A marca angolana Café Ginga estará disponível no mercado francês e suíço ainda este mês, através da empresa Angonabeiro, que aposta “de forma consistente” na internacionalização do “bago vermelho” de Angola. É altura de Téte António nos explicar se os portugueses já não são tão culpados como disse, em 2015, que eram.
Em declarações recentes à Angop, a propósito do actual momento do mercado cafeícola angolano, o director-geral regional para os mercados internacionais do Grupo Nabeiro, José Beato, assegurou que a Angonabeiro está fortemente empenhada em revitalizar a fileira deste produto, desde o cultivo até à transformação e comercialização.
No âmbito da recuperação do prestígio que o café angolano teve na década de 70, no mercado interno e externo, período em que Angola foi o terceiro maior produtor mundial, José Beato destacou a exportação de duas mil toneladas, nos últimos dois anos (2019-2020), em países como Namíbia, Senegal, China e EUA.
José Beato afirmou que a empresa compra e exporta café verde de Angola para a “casa mãe” em Campo Maior (Portugal), incorporando este produto em vários misturas e posteriormente exportado de Portugal para cerca de 50 países, onde a marca “Delta Cafés” tem presença directa.
Embora de forma tímida e pontual, José Beato lembrou que a Angonabeiro exportou o Café Ginga, em 2020, para Portugal, facto que marcou o lançamento deste produto no mercado português. A sua exportação, de forma permanente e consistente, é o principal objectivo a curto prazo, segundo o responsável.
Além disso, referiu José Beato, a Angonabeiro está igualmente a trabalhar no sentido de introduzir o café no dia-a-dia dos consumidores angolanos, com vista a aumentar os hábitos de consumo.
“Somos uma das empresas angolanas que continua a apostar na exportação de produtos locais, com o objectivo de gerar valor acrescentado para a economia do país e crescimento nos negócios”, reforçou.
A Angonabeiro, com um vasto portefólio de marcas próprias e representadas, está presente nas categorias de café, chá, açúcar, vinhos, azeite, leite, água, massas alimentares, bolachas e tostas.
Em Novembro de 2014, o Governo angolano aprovou a privatização e venda de 100% do capital da empresa pública de produção de café Liangol à Angonabeiro, unidade do grupo português Nabeiro.
A decisão constava de um decreto executivo conjunto dos ministros da Economia, Abrahão Gourgel, e da Indústria, Bernarda da Silva, de 13 de Novembro.
O grupo português já tinha sido convidado pelo Executivo angolano a colaborar na reactivação da antiga fábrica de café Liangol, em Luanda, uma unidade produtiva com a marca Ginga. Esta foi retirada à estatal Empresa de Liofilização e Moagem de Café (Limoca), conforme estabelecia o mesmo decreto, e vendida à Angonabeiro.
Angola já foi o terceiro maior produtor mundial de café, com 200 mil toneladas anuais, antes de 1975, ano em que se tornou independente e passou a se governada pelo MPLA. Essa produção está hoje reduzida a menos de 10%, fruto do abandono do cultivo durante a guerra civil angolana que, contudo, já terminou há 19 anos.
O Executivo angolano justificou a privatização desta fábrica com um programa económico nacional para “valorizar as unidades industriais com elevado potencial de crescimento e geradoras de divisas”.
A fábrica Liangol foi inaugurada a 25 de Maio de 2001 e asseguravs a torrefacção de café, com a recuperação da marca angolana Ginga.
O mesmo decreto recordava que a Angonabeiro “pretende expandir a produção e comercialização, no mercado nacional e internacional, do café de marca Ginga, com a injecção de capitais adicionais, tecnologia e ‘know-how’ na cadeia produtiva e nos canais de distribuição”. Reconhecia ainda o “impacto” que o processo de privatização da Liangol teria na economia nacional, “particularmente ao nível das contas nacionais e sobre o mercado de trabalho do país”.
O Executivo aprovava desta forma a privatização daquela fábrica, a 100%, “por ajuste directo a favor da Angonabeiro – Comércio e Indústria de Café”, referia o decreto. O preço da venda, adiantava, seria determinado com base numa avaliação patrimonial actualizada.
A Angonabeiro é uma empresa do grupo Nabeiro, fundado em 1961 pelo comendador Rui Nabeiro, com sede em Campo Maior. Desde 2000 que a Angonabeiro actua no mercado angolano, na área do comércio e da indústria, através das marcas de café Ginga e Delta, entre outros produtos.
Propaganda não faz o café crescer
No dia 23 de Novembro de… 2015, o director do Instituto Nacional do Café defendeu – qual navegador que descobriu a pedra filosofal – a aposta de Angola no modelo agro-exportador, nomeadamente do café, que considerou ser o único nesse momento com hipótese de competir rapidamente no mercado internacional, tal como aconteceu no passado.
Na altura, o embaixador da missão permanente de observação da União Africana junto da ONU, o angolano Téte António (hoje ministro das Relações Exteriores), disse que “todos os dirigentes africanos estão cientes de que é preciso diversificar as economias”, explicando que o atraso se devia aos resquícios do colonialismo, pelo que “não podemos negar que o legado colonial ainda tem um grande peso nos nossos países”.
Estaria a referir-se ao que o colonizador fez em prol do café angolano e que, 45 anos depois, ainda está muitíssimo longe de ser atingido pelos peritos do MPLA, tipo Téte António?
O director do Instituto Nacional do Café, João Ferreira, falava à imprensa, à margem da reunião de peritos, que antecedeu a 11ª Assembleia-geral da Rede de Pesquisa de Café Africana, que decorreu em Luanda, envolvendo 500 especialistas de 25 países.
Segundo o responsável, numa altura que Angola realizava esforços para diversificar a sua economia, face à crise petrolífera, o Governo tem que pensar no modelo agro-exportador para ganhar “alguma divisa na produção agrícola”, sendo que no passado já foi um dos maiores produtores mundiais de café. Estávamos em 2015.
“Não me parece que as outras culturas consigam impor-se no mercado internacional, até porque a competitividade de países tem custos de produção muito mais inferiores”, disse João Ferreira.
O responsável referiu que Angola tinha então (2015) uma “fraquíssima” produção de café, de cerca de 12 mil toneladas por hectare, e registava igualmente níveis baixos de industrialização. Tudo por culpa dos colonialistas portugueses, segundo Téte António.
De acordo com o responsável, um dos desafios era munir o continente africano de tecnologia de ponta, para se passar da “cultura do café intensiva em mão-de-obra para uma cultura intensiva em capitais”. Será na defesa desta tese que hoje se incentiva a produção familiar?
“África precisa mecanizar a cultura do café, é preciso utilizar alguns agro-químicos, é preciso revermos o nosso sector do café, para torná-lo mais competitivo. O que estamos a discutir do ponto de vista da investigação é um pouco isto: que projectos fazer, que tipo de tecnologias abordar, que tipos de laboratórios termos, se vamos para o tipo de reprodução do café, por sistema de produção generativa vegetativa, que tipos de variedades conservar”, explicou João Ferreira.
África representava em 2015 cerca de 5% da produção mundial de café, tendo uma baixa competitividade, fracas produções por hectare, que variam entre as 300 e os 500 quilogramas por hectare, enquanto os outros países apresentam produções de cerca 3.000 quilogramas por hectare.
Enquanto província ultramarina de Portugal, até 1974, Angola era auto-suficiente, face à diversificação da economia. Não tenhamos receio de aprender com quem sabe mais e fez melhor, muito melhor. Só assim poderemos ensinar a quem sabe menos.
Angola era o segundo produtor mundial de café Arábico; primeiro produtor mundial de bananas, através da província de Benguela, nos municípios da Ganda, Cubal, Cavaco e Tchongoroy. Só nesta região produzia-se tanta banana que alimentou, designadamente a Bélgica, Espanha e a Metrópole (Portugal) para além das colónias da época Cabo-Verde, Moçambique, Guiné-Bissau e São Tomé e Príncipe.
Era igualmente o primeiro produtor africano de arroz através das regiões do (Luso) Moxico, Cacolo Manaquimbundo na Lunda Sul, Kanzar no Nordeste Lunda Norte e Bié.
Ainda no Leste, nas localidades de Luaco, Malude e Kossa, a “Diamang” (Companhia de Diamantes de Angola) tinha mais 80 mil cabeças de gado, desde bovino, suíno, lanígero e caprino, com uma abundante produção de ovos, leite, queijo e manteiga.
Na região da Baixa de Kassangue, havia a maior zona de produção de algodão, com a fábrica da Cotonang, que transformava o algodão, para além de produzir, óleo de soja, sabão e bagaço.
Na região de Moçâmedes, nas localidades do Tombwa, Lucira e Bentiaba, havia grandes extensões de salga de peixe onde se produzia, também enormes quantidades de “farinha de peixe”, exportada para a China e o Japão.
Folha 8 com Angop