka.
Segundo o líder parlamentar da UNITA, a solução tecnológica aprovada pela CNE para a organização e gestão das eleições gerais, gerida pela empresa Indra, “está viciada”.
A solução tecnológica “inclui uma provisão que permite a execução e controlo de competências-chave e não delegáveis da CNE, por pessoas que não são comissários da CNE e não são comissários do órgão eleitoral”.
Os cerca de 15.000 “supervisores logísticos”, referiu Liberty Chiyaka, “não pertencem ao quadro de pessoal da CNE, não são membros das mesas de voto, não são agentes de educação cívica, não estão vinculados à CNE e não são pagas directamente pela CNE”.
Aludindo ao caderno de encargos da CNE, no quadro das eleições gerais agendadas para Agosto o político da UNITA disse que a participação das referidas pessoas no processo eleitoral assenta em 12 factos.
“Não são recrutados pelos serviços competentes da CNE, controlam os processos de votação, apuramento e de transmissão dos resultados, transportam das urnas, os boletins de voto e as actas já preenchidas e não estão subordinados ao presidente da CNE”, salientou.
Os referidos “supervisores logísticos” terão igualmente a missão de “controlar a custódia e a distribuição da logística eleitoral sensível, monitorar as assembleias de voto, desde o início da distribuição logística do material eleitoral até ao dia da votação”.
Estes “não pertencem ao conjunto de cerca de 3.111 comissários eleitorais designados pela Assembleia Nacional na base dos critérios de idoneidade cívica e moral, probidade e competência técnica, sob proposta dos partidos políticos e coligações com assento parlamentar”.
O “seu programa de formação é concebido pela Indra, mas também não está vinculado, reportam a sua actividade directamente a entidades indeterminadas no Centro de Escrutínio Nacional e são pagos directamente pela entidade co-contratante, que é um ente não residente cambial, que recebe em moeda estrangeira”, realçou Chiyaka.
O presidente do grupo parlamentar da UNITA frisou também que “contrariamente ao que a lei exige para os comissários eleitorais e para os trabalhadores temporários da CNE, os nomes dos supervisores logísticos não são publicados e a sua selecção não obedece aos princípios da imparcialidade, competência e idoneidade cívica”.
“Conclui-se assim, que os ‘supervisores logísticos’ são pessoas que a CNE não conhece e nem controla, não estão vinculados à CNE nem à entidade co-contratante ao abrigo do concurso público sobre a aquisição de serviços tecnológicos e logísticos”, notou.
“Ao transferir para desconhecidos, de forma velada, uma competência exclusiva que lhe foi atribuída por lei, a CNE viola ostensivamente a Constituição da República de Angola e pisoteia os direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos”, diz Liberty Chiyaka.
Se esta situação “não for imediatamente corrigida”, observou, “quem é que estará a descredibilizar as eleições mesmo antes de elas ocorrerem”, questionou o político da UNITA.
Liberty Chiyaka falava hoje, em conferência de imprensa, em Luanda, onde apresentou o que considera de “violações da Constituição e da lei por entes públicos e atentados à transparência e a verdade eleitoral”.
O também deputado dos “maninhos” alertou igualmente sobre “outros perigos” que “ameaçam a lisura e a transparência do processo eleitoral, nomeadamente a corrupção eleitoral, que está curso, doações ou ofertas susceptíveis de representar uma espécie de compra de voto”.
“Hoje, verificamos que o partido dirigido pelo senhor Presidente da República tem promovido, directa e indirectamente a corrupção eleitoral. Funcionários públicos têm sido forçados e coagidos a tomar parte de actos partidários dirigidos pelo presidente do MPLA, partido no poder”, assinalou.
Liberty Chiyaka lamentou ainda o “silêncio” da Assembleia Nacional sobre a solicitação da UNITA para a constituição de uma comissão eventual da Assembleia Nacional “para acompanhar os atos e omissões” da CNE e da “audição parlamentar CNE para esclarecer os vícios identificados”.
Tribunal Constitucional indefere providência cautelar da UNITA
A UNITA, diz ainda que a presidente do Tribunal Constitucional (TC), sucursal do MPLA, “errou” ao indeferir a providência cautelar sobre alegadas irregularidades no registo eleitoral, admitindo recorrer, porque os argumentos sobre a legitimidade dos proponentes “não colhem”.
Segundo a vice-presidente do grupo parlamentar da UNITA, Mihaela Webba, a legitimidade dos interessados, evocada no despacho da presidente do TC, não colhe, porque estes estavam legalmente habilitados.
A providência cautelar não especificada sobre alegadas irregularidades no processo do registo eleitoral e sobre a não publicação das listas dos cidadãos maiores registados foi interposta pela vice-presidente da UNITA, Arlete Chimbinda, e pelo presidente do Bloco Democrático (BD), Filomeno Vieira Lopes.
A presidente do TC, Laurinda Cardoso, argumenta o indeferimento da providência cautelar, no seu despacho por “ausência de legitimidade dos interessados e por não terem sido esgotadas as vias administrativas previstas na lei”.
A providência cautelar foi impetrada em nome dos partidos políticos UNITA e BD, “porém, a procuração junta ao processo não faz qualquer menção a essas instituições, mas somente a duas pessoas singulares, nomeadamente Arlete Leona Chimbinda [vice-presidente da UNITA e deputada] e Filomeno Vieira Lopes [presidente do BD], sem referência da qualidade em que estes intervêm”, argumenta o despacho de Laurinda Cardoso.
“O indeferimento, parte da questão que tem que ver com a legitimidade. O TC sabe perfeitamente que a deputada Arlete Chimbinda é vice-presidente da UNITA, foi feita a anotação no mês de Março dos órgãos directivos da UNITA, e da mesma forma em Março foi feita a anotação dos órgãos directivos do BD e foi anotado como presidente Filomeno Vieira Lopes”, observou Mihaela Webba.
“Portanto, quer um e outro, estavam na condição de representar os respectivos partidos políticos e não colhe a ideia que estavam enquanto cidadãos e não enquanto líderes a representarem os seus respectivos partidos”, respondeu a deputada quando questionada pela Lusa.
Mihaela Webba, que falava em conferência de imprensa, em Luanda, disse também que a justificação de que deveriam “esgotar as instâncias e só depois recorrer ao TC também não colhe”.
Porque a Lei do Registo Eleitoral Oficioso “permite que o cidadão faça a reclamação no município de um erro ou de uma omissão e, posteriormente, depois de não ser atendido na administração municipal fazer recurso ao MAT [Ministério da Administração do Território] e só depois se o MAT não lhe der razão fazer recurso ao TC”.
Ora estas situações, prosseguiu, “são para erros e omissões do registo eleitoral, não é o caso aqui, o caso aqui é a violação que o MAT está a fazer à Lei do Registo Eleitoral Oficioso e, portanto, quando se trata de violação da lei estamos a falar de violação do princípio da legalidade”.
“Logo, estamos a falar da violação da Constituição e quem é competente para verificar estas situações não é a administração municipal ou o MAT, mas é efectivamente o TC, logo a presidente do TC também errou neste pressuposto”, sustentou a também jurista. A deputada admitiu também “recorrer” deste despacho do TC ou poder “intentar uma outra acção”.
Segundo ainda a vice-presidente do grupo parlamentar da UNITA, o requerimento da providência cautelar do seu partido e do BD deveria ser verificado pela vice-presidente do TC e não por Laurinda Cardoso pelo facto desta “ter ainda vínculo laboral com o MAT”. Laurinda Cardoso antes de ser indicada para dirigir o Tribunal Constitucional angolano era secretária de Estado do MAT.
“Ela [Laurinda Cardoso] saiu do MAT em comissão de serviço para o TC, foi directora no MAT, foi secretária de Estado no MAT e, portanto, tem um vínculo laboral no MAT que foi interrompido, não cessou”, argumentou Mihaela Webba.
Por comissão de serviço, frisou, “significa dizer que ela tendo esta situação relativamente ao MAT, deveria se mostrar impossibilitada e fazer escusa e permitir que fosse a vice-presidente do TC a verificar o requerimento” da providência cautelar.
O Tribunal Constitucional anunciou o indeferimento de uma providência cautelar interposta pela UNITA, que alega não terem ainda sido publicadas as listas do registo eleitoral provisório, a menos de três meses das eleições gerais.
A UNITA e a BD — os dois partidos que formam a Frente Patriótica Unida — interpuseram uma providência cautelar junto do TC, alegando “irregularidades detectadas no processo eleitoral”, designadamente, a não publicação das listas do registo eleitoral provisório, nos termos do artigo 399.º do Código do Processo Civil.
A publicação das listas em cada um dos postos do registo permitiria aos eleitores angolanos verificar a conformidade dos respectivos registos eleitorais, mas também uma purga eficiente dos eleitores desaparecidos constantes nas mesmas listas, argumentam os partidos da oposição angolana.
Folha 8 com Lusa
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