O secretário de Estado da Economia de Angola disse hoje que o acesso ao crédito e a qualidade dos projectos são os maiores entraves que os empresários nacionais enfrentam, prevendo a fusão de institutos públicos para apoiar este processo. Por alguma razão o antigo primeiro-ministro, Lopo do Nascimento, lamenta a perda de oportunidade de Angola ter desenvolvido a sua agricultura e indústria quando o país vivia tempos favoráveis, com o preço alto do petróleo.
“Nós temos vários constrangimentos no que diz respeito ao acesso à economia, mas eu creio que não é a falta de disponibilidade o principal. É um problema de facto, mas o principal problema quando se fala com os bancos, que concedem os créditos, é um problema da qualidade dos projectos e investimentos”, disse Sérgio Santos, à margem da abertura do I Congresso da Produção Nacional, organizado pela Confederação Empresarial de Angola.
O governante angolano, que procedeu à abertura do encontro, disse que o problema não é tanto dos projectos, mas sim “da qualidade do próprio empresário em si” e do “conhecimento para colocar no papel as suas ideias e depois também poder sustentar as mesmas”.
De acordo com Sérgio Santos, para esta dificuldade, o Governo está a estudar a possibilidade de fundir os Institutos Nacional de Apoio às Micro, Pequenas e Médias Empresas e o de Fomento Empresarial, que trabalham na formação dos empresários.
“Provavelmente vamos criar um único instituto, não só para aproveitar consolidar os recursos financeiros, optimizar essa despesa, mas também para focar mais no trabalho com as associações, no sentido de formar os empresários. Esse é um grande problema a formação do homem, do empresário”, reforçou.
Sérgio Santos indicou ainda como constrangimentos ao sucesso dos empresários angolanos o problema das garantias no acesso ao crédito bancário e nos encargos com os juros.
“Para estas três questões – conhecimento, garantias e encargos financeiros do custo dos juros – o executivo tem programas que estão orientados para esse sentido”, explicou o secretário de Estado para a Economia.
Segundo Sérgio Santos, no sentido de reduzir os custos com os juros, bem como de trazer a garantia, o executivo, no Programa Angola Investe, tem o fundo de garantia de crédito, que permite aos empresários o acesso a uma garantia de até 70% do capital que venham a contrair como investimento, além da bonificação de juros.
“Vamos reforçar estes instrumentos. O Programa Angola Investe está a ser agora analisado e a ver-se a forma de ser reforçado. Todas essas decisões quer dos institutos para apoio á formação quer do programa Angola Investe são decisões que vão ser tomadas ainda no mês de Julho”, disse.
O Programa Angola Investe concedido pelo Estado angolano para o apoio e financiamento de projectos de investimento às micro, pequenas e médias empresas, é operado por bancos comerciais nacionais e coordenado pelo Ministério da Economia e Planeamento, em parceria com o Fundo de Garantia de Crédito.
E assim fala Lopo do Nascimento
O antigo primeiro-ministro Lopo do Nascimento lamentou hoje a perda de oportunidade de Angola ter desenvolvido a sua agricultura e indústria quando o país vivia tempos favoráveis, com o preço alto do petróleo.
Primeiro-ministro de Angola entre 11 de Novembro de 1975 (data da proclamação da independência) e Dezembro de 1978, Lopo do Nascimento foi hoje conferencista principal no I Congresso da Produção Nacional, organizado pela Confederação Empresarial de Angola, em Luanda.
Lopo do Nascimento, também antigo secretário-geral do MPLA, partido no poder desde a independência, recordou o lema lançado na época pelo primeiro Presidente da República, António Agostinho Neto, que “a agricultura é a base do desenvolvimento e a indústria o factor decisivo”.
Sobre esse lema, Lopo do Nascimento usou o trocadilho “o contrato é a base e a comissão o factor decisivo” para criticar “o abandono do lema, com o argumento da guerra”, na altura em que foi chefe de Estado José Eduardo dos Santos (38 anos, recorde-se), que substituiu António Agostinho Neto pelo seu falecimento.
“Mas, depois de alcançada a paz, não soubemos aproveitar a conjuntura favorável, proporcionada pelo aumento da produção do petróleo e o do seu preço, para o desenvolvimento do binómio agricultura/indústria, na perspectiva de Agostinho Neto. Substituiu-se o lema por um novo lema: o contrato é a base a comissão o factor decisivo”.
Segundo Lopo do Nascimento, Angola possui “enormes extensões de terras ociosas que não têm qualquer utilidade, porque os seus utentes não investem e não criam empregos para as populações da zona”.
“Temos no interior do país uma situação um pouco incompreensível. A agricultura não se desenvolve, porque não há comércio e o comércio não atrai ninguém, porque não há produção agrícola, fica toda a gente à espera de um projecto do Estado, que permite acesso a créditos – que não se pagam como aconteceu com o BPC [Banco de Poupança e Crédito] – de divisas que geralmente se utilizam para outros fins”, referiu.
Recordou que em Angola, mais de 60% da área cultivada é feita com o uso predominante da enxada, situação que considerou “um enorme desafio e uma oportunidade extraordinária para se investir no aumento da produtividade, através da mecanização gradual, tractores e outros equipamentos agrícolas ligados à produção”.
Actualmente a exercer o cargo honorífico de administrador não executivo da petrolífera estatal Sonangol, Lopo do Nascimento lembrou que o país continua a ser caracterizado por um deficiente ambiente de negócios e pela falta de incentivo das políticas governamentais para o crescimento dos empresários.
“E um exemplo disso foi o modo como foi concebido, gerido e implementado o programa de um milhão de casas [compromisso eleitoral do MPLA nas eleições legislativas de 2008], em que perdemos a oportunidade para desenvolver a indústria dos materiais de construção e as empresas de construção”, criticou Lopo do Nascimento.
Lopo do Nascimento manifestou-se contra a construção de uma Angola com base em realidades diferentes à identidade do país, pelo que sempre coloca dúvidas “em relação a projectos em que a componente interna se resume à terra, à água ou à força de trabalho não qualificada”.
O dirigente angolano apelou aos empresários para que se preparem para os novos desafios da cooperação económica regional, lembrando que “os tempos das divisas fáceis já lá vão e não voltarão”, havendo necessidade de se inverter a situação que se vive actualmente.
A Lopo do Nascimento só faltou aconselhar a que se face um “reset” ao país, mas sobretudo ao MPLA, o único partido que pode, e deve, ser responsabilizado pelo desastre em que estamos.
Folha 8 com Lusa