O Acordo Ortográfico não foi “autorizado a nenhum nível governamental” em Angola, mas Marisa Guião de Mendonça, directora-executiva do Instituto Internacional da Língua Portuguesa (IILP), assinala que o país “está muito cooperante na criação do Vocabulário Ortográfico Comum”.
E m entrevista à agência Lusa, Marisa Mendonça afirmou que “o Acordo não foi ainda autorizado a nenhum nível governamental pelo Estado angolano”, o que se deverá ao facto de “Angola estar a pedir uma rectificação do Acordo”, ou seja, a inclusão de alterações.
Para Angola, “o Acordo tem lacunas e é necessário rectificá-las antes da implementação”, sendo que as mesmas estão relacionadas com a incorporação, no vocabulário, “daquilo que são empréstimos das línguas nacionais”, isto é, termos que fazem parte de outras línguas faladas no território.
Segundo a responsável do IILP, “as autoridades angolanas e a própria Comissão Nacional de Angola no IILP” – que tem representações nacionais de todos os estados-membros da CPLP – estão “a fazer o trabalho a nível nacional, no seu próprio contexto, para ver como poderão orientar da melhor forma o processo e chegar a um bom porto”.
Independentemente da não aprovação do Acordo pelo governo, Marisa Mendonça sublinhou que “Angola está muito cooperante na criação do Vocabulário Ortográfico Comum”, uma agregação de todos os vocabulários nacionais dos países aderentes ao Acordo.
“Angola foi, aliás, o país que mais apoiou financeiramente a criação da plataforma digital do vocabulário, pelo que o país não está distanciado do Acordo Ortográfico, está apenas num estágio diferente”, afiançou a directora-executiva do IILP.
A 7 de Setembro de 2015, a ministra angolana da Cultura, Rosa Cruz e Silva, disse que Angola tinha todo o interesse em ratificar o acordo, mas não prescindia de uma abertura para as especificidades que caracterizam o português falado naquele país africano.
Num congresso sobre a língua portuguesa, realizado em Luanda na Primavera passada, a ministra disse querer ver colocadas “ao mesmo nível” as línguas nacionais e a língua oficial, tendo em conta que a “diversidade linguística do país constitui a sua grande riqueza”.
O Português é a língua oficial em Angola, mas o país conta com seis línguas africanas reconhecidas como nacionais, algumas das quais acabaram por incorporar palavras e conceitos portugueses, como consequência da longa presença colonial lusa no território.
CPLP é um elefante branco
Não sendo a língua portuguesa essencial para fazer parte da Comunidade de Países de Língua… Portuguesa (veja-se o caso da Guiné Equatorial), custa a perceber a importância que a CPLP dá ao Acordo Ortográfico que, presume-se, seja relativo à língua… portuguesa.
Ingenuamente penamos que, por exemplo, uma das razões para a não entrada efectiva, entre outros países, da Guiné-Equatorial na Comunidade de Países de Língua… Portuguesa seria o facto de esse país, embora rico em petróleo, não falar… português. Ledo engano.
Reconhecemos, contudo, que é um fraco argumento. Desde logo porque sendo a Guiné-Bissau um membro de pleno e total direito da CPLP, o seu ex, futuro, chefe da Armada, contra-almirante Bubo Na Tchuto, bem como o seu ex-vice e depois chefe do Estado Maior das Forças Armadas, o general António Indjai, nem uma palavrinha sabem dizer, com ou sem Acordo Ortográfico, em… português.
É, portanto, fácil concluir que a língua portuguesa (com ou sem Acordo Ortográfico) não representa qualquer condição para se ser membro da CPLP. Devemos, contudo, acrescentar que tanto Bubo Na Tchuto como António Indjai, entre muitos outros, falam uma outra língua internacionalmente, mas sobretudo em África, bem conhecida: o Kalashnikovês.
Pois é. Em vez de se potenciar a língua (com ou sem Acordo Ortográfico) como o principal elo de ligação, como factor decisivo de todas as outras vertentes da sociedade globalizada, a CPLP (enquanto manta de retalhos) pensa que essa é uma vitória eterna. E não é. Nunca foi.
Nas comunidades de origem portuguesa, as novas gerações pouco ou nada falam português. Nos PALOP (Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa) assiste-se ao legítimo proliferar dos dialectos ou línguas locais e ao galopante êxito do inglês. O Português, com ou sem Acordo Ortográfico, tenderá (se nada for feito, se tudo continuar na mesma) a ser apenas uma língua residual.
Ao contrário do que fazem franceses e ingleses, os portugueses têm por hábito deixar para amanhã o que deveriam ter feito ontem.
Não existe, na língua como noutros sectores, uma conjugação estratégica de objectivos. Cada um rema para o seu lado e, é claro, assim o barco comum (a Lusofonia) não chega a nenhum porto. Há projectos sobrepostos, e muitas áreas onde ninguém chega. Ninguém não é verdade. Chegam os ingleses, os franceses, os norte-americanos, os chineses, os cubanos.
A CPLP deveria ser, com ou sem Acordo Ortográfico, o organismo que, por excelência, poderia divulgar a língua. Está, contudo, adormecida. Quando acordar verá que a Lusofonia – como parece ser o seu objectivo não assumido – já morreu…
A China, por exemplo, está a preparar muitos dos seus melhores quadros para que dominem, com ou sem Acordo Ortográfico, a língua portuguesa. Fazem-no para conquistar os mercados lusófonos. Nada mais do que isso.
De uma forma geral, todos (mais uns do que outros, importa dizê-lo) continuam à espera que o burro aprenda a viver sem comer. Mas, quando olharem para o lado, vão ver que quando o burro estava quase a saber viver sem comer… morreu.
A Lusofonia, essa realidade que – com ou sem Acordo Ortográfico – em muito ultrapassa os 250 milhões de cidadãos em todos os cantos do planeta, parece condenada a ser ultrapassada, ou até mesmo aniquilada.
Quando será que, de forma consciente e consistente, a CPLP unirá forças, com ou sem Acordo Ortográfico, para entregar a carta a Garcia, indiferente aos que dizem para a deitar na valeta mais próxima?
Para nós, para alguns de nós, a Lusofonia (com ou sem Acordo Ortográfico) deveria ser um desígnio colectivo. Defender esta tese é, provavelmente, pregar para os peixes. Mas vale a pena continuar a lutar. Lutar sempre, apesar da indiferença de (quase) todos os que podiam, e deviam, ajudar a Lusofonia.
Até agora continuam a ser mais os exemplos dos que, com ou sem Acordo Ortográfico, em vez de privilegiarem a competência preferem a subserviência. Que em vez do português preferem o inglês ou até mesmo o Kalashnikovês.