O Presidente da República de Angola, João Lourenço, encorajou hoje as autoridades centro-africanas a assumirem e liderarem o processo de paz no país, afirmando que se aproximam do fim as diligências regionais, com bons resultados.
João Lourenço também presidente em exercício da Conferência Internacional sobre a Região dos Grandes Lagos (CIRGL), fez em Luanda o discurso de abertura da terceira mini-cimeira da CIRGL sobre a situação política e de segurança na República Centro-Africana (RCA).
No encontro participam os Presidentes da República do Congo, Sassou Nguesso, e da RCA, Faustin-Archange Touadéra, os presidentes do Conselho Militar de Transição da República do Chade, Mahamat Idriss Déby, e Comissão da União Africana, Moussa Faki Mahamat, e representantes dos chefes de Estado dos Camarões, Sudão, República Democrática do Congo (RD Congo) e Ruanda.
O chefe de Estado angolano acredita que, com a mini-cimeira, se está a caminhar para a “conclusão de um ciclo de diligências regionais” cujos resultados deixam a esperança de que será alcançada brevemente uma solução sustentável e duradoura para o conflito na RCA.
Encorajou, por isso, o Presidente Faustin Archange Touadéra a “continuar com a força de vontade e compromisso que tem demonstrado, assumindo e liderando este processo de paz”, capitalizando os esforços de negociação que têm sido levados a cabo.
“Num momento em que assistimos ao recrudescer das acções de terrorismo na região do Sahel, ao ressurgimento do fenómeno do mercenarismo e à alteração da ordem constitucional por via de golpes de Estado na África do Oeste, como no Mali e mais recentemente na Guiné, a República Centro-Africana não deve perder esta oportunidade que se lhe oferece de alcançar a paz”, advogou João Lourenço.
E acrescentou: “Não apenas pela via da conjugação de esforços das forças militares nacionais e do contingente das Nações Unidas, mas também em capitalizar os avanços alcançados no campo da negociação quer com as forças políticas internas da oposição e da sociedade civil, assim como com as lideranças dos grupos rebeldes a partir do exterior, através dos bons ofícios de Angola, do Ruanda e do Chade em nome das duas sub-regiões, a CIRGL e a CEEAC”.
João Lourenço sublinhou que o roteiro para a paz aprovado em Abril é um importante instrumento, que define os principais eixos e o conjunto de acções a implementar no âmbito do processo de pacificação, e que a participação de todas as forças vivas centro-africanas será indispensável para o seu sucesso.
Reportou ainda as diligências feitas relativamente ao levantamento definitivo do embargo de armas de que a RCA ainda é vítima, destacando que em 23 de Junho, em Nova Iorque, durante a reunião extraordinária do Conselho de Segurança da ONU foram “apresentadas as acções realizadas a nível regional no âmbito da resolução do conflito centro-africano” e feito um apelo à solidariedade e ao apoio da comunidade internacional “no sentido de juntar-se à visão e esforços da região para o alcance de uma paz duradoura naquele país”.
Foi também manifestada a preocupação quanto ao embargo de armas, na medida em que a RCA “está a viver um contexto político interno diferente, caracterizado pela legitimidade das instituições do Estado”, e as autoridades centro-africanas estão impedidas de usufruir das capacidades necessárias para garantir a sua própria segurança.
Realçou, por outro lado, que a resolução entretanto adoptada reflecte já “um relativo aliviamento do referido embargo”.
João Lourenço apelou ainda que a cimeira junte a sua voz à da Comunidade Económica de Estados da África Ocidental (CEDEAO), da União Africana e das Nações Unidas, pela libertação imediata e incondicional de Alpha Condé, Presidente da República da Guiné-Conacri.
Na cimeira será apresentado um relatório sobre a implementação das decisões saídas da 2.ª mini-cimeira de Luanda de 20 de Abril de 2021, bem como o Roteiro Conjunto para a Paz na República Centro-Africana (Repúblicas de Angola e do Ruanda).
ONU afasta militares gaboneses
As Nações Unidas decidiram retirar da sua força de manutenção da paz na República Centro-Africana cerca de 450 militares gaboneses, após acusações de exploração e abuso sexual, que o Governo gabonês está a investigar, anunciou Libreville.
“Nas últimas semanas, factos de particular gravidade, contrários à ética militar e à honra dos exércitos, cometidos por alguns elementos dos batalhões gaboneses (…) foram relatados”, anunciou o Ministério da Defesa gabonês numa declaração.
“Na sequência dos muitos casos de alegada exploração e abuso sexual sob investigação, as Nações Unidas decidiram retirar o contingente gabonês da Missão das Nações Unidas na República Centro-Africana (Minusca) e “foi aberto um inquérito pelo Gabão”, afirma a mesma declaração.
A Minusca foi destacada pela ONU em Abril de 2014, para tentar pôr fim à guerra civil sangrenta que se seguiu a um golpe de Estado no ano anterior contra o então Presidente François Bozizé.
A luta que se seguiu entre a coligação de grupos armados que o derrubaram, a Séléka, predominantemente muçulmana, e milícias apoiadas pelo chefe de Estado deposto, anti-balaka, dominadas por cristãos e animistas, atingiu o seu auge entre 2014 a 2015.
Desde então, a intensidade da guerra civil na República Centro-Africana diminuiu consideravelmente, mas a Minusca ainda tem cerca de 15.000 efectivos no país da África Central, 14.000 dos quais fardados, com a missão prioritária de proteger os civis.
As acusações de crimes sexuais contra as forças de manutenção da paz são recorrentes na República Centro-Africana, e alguns contingentes foram retirados no passado, mas nenhuma investigação conduziu a condenações até à data, pelo menos publicamente.
Para além da Minusca, também a União Europeia tem uma força destacada no país, que constitui a Missão de Treino da União Europeia na República Centro-Africana (EUTM-RCA), cujo comando Portugal assumiu durante o último ano, desde Setembro de 2020, e acaba de entregar a um general francês. Portugal mantém duas dezenas de efectivos nesta missão.
No passado dia 5, foi noticiado que o antigo chefe de uma das milícias acusadas pela ONU de crimes contra a Humanidade na República Centro-Africana fora detido.
Trata-se de Eugène Barret Ngaïkosset, ex-membro do corpo de segurança do antigo Presidente François Bozizé, tornou-se a seguir um líder destacado das milícias cristãs e animistas, fundadas por Bozizé, para combaterem a Séléka.
Os dois grupos mergulharam o país numa guerra civil sangrenta e foram acusados em 2015 pelas Nações Unidas de “crimes de guerra” e “crimes contra a Humanidade”, levados a cabo durante os anos de 2014 e 2015, no auge do conflito.
Ngaïkosset “foi detido durante a inauguração da nova base logística das forças armadas” do país, nas imediações da capital (Bangui), disse o ministro da Justiça da RCA, Arnaud Djoubaye Abazene.
Ngaïkosset é apelidado de “carniceiro de Poua” pelos meios de comunicação social da RCA, numa referência aos massacres nesta cidade do noroeste do país, pelo exército, entre 2005 e 2007, quando o agora detido era um dos chefes da guarda presidencial.
Considerado pela ONU como o segundo país menos desenvolvido do mundo, a RCA caiu no caos e na violência em 2013, após o derrube de François Bozizé.
Os confrontos entre os dois grupos obrigaram quase um quarto dos 4,7 milhões de habitantes da RCA a abandonarem as suas casas.
Folha 8 com Lusa