A economista Helena Afonso, do Departamento das Nações Unidas para Assuntos Económicos e Sociais (UNDESA), afirma que “a economia de Angola em 2022 deverá crescer pela primeira vez em seis anos, depois de ter contraído 4% em 2020, a quinta consecutiva e a mais grave em 30 anos, e em 2021 estimamos um crescimento nulo dada a menor produção petrolífera, apesar do aumento dos preços”.
Em declarações à Lusa na sequência da divulgação do relatório sobre a Situação e Perspectivas Económicas Mundiais deste ano, na quinta-feira, Helena Afonso afirmou que “este ano Angola deverá crescer 2,4%, fruto de maiores receitas petrolíferas tanto pelo lado dos preços, como da produção, e de maior estabilidade macroeconómica, que incentivará o investimento”. No entanto, salientou, “a economia continua abaixo dos níveis de produção pré-pandemia até 2023”.
O segundo maior produtor de petróleo na África subsaariana “enfrenta o maior surto de Covid-19 desde o início da pandemia, devido à variante Ómicron, e esta e outras potenciais ondas de infecção vão continuar a limitar a recuperação do consumo e do investimento até o país chegar a níveis de vacinação que permitam a imunidade de grupo, que é improvável em 2022, dado que apesar dos muitos progressos desde Setembro, só há 13% da população completamente vacinada”.
Relativamente à inflação, a previsão do UNDESA aponta para uma subida dos preços à volta de 20%, o que “erode os rendimentos das pessoas e reduz o consumo, mas modera face ao pico do ano passado devido à menor depreciação do kwanza, redução do IVA e uma política monetária menos acomodativa”, disse a economista.
Depois de os preços terem terminado o ano com uma subida de 27% em Dezembro, segundo o Instituto Nacional de Estatística, “o consumo e o poder de compra também estão a ser atingidos pelo alto nível de desemprego, que é fruto dos sucessivos anos de recessão”.
A dívida pública, acrescentou, “subiu muito em 2020, para 120% do Produto Interno Bruto (PIB), e está elevada, mas deverá moderar tendo em conta a velocidade de crescimento do PIB em função do crescimento da dívida”.
Ainda assim, salientou, “o risco de uma crise da dívida não pode ser descartado e é necessária uma implementação mais célere de reformas para ver mais e melhor desenvolvimento naquela que é uma das maiores economias africanas”.
O UNDESA melhorou na quinta-feira a estimativa de crescimento para as economias africanas, antevendo uma expansão de 3,8% no ano passado e uma aceleração para 4% este ano.
“A actividade económica em África continua a recuperar dos eventos sem precedentes de 2020, mas a um ritmo frágil, com a previsão de crescimento a ser marcada pela elevada incerteza e exposição a repetidas vagas de infecção por Covid-19, como se viu recentemente com a variante Ómicron”, escrevem os analistas da UNDESA.
No relatório sobre a Situação e Perspectivas Económicas Mundiais para 2022, que melhora a previsão de crescimento do ano passado de 3,4% para 3,8%, o UNDESA aponta que as medidas de mitigação da pandemia, como os confinamentos e proibições de viagens, foram os principais instrumentos usados pelos governos, mas tiveram um impacto importante na actividade económica.
O continente africano “teve uma das recuperações mais lentas em 2021, ficando atrás da média de crescimento das economias em desenvolvimento e do mundo, respectivamente 6,4% e 5,5%”, diz o UNDESA, que alerta que “para regressar à trajectória de crescimento antes da pandemia, África precisaria de crescer aproximadamente 6% neste e no próximo ano, ou seja, mais rápido que a Ásia”.
Cabo Verde deve diversificar economia além do turismo
No caso de Cabo Verde, Helena Afonso considera que a economia está a recuperar da pandemia, salientando a necessidade de diversificar as fontes de receitas fiscais.
“Cabo Verde deverá crescer 5% este ano, contando com um levantamento progressivo das restrições às viagens, maior vacinação a nível global, mas também contando com o crescimento de outras exportações, em linha com o crescimento da procura de parceiros europeus e recuperação em sectores como agricultura, construção e transportes. No entanto, não será suficiente para chegar ao nível de 2019 devido à enorme recessão de quase 15% em 2020 e crescimento de apenas 3,8% em 2021”.
Helena Afonso afirma que “com uma dívida pública acima de 150% do PIB, o crescimento será importante para manter a sustentabilidade da dívida, mas é importante mitigar os efeitos económicos e sociais da pandemia e, a médio prazo, diversificar a economia para lá do turismo e gerar receitas de mais fontes”.
Cabo Verde está a assistir ao regresso dos turistas, mas ainda assim “a um nível muito abaixo de antes da pandemia”, o que é especialmente preocupante para um país que tinha, em 2019, cerca de 40% do PIB dependente do turismo.
“O sector é um dos pilares da economia, valia 40% em 2019, agora vale 25%, e está numa recuperação lenta e incerta, com progressos na vacinação, com quase metade da população completa, e isso é muito encorajador porque está claramente acima da média em África”, diz Helena Afonso, acrescentando, ainda assim, que “a variante Ómicron trouxe um aumento de casos e atrasou a recuperação do turismo e de outros sectores, pelo que a recuperação económica é incerta, até porque não se pode excluir a possibilidade de surgirem novas variantes em 2022”.
“As economias dependentes do turismo em África têm perspectivas positivas de evolução, embora a base seja bastante baixa, impulsionadas pelo abrandamento das restrições às viagens e à recuperação económica nos mercados de origem, na Europa e na Ásia, bem como devido à maior confiança para viajar associada com o sucesso das medidas de contenção e taxas de vacinação relativamente altas, como existe em Cabo Verde, Ilhas Comores, Maurícias, Marrocos, São Tomé e Príncipe e Tunísia”, diz a ONU.
Folha 8 com Lusa