Já se notam os efeitos das reuniões de trabalho dirigidas, em Moçambique, pelo ministro das Relações Exteriores de Angola, Georges Chikoti. Ou seja, a Frelimo acusa países ocidentais de “importar primaveras” para Moçambique. Só falta adoptar a estratégia que o MPLA implementou em relação a Jonas Savimbi.
O secretário-geral da Associação dos Combatentes da Luta de Libertação Nacional (ACLLN), órgão da Frelimo, partido no poder em Moçambique desde a independência, criticou os doadores internacionais pela suspensão dos seus financiamentos e de quererem “importar primaveras” para o país.
“Hoje querem importar primaveras para Moçambique, a coberto da dívida pública do país, mas é bom que se lembrem que essa reacção não passará”, afirmou Fernando Faustino, citado hoje no jornal Notícias, a propósito do anúncio da suspensão dos financiamentos dos parceiros internacionais, após a revelação de avultadas dívidas ocultadas nas contas públicas.
O dirigente da ACLLN, órgão presidido por inerência pelo líder da Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo), Filipe Nyusi, e igualmente Presidente da República, acusa certos países ocidentais e alguns parceiros internacionais de procurarem desestabilizar o país para forçar uma mudança de regime e deu o exemplo de casos anteriores como o Iraque, Ucrânia e as “primaveras árabes” no Egipto ou Líbia.
“Que país neste mundo não tem dívidas?”, questionou Fernando Faustino, para quem alguns daqueles países doadores não têm autoridade moral, na medida em que estão altamente endividados e contribuíram para a destruição de outras nações em desenvolvimento.
“A Europa deve, a América deve, a Ásia deve, e por que razão a África deve ser chantageada por estar a dever?”, voltou a questionar o secretário-geral da ACLLN, criticando ainda os parceiros internacionais pelo seu “silêncio sepulcral” face aos ataques atribuídos pela Frelimo/Governo à Renamo, contra alvos civis e militares no centro do país.
Mais uma vez, de acordo com Fernando Faustino, “nota-se que a tendência destes países é a desestabilização e, através das suas primaveras, forçar a mudança de um governo legitimamente eleito”, apelando aos antigos combatentes para não se distraírem da sua agenda principal de paz e desenvolvimento e ao líder da Renamo, Afonso Dhlakama, para se desarmar e dialogar com Filipe Nyusi.
O Governo moçambicano reconheceu no final de Abril a existência de dívidas fora das contas públicas de 1,4 mil milhões de dólares, justificando-as com razões de segurança e infra-estruturas estratégicas do país.
A revelação de empréstimos com aval do Governo, contraídos entre 2013 e 2014, levou o Fundo Monetário Internacional (FMI) a suspender a segunda parcela de um empréstimo a Moçambique e a deslocação de uma missão a Maputo.
O grupo de 14 doadores do Orçamento do Estado também suspendeu os seus pagamentos, uma medida acompanhada pelos EUA, que anunciaram esta semana que vão rever o apoio bilateral ao país.
Na carta que formaliza a suspensão, o G14 justifica que a existência de “dívidas avultadas”, com garantias do Governo e sem aprovação na Assembleia da República, “configura uma violação dos Princípios Básicos de Parceria”, pelo que os doadores “entendem não estarem de momento reunidas as condições necessárias para o desembolso de fundos através do apoio geral ao orçamento”.
O Presidente moçambicano, Filipe Nyusi, estabeleceu na semana passada uma relação entre o caso das dívidas e a malária e disse que é preciso “desinfectar a casa” e retomar a confiança dos doadores.
Os parceiros, segundo Filipe Nyusi, olham para Moçambique como uma casa onde não se pode “meter crianças porque há mosquitos”, manifestando a sua convicção de que vão voltar.
“Se estamos a desinfectar a casa, a tirar os mosquitos e vivermos uma vida normal, acredito que nenhum doador nenhum país amigo vai estar para incriminar Moçambique e sacrificar os moçambicanos”, observou.
Com a revelação dos novos empréstimos, a dívida pública de Moçambique é agora de 11,66 mil milhões de dólares, dos quais 9,89 mil milhões de dólares são dívida externa.
Este valor representa mais de 70% do Produto Interno Bruto (PIB) e traduz uma escalada de endividamento desde 2012, quando se fixava em 42%.