O Governo angolano (diz que) pretende alterar o regime de declaração de bens de titulares de cargos públicos, actualmente apresentado em envelope fechado e lacrado, perspectivando “uma reflexão profunda” para prevenção e repressão da corrupção, segundo um decreto presidencial. Será que o Presidente da República dará o exemplo? Ou será o Presidente do MPLA, ou o Titular do Poder Executivo, ou o Comandante-em-Chefe das Forças Armadas?
Segundo a Estratégia Nacional de Prevenção e Repressão da Corrupção (ENAPREC) 2024-2027, já aprovada em decreto presidencial de 19 de Julho, as autoridades devem promover uma “reflexão profunda sobre o regime de declaração de bens com vista à sua eventual alteração”.
Diga-se, apenas por mera pedagogia informativa, que o MPLA está no Poder há 49 anos, tem como elemento principal do seu ADN (composto orgânico cujas moléculas contêm a respectiva informação genética) a corrupção e é, a nível mundial, o partido com mais corruptos por metro quadrado.
A medida consta das acções previstas no capítulo da (suposta) prevenção, no quadro da implementação da ENAPREC, que prevê, também, a promoção, na academia e nas instituições especializadas, de estudos periódicos sobre os níveis de percepção da corrupção no país, visando identificar as áreas mais propensas.
A lei angolana (do MPLA) da probidade, aprovada em 2010, estabelece que os titulares de cargos políticos providos por eleição ou nomeação, magistrados judiciais e do Ministério Público, sem excepção, e gestores e responsáveis da administração central e local do Estado estão sujeitos a declaração de bens.
Esta declaração é apresentada em envelope fechado e lacrado, até 30 dias depois da tomada de posse do gestor e/ou dirigente, à Procuradoria-Geral da República, um regime de declaração que, no entender de alguns magistrados, deveria ser aberto ou semiaberto para a sua verificação periódica.
Entre as acções previstas, no quadro da (suposta) prevenção da corrupção, a ENAPREC sugere a definição de requisitos mínimos de nível técnico, ético e deontológico no provimento de funcionários públicos e de agentes administrativos, bem como na nomeação para o exercício de cargos políticos – partidários – de direcção e chefia.
Perspectiva também promover a extensão a todos os funcionários públicos, por altura da tomada de posse, do juramento sobre prevenção e repressão da corrupção e do nepotismo. Podem, contudo, fazer figas para afastar perigos ou acontecimentos nefastos como a transparência e o escrutínio público…
“A prevenção reveste-se de capital importância na redução dos índices de corrupção, potenciando um conjunto de vantagens sociais incomensuráveis, susceptíveis de desenvolver na sociedade princípios assentes na moralidade, probidade e no respeito pelo bem comum”, lê-se no documento.
Subdividida em cinco capítulos, nomeadamente objectivos gerais e princípios estruturantes, prevenção, detecção, repressão e gestão, monitorização e avaliação, a ENAPREC constitui uma abordagem holística (visão integral e um entendimento geral dos fenómenos). sobre o fenómeno da corrupção no país, suas causas e consequências.
Foi desenvolvida mediante a percepção de que a corrupção afecta vários sectores da vida nacional, sendo, por isso, “crucial” o envolvimento de todos na implementação de políticas e acções anticorrupção.
A ENAPREC visa instituir reformas anticorrupção e promover uma cultura de ética em todos os sectores, “com maior enfoque para aqueles que apresentem riscos elevados da prática de actos de corrupção”.
Anteriormente o Governo garantiu a implementação de medidas legais e administrativas que asseguram o cumprimento efectivo da Convenção das Nações Unidas Contra a Corrupção e a melhoria dos indicadores de desenvolvimento que impactam directamente no bem-estar dos angolanos. Quem quiser que acredite…
Segundo uma nota de imprensa, a informação foi apresentada, em Viena, Áustria, pelo secretário do Presidente da República para os Assuntos Judiciais e Jurídicos, Edilson Agostinho, que participou na 15ª Sessão do Grupo de Revisão de Implementação da Convenção das Nações Unidas Contra a Corrupção.
João Lourenço conhecia a Lei da Probidade?
A Lei da Probidade Pública constitui, segundo seu articulado e os devaneios propagandísticos do regime, mais um passo para a boa governação, tendo em conta o reforço dos mecanismos de combate à cultura da corrupção.
Recorde-se que a Assembleia Nacional aprovou no dia 5 de Março de 2010, com o devido e apologético destaque propagandístico da imprensa do regime e não só, por unanimidade, a Lei da Probidade Administrativa, que visa (de acordo com a versão oficial) moralizar a actuação dos agentes públicos angolanos.
Disseram na altura, e continuam a dizer agora, que o objectivo da lei é conferir à gestão pública uma maior transparência, respeito dos valores da democracia, da moralidade e dos valores éticos, universalmente aceites.
O então presidente da República, do MPLA (partido no poder desde 1975) e chefe do Executivo angolano (para além de outros cargos), José Eduardo dos Santos, quando deu posse ao então novo Governo, entretanto várias vezes remodelado, reafirmou a sua aposta na “tolerância zero” aos actos ilícitos na administração pública.
Apesar da unanimidade do Parlamento, e passado todo este tempo, o melhor é fazer, continuar a fazer, o que é aconselhável e prudente quando chegam notícias sobre a honorabilidade do regime, esperar (sentado) para ver se nos próximos dez ou 20 anos (o optimismo faz parte do nosso ADN) a “tolerância zero” sai do papel em relação aos donos dos aviários e não, como é habitual, no caso dos pilha-galinhas.
Essa lei “define os deveres e a responsabilidade e obrigações dos servidores públicos na sua actividade quotidiana de forma a assegurar-se a moralidade, a imparcialidade e a honestidade administrativa”. É bonito. Digam lá que não parece – em teoria – um Estado de Direito?
Mas alguém acredita? Mas alguém está interessado? Acreditarão nisso os 68% (68 em cada 100) dos angolanos que são gerados com fome, nascem com fome e morrem pouco depois com fome? Ou as 45% das crianças que sofrem de má nutrição crónica, sendo que uma em cada quatro (25%) morre antes de atingir os cinco anos?
Se calhar não acreditam. Têm, contudo, de estar caladinhos e nem pecar em pensamentos. Mas acreditava o MPLA, já na altura com a presença dirigente de João Lourenço. E isso bastava e basta. A Lei da Probidade Administrativa foi tão eficaz que Angola subiu meio lugar nos últimos lugares do “ranking” que analisa a corrupção.
O importante é que o MPLA recebe os encómios dos países acocorados perante o petróleo angolano, que preferem negociar com um regime corrupto do que, eventualmente, com um que tenha uma base democrática.
Se calhar, pensam baixinho os angolanos que usam a cabeça e não a barriga para analisar o nosso país, para haver probidade seria preciso que o poder judicial fosse independente e que o Presidente da República não fosse – como acontece à luz da Constituição – o “cabeça-de-lista” (ou seja o deputado colocado no primeiro lugar da lista), eleito pelo do circulo nacional nas eleições para a Assembleia Nacional.
Se calhar para haver probidade seria preciso que não fosse o Presidente a nomear o Vice-Presidente, todos os juízes do Tribunal Constitucional, todos os juízes do Supremo Tribunal, todos os juízes do Tribunal de Contas, o Procurador-Geral da Republica, o Chefe de Estado Maior das Forças Armadas e os Chefes do Estado-Maior dos diversos ramos destas.
Se calhar para haver probidade seria preciso que Angola fosse um Estado de Direito, coisa que manifestamente (ainda) não é.