João Lourenço está satisfeito. A sua estratégica de “compra” de políticos portugueses resultou em pleno. Teve, aliás, mais sucesso do que a encetada pelo seu patrono (José Eduardo dos Santos). O único resistente português, Bloco de Esquerda” está prestes a assinar a rendição.
Por Orlando Castro
Provavelmente Catarina Martins, líder do BE, vai justificar-se dizendo que agora já não faz sentido dizer que o seu partido “é solidário” com aqueles que querem “uma democracia em Angola” e defendem para aquele país “uma separação do poder político e do judicial”.
“Portugal é uma democracia, um Estado de Direito, em que há separação entre o poder judicial e o poder político. Se em Angola isto não é claro, é um problema sobretudo para o povo angolano”, disse em tempos Catarina Martins.
Catarina Martins estatelou-se ao ir na tentação de como outros, por exemplo Augusto Santos Silva – ministro dos Negócios Estrangeiros, fazer de nós matumbos. O facto de a deputada Maria Manuel Rola, do BE, fazer parte do séquito de servis sipaios portugueses que em breve estará cá, nada significa, dirá Catarina Martins.
Vejamos. A propósito da separação de poderes, dizer que “se em Angola isto não é claro” é dar cobertura, mesmo que ingénua, ao regime. Como sabe, em Angola a questão da separação de poderes não é claro ou escuro. Simplesmente não existe. Ponto. Não existia com José Eduardo dos Santos, não existe com João Lourenço.
Também dizer que esta questão “é um problema sobretudo para o povo angolano” é fugir, descaradamente, com o rabo à seringa. Se não fosse a conivência e a bajulação da comunidade internacional, com Portugal à cabeça, nada disto aconteceria em Angola. Portanto, ou há moralidade ou comem todos. Certo?
“Nenhum interesse de negócios pode levar a que Portugal ceda na prossecução da justiça e na independência do poder judicial em relação ao político”, disse a líder do Bloco de Esquerda. Deveria ser assim mas, como também bem sabe Catarina Martins, Portugal continua a ser a “offshore” do regime do MPLA desde 1975, tenha ela como líder José Eduardo dos Santos ou o seu ex-vice-presidente no MPLA e seu ex-ministro da Defesa, João Lourenço. Aliás a “coisa” é um autêntico bordel onde os políticos do seu país (PCP, PS, PSD e CDS e, dentro de momentos, o BE) se juntam aos de Angola numa monumental orgia de corrupção.
Recordemos que no dia 20 de Agosto de 2016, Catarina Martins disse que o seu partido não se fez representar no congresso do MPLA, em Luanda, porque “não pactua com ditaduras” nem com regimes que prendem pessoas “por delitos de opinião”.
“O Bloco de Esquerda não pactua com ditaduras e é muito triste que quase todos os partidos portugueses tenham ido prestar vassalagem ao MPLA”, disse Catarina Martins, referindo que respeitar Angola “é também defender a democracia e pluralidade de opinião em Angola e não ter uma relação subserviente com o MPLA, que é o partido do Governo, que é uma ditadura”.
Já antes, no dia 30 de Março de 2016, o Bloco de Esquerda, um dos partidos que apoia o actual governo socialista de Portugal, instou o primeiro-ministro, António Costa, a falar pela “libertação” dos “presos políticos” em Angola.
“Estes activistas são presos políticos. Estamos num debate no Parlamento português, casa da liberdade e da democracia. Este é o lugar para o primeiro-ministro deixar uma palavra clara pela libertação dos presos políticos de Angola”, sublinhou a líder do BE dirigindo-se a António Costa.
Importa, neste contexto, repetir (e repetimos sempre que necessário pois, ao contrários do que pensam os sucessivos governos portugueses e o dono de Angola, a verdade não prescreve) que os partidos portugueses rejeitam qualquer tipo de condenação sobre a “repressão em Angola”. Veja-se, por ser o exemplo mais recente, o caso dos jovens activistas detidos em Cabinda. Algum partido falou, fala ou falará da questão? Não. Todos têm de pedir autorização ao MPLA, inclusivamente – ao que parece – o próprio Bloco de Esquerda.
Como se tornou regra em Angola, também no prostíbulo político português, a palhaçada tomou conta dos areópagos lusitanos, isto sem culpa dos palhaços propriamente ditos. Não admira, por isso, que os principais dirigentes do MPLA já tenham festejado o que chamam de “domesticação” do Bloco de Esquerda.
E assim será o pleno. O PCP (irmão gémeo do MPLA) continua a dizer que ninguém pode contar com os comunistas “para operações de desestabilização de Angola”. E quem diz em Angola diz, por exemplo, na Coreia do Norte.
“Reiterando a defesa e a garantia das liberdades e direitos dos cidadãos, cabe às autoridades judiciais angolanas o tratamento de processos que recaiam no seu âmbito, de acordo com a ordem jurídico-constitucional, não devendo a Assembleia da República interferir sobre o desenrolar dos mesmos, prejudicando as relações de amizade e cooperação entre o povo português e o povo angolano”, lê-se numa declaração de voto apresentada em tempos pela bancada ortodoxa, marxista, leninista, acéfala e canina do PCP.
Para além de pôr de joelhos e de mão estendida políticos como José Sócrates, Passos Coelho, Paulo Portas, Jerónimo de Sousa e Cavaco Silva, o MPLA (num trabalho iniciado por José Eduardo dos Santos e concluído por João Lourenço) juntou ao seu séquito o primeiro-ministro António Costa, o Presidente da República Marcelo de Rebelo de Sousa, o líder do PSD (Rui Rio), do CDS (Assunção Cristas). Por fim, qual cereja no topo do bolo, chegou a vez de Catarina Martins (BE).
O processo português de bajulação do dono de Angola começou, de facto, há muito tempo. Recorde-se, por exemplo, que o então presidente da Assembleia da República de Portugal, Jaime Gama, elogiou no dia 17 de Dezembro de 2007, em Luanda, a política externa angolana e deu os “parabéns” ao país pela “ambição” de um papel cada vez maior no continente africano e no Atlântico Sul.
“Um país com estas capacidades, aliando o seu potencial económico à sua diplomacia criativa e à capacidade militar, tem que ter uma ambição regional. Parabéns Angola por ter uma ambição regional!”, felicitou o socialista Jaime Gama num discurso aplaudido e que, mais coisa menos coisa, poderia ter sido feito por um qualquer deputado da maioria, ou seja do MPLA.
E disse, com nova revoada de aplausos das bancadas do Parlamento, que Angola “olha de igual para igual” para os principais protagonistas do Atlântico Sul, como o Brasil, Argentina ou África do Sul: “Parabéns Angola por olhar para o Atlântico Sul.”
O discurso apologético de Jaime Gama poderia, igualmente, ter sido feito por qualquer um dos actuais palhaços que estão na ribalta dos areópagos políticos, partidários e parlamentares de Portugal.
Sem tirar nem por. Por isso mesmo de uma assentada desertaram uma vintena de ilustres militantes do BE. Portugal está se marimbando para os matumbos angolanos que têm a lata de se queixar de ter o estômago a dar horas.