Angola vai deixar de oferecer petróleo como garantia das linhas de crédito negociadas com outros estados, nomeadamente a China, Brasil e Israel, disse o presidente João Lourenço à agência noticiosa russa TASS. Hum! Aqui há gato angolano. E no caso da China, o rabo ficou de fora e está pintado a vermelho, azul e branco, com 13 listas e 50 estrelas…
“O volume [de aprovisionamento de petróleo] tem disso elevado nos últimos anos porque Angola negociou créditos com a China para a construção de estradas, pontes e outras infra-estruturas. O volume de petróleo que exportámos para a China foi igual ao nível da dívida com a China”, afirmou João Lourenço.
O presidente angolano assinalou que os anteriores acordos assinado com a China estão desactualizados e que Angola quer alterá-los.
Curiosamente esta questão de Angola querer alterar os acordos assinados com a China nada tem a ver com as notícias que diziam que actual governo angolano fora pressionado pelos EUA para encetar uma viragem estratégica, afastando-se da China e iniciado uma maior aproximação ao Ocidente.
“Isto não vai acontecer apenas com a China, mas também com os outros dois países com os quais temos meios de pagamento semelhantes, nomeadamente o Brasil e Israel. Queremos deixar de fazer este tipo de pagamentos quando recebemos linhas de crédito com o petróleo como colateral (garantia). Vamos deixar de usar o petróleo como principal garantia para as dívidas”, declarou à TASS.
Em Setembro do ano passado, a consultora Fitch Solutions alertou para os riscos do modelo de empréstimos pagos com petróleo, muito usado pela China no financiamento a África, nomeadamente a Angola.
“Enquanto os empréstimos pagos em petróleos reduzem os riscos de pagamento para os financiadores chineses, evitando confiarem na capacidade do governo angolano para cumprir as obrigações de pagar a dívida, salientamos que os altos níveis de endividamento em Angola, representando uns estimados 71,4% do Produto Interno Bruto em 2018, vão limitar a capacidade para apoiar projectos de infra-estruturas e restringir o crescimento da indústria da construção nos próximos anos”, escrevem os analistas da Fitch na altura.
Numa nota sobre a crescente dependência de Angola do financiamento chinês, que vai chegar a mais de 40% da dívida total no seguimento de um acordo de financiamento de 11 mil milhões de dólares para 78 projectos de infra-estruturas acordados em Setembro, em Pequim, a Fitch Solutions escreve que “os custos de servir a dívida vão aumentar e, com o declínio das receitas petrolíferas, o orçamento deverá manter-se em défice até 2027”.
A China é o maior financiador estrangeiro de infra-estruturas em Angola, num total de 22,4 mil milhões de dólares, segundo a base de dados da Fitch, e o financiamento chinês foi fundamental para o progresso de grandes projectos de infra-estruturas, incluindo os 6,4 mil milhões de dólares para o megalómano novo Aeroporto de Luanda, os 4,5 mil milhões para o projecto da central hidroeléctrica de Caculo Cabaça e a reconstrução dos caminhos-de-ferro de Benguela, orçados em 1,8 mil milhões de dólares
Sensatez sem dinheiro não existe
A consultora Economist Intelligence Unit (EIU) alertou em Setembro de 2018 para a necessidade de Angola “endividar-se de forma sensata” sob perigo de entrar em situação de incumprimento financeiro. Sob o título “Economia cresce, não cresce, talvez cresça!”, e a propósito das previsões da consultora Fitch Solutions, o Folha 8 escreveu, no dia 20 desse mês, que existem cálculos para todos os gostos.
Agora a EIU não se limitou a rever as previsões de crescimento, e “atreveu-se” a aconselhar os peritos dos peritos que integram o Governo de João Lourenço para a necessidade de Angola “endividar-se de forma sensata” sob perigo de entrar em situação de incumprimento financeiro, ou “default”, devido ao alto nível de endividamento.
“O pagamento da dívida já é a maior rubrica de despesa em Angola e o país tem de equilibrar a sua necessidade de investimento com o endividamento sensato, se quiser evitar uma situação de default”, escreveram os peritos da unidade de análise económica da revista britânica The Economist.
Segundo uma nota enviada aos investidores sobre a relação entre a China e Angola, os analistas advertiram sobre o novo pacote de financiamento de 11 mil milhões de dólares, acordado entre as autoridades dos dois países no Fórum de Cooperação China-África (FOCAC), que decorreu no princípio de Setembro passado em Pequim, e no qual o Presidente João Lourenço participou.
“O novo pacote de crédito da China é significativo; no entanto, apesar de ajudar a desbloquear financiamento para pagar os tão necessários investimentos, também vai aumentar o fardo da dívida nacional”, vinca a EIU, notando que o acordo é alcançado numa altura em que Angola já garantira 4,5 mil milhões de dólares do Fundo Monetário Internacional (FMI).
Em Dezembro de 2017, segundo os números oficiais citados pela unidade de análise económica da Economist, Angola devia à China mais de 21 mil milhões de dólares, “dos quais 5,2 mil milhões de dólares para o Banco de Importações e Exportações da China, e o restante a bancos públicos”.
Este método, notava a EIU, “tem atraído críticas dentro e fora de Angola, principalmente em relação à importação de materiais e mão-de-obra chineses, que faz pouco pela criação de empregos locais e pelo desenvolvimento do sector nacional da indústria”.
O mesmo acontece, concluem os analistas, com os termos dos pagamentos dos empréstimos, “que levantam preocupações sobre se os empréstimos são realmente benéficos para Angola”.
Fiado made in China
O Presidente João Lourenço agradeceu, em Pequim, ao homólogo chinês, Xi Jinping, a ajuda ao processo de reconstrução nacional em Angola, país devastado por um tsunami de incompetência governativa, ladroagem e corrupção (entre muitos outros crimes) com a chancela do MPLA.
João Lourenço reafirma que Angola encontrou na China um parceiro que está a ajudar a construir o país e que foi o país asiático “quem estendeu a mão na fase de reconstrução nacional”.
É claro que, sobretudo numa altura em que se está de mãos estendidas, não é tempo de João Lourenço pensar na factura e nos custos dessa ajuda, grande parte dela dispensável se o partido que governa Angola desde 1975 não fosse corrupto e em vez de trabalhar para os poucos que têm milhões fizesse alguma coisa útil para os milhões que têm pouco ou… nada.
Em relação ao continente em geral, João Lourenço reconheceu que a China tem desempenhado um papel importante no processo de desenvolvimento de África, processo que “requer uma certa atenção”.
Recorde-se que o Presidente chinês anunciou no Fórum de Cooperação China-África, em Pequim, 60 mil milhões de dólares (51 mil milhões de euros) em assistência e empréstimos para países africanos.
“As nossas parcerias no passado não deram certo e, em poucas décadas, a China estendeu-nos a mão e os resultados são visíveis em praticamente todo o continente”, reconheceu submisso e bajulador João Lourenço, bem ao estilo do comportamento do partido do qual é Presidente, e que é sempre muito forte com os fracos e fraquinho com os fortes.
Agora parece que, estimulado por Donald Trump e com guarda-costas do FBI, vai tentar mandar a China ir cobrar a dívida quando o oceano atlântico chegar ao Huambo.
A força da neocolonização
Definitivamente um dos donos (China) do dono de Angola (MPLA) não deixa os seus créditos por países alheios. O que terá levado, nesta altura do “campeonato”, o embaixador da China em Luanda, Cui Aimin, a dizer no dia 23 de Agosto de 2018 que a dívida de Angola para com o seu país “é controlável, sustentável e não é muito má”, considerando ser um assunto bilateral, sem, no entanto, avançar o montante?
De acordo com Cui Aimin, a dívida era uma situação normal de países em desenvolvimento que necessitam de sustentar os seus projectos, afirmando ser uma dívida “controlável e sustentável” para ambos os países. É claro que Luanda, talvez mais do que Pequim, agradece a explicação que certamente o Governo de João Lourenço fez chegar ao Fundo Monetário Internacional (FMI).
“Para o devedor, é necessário tomar decisões conforme as próprias necessidades e capacidades. Para o credor, é também necessário levar em consideração a sua capacidade de financiamento. É um assunto bilateral, daí que a sua resolução deve merecer um tratamento entre as partes”, disse Cui Aimin, certamente agastado com esse fantasma do FMI.
Ainda assim, o embaixador chinês em Angola considerou que a situação da dívida de Angola para com o seu país “é controlável”. Ou seja, pormenorizou, “a situação não é muito má”.
Cui Aimin destacou as reformas económicas (que, na verdade, ainda são um mero enunciado de boas intenções) em curso em Angola como “medidas positivas” para “evitar os riscos da dívida” e que dão igualmente um “outro vigor ao desenvolvimento económico” do país.
Em relação à cooperação bilateral, o embaixador da China em Angola fez saber que ambas as partes estão a negociar alguns acordos, nomeadamente no domínio da “protecção de investimentos, evitação de dupla tributação e a troca de moedas”.
Acordos que, segundo o diplomata, estão “sem qualquer consenso” até ao momento, mas cuja efectivação, sustentou, deve “solidificar ainda mais as relações entre Angola e China”, bem como “atrair o investimento chinês e de outras partes do mundo” para Angola.
“Acho que, com a eventual assinatura [dos acordos], isso vai representar a solidificação das boas relações entre os dois países, mas também é um grande e importante factor para atrair os investidores chineses e estrangeiros”, afirmou.
“São garantias institucionais e jurídicas para os investimentos estrangeiros em Angola”, indicou.
O FMI e a China
O FMI encorajou a China a acelerar as reformas estruturais e a prestar atenção ao “crescimento insustentável” do crédito, para manter o crescimento económico ao mesmo tempo que reduz a dívida.
O FMI apontou “o contraste” entre os objectivos declarados por Pequim, como a estabilização do endividamento, o papel decisivo reconhecido ao mercado, maiores aberturas, e o aumento “sempre insustentável” do crédito, o intervencionismo invasivo do Estado ou ainda as restrições às trocas e ao investimento.
Se estas tensões não forem resolvidas podem ameaçar os objectivos de crescimento e encorajar uma “política de recuperação impulsionada pelo crédito”, como depois da crise financeira de 2008, alertou o FMI.
Esta reviravolta pode “intensificar as vulnerabilidades chinesas” e levar a “um brutal reajustamento” da segunda economia mundial, sublinhou. O alerta do FMI surgiu quando Pequim prometeu “uma política fiscal mais activa” para estimular a economia, com deduções fiscais e emissões de títulos para financiar projectos de infra-estruturas.
“Uma política baseada na direcção do Estado e no crédito servirá apenas para manter uma má distribuição de recursos e intensificar os riscos”, sublinhou o FMI.
Apesar do crescimento, impulsionado pelas exportações e gastos públicos, a dívida total da China continua a subir, advertiu o FMI, segundo o qual a dívida é superior a 260% do PIB, excluindo o sector financeiro. A situação levou Pequim a cortar as despesas das colectividades locais e a reforçar as advertências sobre produtos de investimentos “opacos”.
Confrontada com um abrandamento económico e tendo como pano de fundo um agravamento das condições de crédito e a escalada das tensões comerciais com os Estados Unidos da América, a China poderá registar uma taxa de crescimento de 6,4% em 2019, num claro abrandamento em relação a 2017 (+6,9%).
O FMI lamentou que os “objectivos quantitativos de crescimento” fixados por Pequim possam levar à adopção de uma “política de recuperação incompatível com as necessidades de desenvolvimento a longo prazo” e pediu às autoridades chinesas que intensifiquem as reformas estruturais e “reduzam a presença do sector estatal em alguns domínios”.
Folha 8 com Lusa