ANGOLA DE JLO SUPERA UGANDA DE IDI AMIN DADA

A raiva, raivosa de 2017/18, resvalou na raiva boçal, em 2019, para em 2020, na tentativa de salvação da borrada, ter optado por aliar-se, em 2021, ao ódio ao invés da conciliação. E, de ódio em ódio até ao ódio final, as estruturas e órgãos públicos do país vêem sendo assassinadas, violadas e destruídas, para beneficiar um autor e tribo partidocrata. É uma marcação, tal como o pingar (xixi), de um cão quando se desloca para ter noção do caminho. A casta no poder caminha de igual forma, ao transformar adversários em inimigos, na lógica de prescindir da distância entre o verbo e os actos.

Por William Tonet

O Uganda é já aí, na esquina. O retrato de assassinatos no consulado de Idi Amin Dada, ainda estão na memória de muitos pela sua boçalidade política. É urgente que todos, em função do rumo desgarrado do país, tirem os devidos exemplos.

A mente dos cidadãos autóctones, paridos e gerados no nosso torrão identitário, acordou, no 12 de Janeiro 2022, ainda mais apreensiva, com a manifestação verbal do Presidente da República que, ao invés de apagar a imagem dos actos de 10.01, atiçou ainda mais a frustração geral.

A expectativa geral era, tal como em qualquer país civilizado, ouvir de João Lourenço análises desapaixonadas sobre as causas, que leva(ra)m jovens a responsabilizar, exclusivamente, o MPLA pelo infortúnio do desemprego, fome e miséria, que grassa pelo país.

“O que ocorreu (no dia 10.01.22) foi um verdadeiro acto de terror cujas impressões digitais deixadas na cena do crime são bem visíveis e facilmente reconhecíveis, e apontam para a materialização de um macabro plano de ingovernabilidade através do fomento da vandalização de bens públicos e privados, incitação à desobediência e à rebelião, na tentativa da subversão do poder democraticamente instituído”.

Não! Não, não e não, Presidente. O senhor não pode continuar a dar tiros no próprio pé, olvidando os múltiplos poderes, que lhe obrigam a um escrutínio verbal. É verdade que “errare humanum est”, dizem os latinos, mas persistir no erro, sendo avesso à correcção, pode ser um defeito de fabrico, que cega o autor político comprometido com o autoritarismo.

No despoletar de uma crise ou ciclo de crises, como a do 10.01.22, a tribo política, no poder, tendo higiene intelectual, não pode, de per si, apontar o dedo, aos adversários, quando estes não têm a mão na massa. Mais grave ainda é quando o “chefe maior” diz ter ciência de pormenores, sobre um plano macabro, “de ingovernabilidade” e nada ter feito para impedir a sua materialização.

Com esta afirmação e na condição de Chefe de Estado levanta o preceito da cumplicidade, logo a suspeição de ter havido preparação sub-reptícia, visando o derramamento de sangue, em larga escala, a destruição de património imóvel e móvel, para, neste ambiente dantesco, serem introduzidos elementos incriminadores, contra os adversários, bem como a legitimação partidocrata de uma musculada intervenção policial e militar, como é apanágio nos regimes de pendor autoritário, como o angolano.

É preciso dizer que depois de 10 de Janeiro, mais de 500 jovens, chefes de família, trabalhadores da ZAP, “assassinamente” atirados para o desemprego, pela política económica do Titular do Poder Executivo, poderão manifestar a sua indignação em hasta pública e a forma de comportamento, terá muito a ver com o estado em que estarão os respectivos estômagos, uma vez que a fome não espera, nem tem paragem de racionalidade, quando aperta…

É preciso reconhecer os erros de má gestão e má governação, assentes na indignidade, discriminação, tribalismo, baixo coturno e confusão pragmática, durante os 46 anos de um regime partidocrata, intolerante e que não sabe dialogar, pelo contrário, é adepto de retórica perigosa, como a de vir a terreiro afirmar, sem pudor, conhecer as “impressões digitais deixadas na cena do crime”, sem exibir os dedos dos autores, mas inclinar naturalidade partidocrata, ao adversário político, de quem tem medo, como diabo da cruz, numa flagrante, acusação caluniosa, prevista e punível pelas leis pátrias.

O momento deveria servir para o MPLA colocar sementes de amor, ao invés de mais lenha na fogueira, inimiga das pontes para uma verdadeira conciliação, capaz de nos levar à reconciliação. Infelizmente, o partido no poder: MPLA, deixou de ter reservas morais e o seu presidente, não é, como nos partidos democráticos, o primeiro inter-pares, mas é um órgão concentrador de todos os poderes e “autoritarismo stalinistas”. É como se fosse uma anaconda no reino dos répteis… Deplorável!

Num país civilizado, quando acorda sobressaltado, pela acção reivindicativa de um segmento de cidadãos, espera-se dos governantes a ponderação, higiene intelectual e distanciamento do intestino grosso ao cérebro…

Existem problemas conjunturais. Reais! Absolutos, criados pela péssima governação, carentes de uma solução, logo, nada relativos, como a fome, miséria, desemprego, abuso de liberdade de imprensa, falta de contraditório, na comunicação social pública, justiça partidocrata e discriminatória, encerramento de empresas angolanas, inflação, alta dos preços da cesta básica, aumento de pobres a comer nos contentores, violência policial e terrorismo de Estado.

Numa hora, como a de 10 de Janeiro, o expectável seria o Presidente da República sugerir ou aderir a um PACTO DE REGIME, onde as sensibilidades dos vários povos e micro-nações, suplantando as vaidades das “cabaças ideológicas”, emprestando humildade, sentido de dever, democraticidade e respeito pela diferença, levasse todos à volta de um django, a pensar PAÍS, por estarmos, perigosamente, a descarrilar, para um poço, sem fundo.

Na manifestação de 10 de Janeiro de 2022, felizmente, para os cidadãos, em Luanda, a polícia nacional partidocrata, não teve argumentos, nem os agentes do Comando Municipal do Benfica se predispuseram a acatar as ordens superiores, para o cometimento de crimes, como os ocorridos, coincidentemente, no dia 30 de Janeiro de 2021, em Kafunfu, onde agentes policiais assassinaram mais de 150 cidadãos, que participavam numa manifestação pacífica, previamente comunicada as autoridades, contra os altos níveis de desemprego e ausência de políticas tendentes à diminuição da fome e miséria, que grassam, numa região rica e produtora de diamantes.

A lei da bala, nem sempre impera e, no caso em tela, é preciso analisar de forma desapaixonada, as razões objectivas e subjectivas, que levaram os cidadãos a responsabilizar, única e exclusivamente, como causadores das suas desgraças, o MPLA e o seu presidente João Lourenço?

Eles foram os símbolos visados, merece séria reflexão, intrigando ainda o facto de nenhum jovem, ter tido a pretensão de se apossar dos computadores, secretárias, cadeiras, gerador, fotografias, etc., considerados, como expressão do mal.

O MPLA depois de tantos anos de governação, deve descer as escadas da humildade e reflectir, sobre as razões de em 38 anos de ditadura, capitaneada por José Eduardo dos Santos, também, com desemprego, fome e intolerância, nunca à luz do dia, ao vivo e a cores se rasgou a foto deste e, em cinco anos, ser banal a vandalização das de João Lourenço.

O MPLA/JLo é incapaz de descortinar a variável primária: José Eduardo dos Santos, também, não arranjando emprego, para os cidadãos, garantia-lhes, fruto de maior sensibilidade, trabalho, que ajudava a maioria a debelar a fome, com base na baixa do preço dos produtos da cesta básica, onde com uma nota de 5 mil kwanzas, se comprava uma caixa de coxa (1200Kwz), um saco de fuba (1000), um saco de arroz de 50 kg (1300), caixa de massa (700,00), óleo alimentar (1200,00 Kwz).

Hoje o mesmo montante: 5.000,00 não chega para comprar um dos itens acima: saco de arroz 25kg (12.000,00 Kwz), saco fuba 25kg (15.000,00), saco feijão 25kg (32.000,00), caixa de massa (6.000,00), óleo alimentar (15.000,00). Aliado a estes valores, mais 14% do IVA e os múltiplos impostos do FMI tornam a vida dos cidadãos um grande sufoco, que não carece de qualquer incitação de partido político, para o óbvio: preços altos + desemprego = Fome absoluta.

O MPLA deve discutir as razões de, na ditadura de 38 anos, José Eduardo dos Santos ter mantido o partido no poder unido, ao contrário de, nos últimos cinco anos, as divergências internas serem trazidas pelo novo presidente à praça pública, chegando mesmo a desqualificar, ostracizar, humilhar e prender, os principais cabos eleitorais, tais como Higino Carneiro, Norberto Garcia, Bento Kangamba, Bento Bento (actual primeiro secretário de Luanda), Bornito de Sousa, Fernando da Piedade, Boavida Neto, Isaac dos Anjos, Pitra Neto, Augusto Tomás (preso político e único de Cabinda), Dino Matross, França Ndalu, Dino do Nascimento, Hélder Vieira Dias, Tchizé dos Santos, Isabel dos Santos, alguns apresentados, pejorativamente, como marimbondos, larápios do erário público e os maiores corruptos do MPLA, o que, a priori, os desqualifica, para qualquer jornada eleitoral.

O MPLA tem de reflectir, as razões de, tanta gente, nos últimos cinco anos, alimentar-se nos contentores do lixo, sem qualquer vergonha, a qualquer hora do dia, quando nem no tempo de guerra, tais imagens desfilavam na nossa biblioteca mental.

O MPLA/JLo tem de reflectir sobre as motivações e obsessão de, selectivamente, perseguir, mandar para o desemprego, encerrar empresas e bancos comerciais de camaradas seus (fontes dizem ter Kundi Pahiama sucumbido mais rápido devido a isso), colegas dos desvios do erário público, que ao menos, investiram no país, garantindo emprego.

Na história política, ninguém alheio aos 40 ladrões pode substituir Ali Babá, logo, nesta bifurcação, o MPLA, salvo grave ingenuidade, não pode esperar que os jovens, a maioria no desemprego, acreditem haver puros, honestos e milionários, fruto de trabalho honesto, quando é consabido, ser bastante uma batata podre, contaminar o saco…

O MPLA deve ainda discutir uma diferença comportamental relevante, que se prende no facto de José Eduardo dos Santos, no consulado de 38 anos de ditadura, nunca ter assassinado, em plena manifestação pacífica, nenhum jovem revú ou activista, ao contrário de uma prática comum, no reinado de João Lourenço, onde Joana Cafrique, Inocêncio da Mata e mais de 150 cidadãos do Kafunfu, no maior genocídio, cometido neste consulado bastante conturbado.

A diferença tendo havido assassinatos bárbaros, nos dois períodos, Cassule, Kamulingue e Hilbert Ganga, não sucumbiram, durante as manifestações, nem nas cadeias (circulava sozinho no carro, sem máscara) como aconteceu com o médico pediatra, Sílvio Dala.

A perseguição impiedosa, utilizando todos os recursos, meios e órgãos do Estado, contra os adversários políticos, a proibição de não legalização de partidos políticos, as prisões arbitrárias, os julgamentos selectivos, o rio de sangue, causado pelo assassinato de jovens inocentes, estão a colocar, nestes cinco anos, Angola a ombrear com as crateras iguais às do Uganda de Idi Amin Dada. Custa ter de chegar a esta comparação, mas a verdade é que o país precisava de tudo menos de um “chefe mau”, que renega o seu passado, apunhala o antecessor, por ironia do destino, seu pai político, que no final de uma maratona de 38 anos, lhe entregou, de bandeja os poderes: do partido: MPLA e da República.

Os melhores amigos de João Lourenço, nestes cinco anos, para desgraça colectiva, têm sido, infelizmente, a raiva e o ódio, que o afastam de muitos “camaradas” do partido, da oposição com coluna vertebral, da economia, do dinheiro e da juventude, que o vê como arrogante, autoritário e um ditador, três vezes pior do que José Eduardo dos Santos.

Finalmente, estando João Lourenço a governar sem maioria absoluta, tem poder absoluto, para o cometimento de todos os excessos e subversões… Um bem, para a sua vaidade umbilical e um mal, para o país e a incipiente democracia.

A imagem degradada, bem como o aumento da aversão ao MPLA, principalmente, por parte da juventude, que o vê como um partido cancerígeno e responsável da desgraça da maioria dos angolanos, deve-se a um erro de cálculo, em 2018, de alguns gurus do regime, ao combaterem a tese de bicefalia, proposta por Eduardo dos Santos, que seriam a tábua de salvação e rejuvenescimento do próprio partido do regime, com um militante como líder e outro militante como Presidente da República. Este figurino levaria a um melhor desempenho do executivo, que poderia ser condicionado, por uma bancada parlamentar menos submissa ao Titular do Poder Executivo e mais independente, em relação à linha programática do partido.

Hoje, no actual contexto de tão descredibilizado, dividido e com acesas lutas internas, o MPLA é uma manta de retalhos, sem capacidade de navegar em mares, que não ditatoriais, como ficou expresso na declaração de João Lourenço no dia 12 e, depois, na truculenta ameaça de Eugénio Laborinho, Paulo de Almeida, numa sombria entrevista transmitida, pela TPA, no 14.01.22, onde ministro do Interior e Comandante Geral da Polícia Nacional ameaçam os cidadãos a não exercerem direitos constitucionalmente consagrados, como o direito à indignação, liberdade de expressão, liberdade de imprensa e liberdade de reunião e de manifestação, tudo na tentativa de tentar sobreviver à avalanche de rejeição, capaz de o retirar do poder, havendo eleições livres, justas e transparentes, em Agosto de 2022.

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