Os poucos angolanos que têm milhões (quase todos roubados ao Povo) e os muitos que vivem atrelados à mama do Poder (do MPLA há exactamente 49 anos) comemoram hoje mais um aniversário do que chamam independência. Os milhões de angolanos que continuam a apender a viver sem comer, perguntam hoje: Quando é que chega a independência?
Por Orlando Castro
Faz hoje dez anos o Folha 8 publicou o texto: «Em dia de festa (dipanda) não se sente a barriga vazia». Recordemos esse texto:
«O Vice-Presidente de Angola, Manuel Vicente, enfatizou hoje a unidade nacional como garante da soberania, integridade e desenvolvimento do país, durante as comemorações do 39º aniversário da independência angolana, na província do Huambo.
Manuel Vicente, no acto de massas evocativo da proclamação da independência, afirmou que, “em 39 anos de existência como nação independente, já podemos extrair uma grande lição da nossa história: Nada se consegue sem trabalho, sacrifício, determinação e perseverança. E só conseguimos atingir os grandes objectivos nacionais se nos mantivermos unidos”.
A vila municipal de Cachiungo, antiga Bela Vista, a 64 quilómetros da cidade do Huambo, acolheu a sessão oficial das comemorações de 2014, com o lema “Unidos, reforcemos os ideais de liberdade e justiça social”.
No discurso proferido no estádio da localidade, o Vice-Presidente angolano sublinhou a importância da província do Huambo na “resistência secular contra o colonialismo” português e de uma luta que terminou em 1975.
“Sem o sacrifício, incluindo das próprias vidas, de milhares de angolanos, não teria sido possível alcançar a independência e manter a integridade territorial nacional, obter a paz e lutar pelo desenvolvimento económico, social e cultural do nosso país”, destacou Manuel Vicente.
Para o Vice-Presidente, que falava em representação do chefe de Estado angolano, José Eduardo dos Santos, os sacrifícios do povo “valeram a pena”, porque os angolanos estão a “construir uma nação unida, próspera, moderna, democrática e inclusiva”, onde “todos os seus filhos podem dispor dos mesmos direitos e oportunidades”.
Angola vive em paz desde 2002, com o fim do conflito armado que se seguiu à proclamação da independência do domínio colonial.
“As armas de guerra já se calaram, já não temos medo de emboscadas nas estradas”, enfatizou Manuel Vicente.
Recordando que a “unidade nacional, a integridade territorial e a preservação da soberania”, como acontece actualmente, constituem “as principais condições” para “consolidar a paz, promover o desenvolvimento e o bem-estar, erradicar a fome, a pobreza e a doença”, estas asseguram ainda a “justa repartição do rendimento nacional”, bem como a “construção de uma sociedade democrática, garantindo as liberdades e os direitos de todos os cidadãos”.
As comemorações deste ano ficam marcadas por acusações entre a UNITA e o MPLA, no poder desde 1975, nomeadamente face ao alegado aumento de casos intolerância política, como acusa o maior partido da oposição.
Numa alusão ao Orçamento Geral do Estado para 2015, que começa quinta-feira a ser discutido na Assembleia Nacional, o Vice-Presidente admitiu ainda, no mesmo discurso, que o “abaixamento do preço do petróleo” já não vai permitir “imprimir a velocidade que pretendíamos” em vários projectos de desenvolvimento.
Estas comemorações envolveram inaugurações de empreendimentos, nomeadamente a biblioteca provincial do Huambo, a fábrica de refrigerantes Blue, da Refriango, e a entrega de mais de uma centena casas sociais naquela província.
Um espectáculo músico-cultural finaliza as festividades do “11 de Novembro”, feriado nacional, dia da dipanda.
Angola tornou-se independente, depois de 500 anos de colonização, com a intervenção de três movimentos políticos armados, nomeadamente o MPLA, a UNITA e FNLA.
Duas independências foram proclamada faz hoje 39 anos. Uma, em Luanda, por António Agostinho Neto, líder do MPLA e o primeiro presidente de Angola, e outra no Huambo por Jonas Savimbi e Holden Roberto, líderes da UNITA e da FNLA, respectivamente.»
49 ANOS = MAIS DE 20 MILHÕES DE POBRES
O MPLA, partido que só está no poder desde a independência, saúda os angolanos (os 20 milhões de pobres não são angolanos) pelo 49.º aniversário da proclamação da independência (mais exactamente da troca dos colonos portugueses pelos colonos do MPLA) do país, apelando a que contribuam “com actos de cidadania e elevado patriotismo” (ou seja, que continuem a aprender a viver sem comer) para que Angola se torne uma nação de referência.
O MPLA encoraja também o seu Presidente, igualmente Presidente da Re(i)pública e Titular do Poder Executivo (não nominalmente eleito), general João Lourenço, “a continuar a implementar medidas de políticas que visam melhorar o Índice de Desenvolvimento Humano, impulsionar o aumento da produção, o crescimento económico e a prosperidade da nação”.
Ou seja, fazer tudo o que não conseguiu fazer ao longo dos últimos 49 anos, 22 dos quais de paz total.
“O MPLA expressa-se optimista com as acções empreendidas pelo executivo angolano, que visam intensificar os esforços para a materialização do direito ao emprego digno e de qualidade, a qualificação profissional e o estímulo ao empreendedorismo especialmente para a juventude, tendo como base a aposta séria num Sistema Nacional de Formação Profissional”, disseram ontem, dizem hoje, dirão amanhã, em os sipaios do regime.
O MPLA homenageia igualmente os que pagaram “com a própria vida o empenho directo e abnegado na luta de libertação” e reafirma-se como “vanguarda da promoção e reinserção política, económica e social de todas as forças vivas da nação, combatendo as várias formas de injustiça e discriminação”.
“Neste dia jubiloso, marcado pela libertação do povo angolano da dominação colonial portuguesa, o MPLA, em nome dos militantes, simpatizantes e amigos do Partido, apela todos os cidadãos a celebrarem o aniversário da independência nacional com manifestações de incontida alegria, que reforçam a crença na elevação dos níveis de unidade nacional e de coesão interna”.
Alguém ouviu alguma vez o general João Lourenço (Presidente da República não eleito, Presidente do MPLA, Titular do Poder Executivo e Comandante-em-Chefe das Forças Armadas) reconhecer que 68% da população angolana é afectada pela pobreza, que a taxa de mortalidade infantil é das mais altas do mundo, com 250 mortes por cada 1.000 crianças? Alguém o ouviu dizer que apenas 38% da população angolana tem acesso a água potável e somente 44% dispõe de saneamento básico?
Alguém ouviu alguma vez o general João Lourenço (Presidente da República não eleito, Presidente do MPLA, Titular do Poder Executivo e Comandante-em-Chefe das Forças Armadas) reconhecer que apenas um quarto da população angolana tem acesso a serviços de saúde, que, na maior parte dos casos, são de fraca qualidade? Alguém o ouviu dizer que 12% dos hospitais, 11% dos centros de saúde e 85% dos postos de saúde existentes no país apresentam problemas ao nível das instalações, da falta de pessoal e de carência de medicamentos?
Alguém ouviu alguma vez o general João Lourenço (Presidente da República não eleito, Presidente do MPLA, Titular do Poder Executivo e Comandante-em-Chefe das Forças Armadas) reconhecer que 45% das crianças angolanas sofrerem de má nutrição crónica, sendo que uma em cada quatro (25%) morre antes de atingir os cinco anos? Alguém o ouviu dizer que, em Angola, a dependência sócio-económica a favores, privilégios e bens, ou seja, o cabritismo, é o método utilizado pelo MPLA para amordaçar os angolanos?
Alguém alguma vez o general João Lourenço (Presidente da República não eleito, Presidente do MPLA, Titular do Poder Executivo e Comandante-em-Chefe das Forças Armadas) reconhecer que, em Angola, o acesso à boa educação, aos condomínios, ao capital accionista dos bancos e das seguradoras, aos grandes negócios, às licitações dos blocos petrolíferos, está limitado a um grupo muito restrito de famílias ligadas ao regime no poder?
Alguém ouviu alguma vez o general João Lourenço (Presidente da República não eleito, Presidente do MPLA, Titular do Poder Executivo e Comandante-em-Chefe das Forças Armadas) reconhecer que Angola é um dos países mais corruptos do mundo e que tem mais de 20 milhões de pobres?
Também a propósito desta efeméride, o Folha 8 emitiu o seguinte “comunicado”.
“Muitos governantes que têm grandes carros, numerosas amantes, muita riqueza roubada ao povo, são aparentemente reluzentes mas estão podres por dentro”. Esta foi e é, por muito que nos custe, a realidade do nosso país.
Alguém do MPLA se recorda, por exemplo, o que D. José de Queirós Alves, arcebispo do Huambo, afirmou em Julho de 2012 na comuna de Chilata, município do Longonjo, a propósito das eleições?
O prelado referiu que o povo angolano tinha muitas soluções para construir uma sociedade feliz e criar um ambiente de liberdade onde cada um devia escolher quem entender.
“Temos de humanizar este tempo das eleições, onde cada um apresenta as suas ideias. Temos de mostrar que somos um povo rico, com muitas soluções para a construção de uma sociedade feliz, criar um ambiente de liberdade. É tempo de riqueza e não de luta ou de murros”, frisou.
”Em Angola, a administração da justiça é muito lenta e os mais pobres continuam a ser os que menos acesso têm aos tribunais”, afirmou em 2009 (nada de substancial mudou até agora), no mais elementar cumprimento do seu dever, D. José de Queirós Alves, em conversa com o então Procurador-Geral da República, João Maria Moreira de Sousa.
D. José de Queirós Alves admitia também (tudo continua na mesma) que ainda subsiste no país uma mentalidade em que o poder económico se sobrepõe à justiça.
O arcebispo pediu maior esforço dos órgãos de justiça no sentido das pessoas se sentirem cada vez mais defendidas e seguras: “O vosso trabalho é difícil, precisam ter atenção muito grande na solução dos vários problemas de pessoas sem força, mas com razão”.
Importa ainda recordar, a bem dos que não têm força mas têm razão (e que, por isso, não são do MPLA), que numa entrevista ao jornal português “O Diabo”, em 21 de Março de 2006 (18 anos depois tudo continua na mesma), D. José de Queirós Alves disse que “o povo vive miseravelmente enquanto o grupo ligado ao poder vive muito, muito bem”.
Nessa mesma entrevista ao Jornalista João Naia, o arcebispo do Huambo considerou a má distribuição das receitas públicas como uma das causas da “situação social muito vulnerável” que se vive Angola.
D. Queirós Alves disse então que, “falta transparência aos políticos na gestão dos fundos” e denunciou que “os que têm contacto com o poder e com os grandes negócios vivem bem”, enquanto a grande massa populacional faz parte da “classe dos miseráveis”.