GOVERNO QUER DESMANTELAR A RTP

O Sindicato dos Jornalistas (SJ) de Portugal considera que o Plano de Acção para os Media (PAM), apresentado esta terça-feira, 8 de Outubro, contempla um projecto de desmantelamento da RTP sob a capa da defesa do Serviço Público, com o corte da publicidade e o anúncio de despedimentos, com o eufemismo de “saídas voluntárias”. O projecto, embora incorpore medidas que podem beneficiar o sector, fica curto para a emergência que se vive na Comunicação Social.

Por Sindicato dos Jornalistas (*)

Numa fase em que o Governo diz que pretende valorizar o sector, o SJ considera infelizes e desinformadas as críticas do primeiro-ministro ao jornalismo e ao trabalho dos jornalistas. Este tipo de declarações em nada dignificam a profissão, que Luís Montenegro considera um pilar da Democracia, e contribuem para um clima de suspeição que lamentamos e rejeitamos. Tais palavras tornam-se ainda mais incompreensíveis porque geram desconfiança sobre o trabalho dos jornalistas e minam a credibilidade dos órgãos de informação.

Por isso, o SJ não podia deixar passar em branco esta manobra de diversão para fazer fumo sobre o essencial desta proposta que é a desvalorização e esvaziamento da empresa que está obrigada por lei a prestar Serviço Público de Rádio e Televisão em Portugal. E não será irrelevante o contexto em que Luís Montenegro falou deste plano, uma Conferência Sobre o Futuro dos Media, promovida pelos e com os responsáveis privados do sector.

Ainda que o anunciado fim da publicidade na RTP possa ter a virtude de poder proporcionar mais tempo de antena para o jornalismo – além de dar mais mercado para as televisões privadas – o Sindicato dos Jornalistas interroga-se sobre como se pretende fazer esse passe de mágica de fazer melhor com menos gente e menos dinheiro, uma vez que a perda das receitas de publicidade não implica um aumento da comparticipação pública, mas, como é referido no documento, uma “gestão mais eficiente dos recursos da RTP, assente em tecnologia e em soluções digitais” e contempla já 19,9 milhões de euros para um plano de rescisões.

No entendimento do SJ, a gestão eficiente dos recursos não pode fugir ao respeito pela Lei, nomeadamente ao cumprimento integral, sério e sem subterfúgios do Acordo de Empresa especialmente no que respeita à valorização dos trabalhadores, dos salários e das carreiras. Ainda sobre a RTP, o SJ observa com alguma preocupação a ideia de “novas sinergias com a Lusa (sem fusão de empresas ou de redacções) e de uma maior autonomia na gestão de pessoal”, temendo um efeito de osmose sobre as sinergias.

Enquanto órgão representativo dos jornalistas, o Sindicato dos Jornalistas participou em três reuniões com a tutela, mas infelizmente não encontra neste documento respostas para a maioria das preocupações que apresentou ou respaldo para grande parte das propostas que fez ao ministro dos Assuntos Parlamentares, Pedro Duarte, e ao secretário de Estado da mesma pasta, Carlos Abreu Amorim.

Preocupações quanto ao Plano de Acção para os Media

O SJ reconhece que o Governo acomodou algumas propostas referentes à comparticipação das assinaturas digitais e de ofertas aos alunos, contribuindo para o reforço financeiro das empresas e para criar novos públicos. Contudo, defendemos um plano de literacia generalizado e acompanhado de uma grande campanha de publicidade e de divulgação da importância do jornalismo.

Reconhecendo, também, que foram acomodadas preocupações do SJ relativamente à distribuição de publicações periódicas em todos os concelhos do país e medidas de apoio ao jornalismo local, como a duplicação do Porte Pago, apesar de ignorar a proposta de alargamento aos media nacionais, e o reforço dos meios financeiros com a publicação de informação sobre fundos europeus e deliberações autárquicas, não deixa de nos preocupar o capítulo sobre a “Formação empresarial – órgãos de comunicação social regionais e locais”. Não pela virtude da medida, pois o saber não ocupa lugar, mas por propor “soluções inovadoras, como o micropayment associado a clicks de leitura, por exemplo”, que não tem muito de inovador e poderá contribuir mais para a precarização dos jornalistas, além de se perigoso para a qualidade da informação, pois acentua a tentação pelo “click” fácil.

Os planos de incentivo à contratação de jornalistas e de retenção de talento aparentam vantagens para a profissão, desde que seja garantida a criação líquida de emprego, prevenindo o despedimento dos mais velhos, e que seja evitado o recurso generalizado à rotação de jornalistas suportada pelo erário público nas redacções, com mecanismos mais fortes para garantir há um mínimo de contratações.

Sendo claramente a favor da remuneração de qualquer trabalho, e do aumento expressivo dos salários dos jornalistas, o SJ não pode deixar de notar que o vencimento proposto para um estagiário do IEFP (1120 euros) é superior ao salário pago a muitos jornalistas em várias redacções deste país, pois grande parte dos mais jovens, senão mesmo a maioria, não aufere sequer mil euros de salário bruto, com muitos, triste e infelizmente, a ficarem-se pelo salário mínimo, o que no caso da Imprensa é ilegal, uma vez que a remuneração mínima de acordo com o Contrato Coletivo de Trabalho em vigor é de 903 euros para início de carreira, e mesmo assim os patrões evitam cumprir. É, por isso, fundamental que esta medida seja acompanhada por uma demonstração clara do Executivo de que a melhoria de condições deve ser para todos os jornalistas, cumprindo a Lei e dignificando a profissão.

Como foi sublinhado nos encontros com a tutela, o SJ entende que deve ser obrigatório o cumprimento das convenções colectivas para as empresas que venham a beneficiar de qualquer tipo de apoio ou incentivo público. Essa é uma linha vermelha na defesa de uma classe que vive ofegante com o excesso de trabalho e com falta de ar na carteira.

O SJ continuará disponível para afinar medidas para o setor com o Governo, nas várias áreas de actividade, no já proposto e no que foi ignorado, nomeadamente em relação aos jornalistas “freelancer”, que não foram sequer lembrados e que todos os anos sentem os rendimentos a encolher. E, também, sobre o Código da Comunicação Social, que deve ser acompanhado do mais amplo debate e rigoroso escrutínio, pois entronca com as leis que regem a profissão, que está consagrada na Constituição da República Portuguesa.»

(*) Texto integral do comunicado do Sindicatos dos Jornalistas de Portugal

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