O Governo angolano adiou para 15 de Julho a entrada em vigor do aumento (como exige o Fundo Monetário Internacional) do tarifário da energia, que sofre um reajuste até 97%, deixando o Estado de a subvencionar, informou o Ministério das Finanças. Na electricidade, “categoria doméstica monofásica”, onde se encontram integrados a maioria dos consumidores, o aumento será de 66%.
Um comunicado de imprensa do Ministério das Finanças refere que a implementação do Novo Regime Tarifário da Energia Eléctrica deveria vigorar desde o passado dia 24 de Junho, mas “por razões técnicas e operacionais das instituições responsáveis por assegurar este procedimento” a sua efectivação só acontece a partir da segunda quinzena deste mês.
De acordo com o Ministério das Finanças, esta actualização dos tarifários dos serviços de electricidade decorre de uma medida estrutural de gestão macroeconómica, que passa por garantir que os subsídios beneficiem efectivamente os segmentos mais vulneráveis da população, contrariamente ao que vinha sucedendo até aqui.
“Neste sentido, as novas tarifas introduzem mecanismos de protecção dos consumidores com menores rendimentos, para além de outras medidas de protecção social, que estão a ser adoptadas pelo executivo”, lê-se na nota que, com esta alusão, tenta tapar o Sol com uma peneira… sobretudo à noite.
Em Janeiro de 2018 foi noticiado que o Governo pretendia cortar em 25%, o equivalente a 275 milhões de euros, nos subsídios que atribui às empresas públicas para manutenção dos preços aos consumidores em serviços básicos como água, energia e transportes, que deveriam aumentar naquele ano.
Na segunda-feira, o representante residente do Fundo Monetário Internacional (FMI) em Angola, Max Alier, defendeu a eliminação dos subsídios à água e energia, argumentando que os mesmos apenas beneficiam as pessoas com rendimentos altos. Isto porque, presume-se, as pessoas de baixos rendimentos usam apenas água da chuva e energia produzida por lenha…
Max Alier, que falava ao Jornal de Angola, referiu que os subsídios aos serviços públicos e aos preços dos combustíveis “são ineficientes, levam ao consumo excessivo e beneficiam desproporcionalmente os ricos que os consomem mais”.
“Por estes motivos aconselhamos a sua eliminação. Ao mesmo tempo, sabemos que a parte do rendimento gasto com serviços públicos, combustíveis e transporte pelas famílias pobres é grande. Assim, em termos relativos, os pobres são mais afectados pelo aumento do preço do combustível”, adiantou.
O novo tarifário de energia para consumidores de categoria social – clientes com capacidade reduzida em termos de consumo – vai manter-se a 2,46 kwanzas (0,00633 euros) o quilowatt, enquanto que para os clientes com consumo abaixo de 200 quilowatts o valor passa de três kwanzas (0,00772 euros) para 6,41 kwanzas (0,01650 euros).
O reajuste foi feito igualmente na “categoria doméstica geral”, actualmente designada “categoria doméstica monofásica”, onde se encontram integrados a maioria dos consumidores de electricidade do país, passando dos 6,53 kwanzas (0,01681 euros) para 10,89 kwanzas (0,02803 euros), representando um aumento de 66%.
Já para os clientes de “categoria doméstica especial”, agora designados por “categoria doméstica trifásica” – grupo de maior capacidade e consumo – cujo preço cobrado integra a produção e transporte, passando dos 7,05 kwanzas (0,01814 euros) para 14,74 kwanzas (0,03793 euros).
Para a categoria indústria, o preço sai dos 7,05 kwanzas para os 12,83 kwanzas (0,03302 euros), enquanto que o comércio e serviços, que pagavam 14 kwanzas (0,03603 euros) passam agora a integrar a categoria doméstica trifásica.
Segundo o presidente do Conselho de Administração do Instituto Regulador dos Serviços de Electricidade e de Águas (IRSEA), Luís Mourão, citado pela Angop, o cliente final pagava em média 6,05 kwanzas (0,01557 euros) o quilowatts e agora vai pagar 12,82 kwanzas (0,03299 euros), um incremento em todas as categorias de 97%.
… e por falar em FMI
Em Dezembro de 2009, o então director-geral do FMI, Dominique Strauss-Kahn, fazia um aviso à navegação que, agora, ninguém leva em conta: “Os problemas acontecem quando os governos dizem à opinião pública que as coisas estão a melhorar enquanto as pessoas perdem os seus empregos”.
“Para alguém que vai perder o seu emprego, a crise não acabou. E isso constitui um alto risco”, afirmou o então director-geral do FMI, acrescentando que “isso também pode, em alguns países, tornar-se um risco para a democracia. Não é fácil administrar esta transição, e ela não será simples para os milhões de pessoas que ainda estarão desempregadas no próximo ano”.
“A economia mundial somente se restabelecerá quando o desemprego cair”, disse o então responsável do FMI. E se assim é, e é mesmo assim, os angolanos estão ainda mais lixados. Aliás continuam à espera dos primeiros empregos dos 500 mil que João Lourenço prometeu.
E, convenhamos, se for possível a João Lourenço garantir que os angolanos conseguem estar uns anos sem comer, Angola não tardará muito a ter o défice em ordem e a beneficiar do pleno emprego.
“A minha principal preocupação será com a Economia e como superarmos esta situação de crise que nos tem vindo a afectar. Vamos continuar a apoiar as empresas, tendo em vista a superação das dificuldades em tempo de crise”, dirá o nosso ministro das Finanças (provavelmente na qualidade de adjunto de alguém do FMI), Archer Mangueira.
O ministro das Finanças defenderá que Angola está numa situação “mais vantajosa” para reduzir o endividamento depois da crise, considerando que falta apenas melhorar a diversificação e a competitividade da economia.
“O aumento do endividamento é um problema que todos os países vão ter de enfrentar”, dirá Archer Mangueira (ou até mesmo João Lourenço), defendendo que “acabando a crise torna-se muito claro a necessidade de os países retomarem o mais rapidamente possível a estratégia de consolidação orçamental”.
Ou seja, afinal os angolanos não têm nada a temer. Se, por um lado, há muita gente que vive pior (o que parece, segundo o Governo do MPLA, uma boa consolação), por outro, quando a crise passar, uma só refeição já será uma dádiva divina para os que não tinham nenhuma.
Porém, “uma coisa é certa: o facto de termos estes níveis de dívida vai exigir uma política que reforce o potencial de crescimento da economia”. Isso implicará, como sabiamente vai explicar Archer Mangueira, uma política económica “que aumente a competitividade e reforce o sector exportador.
Antecipando, como lhe compete, os cenários, o Governo dirá que a reacção no pós-crise “coloca na agenda um conjunto de políticas de valorização dos recursos humanos, melhoria de infra-estruturas e mais ciência”.
Folha 8 com Lusa