“CIDADANIA” SIM, “PRA-JA” EM ESPERA

O Tribunal Constitucional (TC) do MPLA (Angola) legalizou um novo partido denominado CIDADANIA – Iniciativa de Cidadania para o Desenvolvimento de Angola, por preencher todos os requisitos legais, entre eles o mínimo de 7.500 assinaturas exigidas.

Segundo o despacho da juíza presidente do TC, Laurinda Cardoso, a comissão instaladora do CIDADANIA preencheu todos os requisitos da Lei dos Partidos Políticos, pelo que foi anuída a sua legalização.

O despacho, datado de 9 de Julho, refere que a corte do Constitucional apurou como válido o número mínimo legal de 7.500 assinaturas de cidadãos requerentes, sendo 150 destas correspondentes a cada uma das 18 províncias de Angola.

A denominação, sigla, símbolo e bandeira do CIDADANIA, presidida por Cláudio Pedro Fernandes Brandão, não se confundem com denominações, siglas, símbolos e bandeiras de outros partidos políticos já inscritos no TC, assegura o órgão judicial.

O novo partido, em comunicado de imprensa, enalteceu o trabalho do Tribunal Constitucional ao legalizar o partido, referindo que a aquela instância “tem um papel fundamental no desenvolvimento do processo democrático e merece o reconhecimento de todos os angolanos”.

“A participação política de todos, especialmente dos mais jovens, é a certeza de que estamos no bom caminho. O nosso partido vem trazer esperança ao povo angolano, em particular à sofrida juventude”, lê-se na nota.

Com a legalização do CIDADANIA eleva-se para doze o número de partidos legalizados em Angola, juntando-se ao MPLA, UNITA, FNLA, PRS, PDP-ANA, PADDA-AP, PALMA — Nova Angola, PNSA, PPA, Bloco Democrático e o PHA.

Recorde-se que o político angolano Abel Chivukuvuku tem tentado formalizar o seu projecto político PRA JA-Servir Angola como partido desde 2019 e, apesar de consecutivos chumbos do Tribunal Constitucional, disse, na semana passada, que estava a preparar uma nova comissão instaladora e perspectivou a legalização até ao primeiro trimestre de 2025.

Em Abril, o Tribunal Constitucional voltou a negar provimento às pretensões de Abel Chivukuvuku, actualmente deputado do grupo parlamentar da UNITA, no quadro da plataforma Frente Patriótica Unida, por não terem sido apresentados documentos novos ou supervenientes.

Em 2020, o Tribunal Constitucional rejeitou, em definitivo, a legalização do PRA JA- Servir Angola, por “não suprir insuficiências”, ficando o processo suspenso por quatro anos.

Recordemos que juristas, advogados e jornalistas descomprometidos com a obtusidade do regime, têm vindo a denunciar, nos últimos 7 anos, as autênticas violações às normas constitucionais e de direito, inadmissíveis num Estado que se diz de direito e democrático que, desgraçadamente, o MPLA impede de o ser, tudo para consolidar o novo poder autocrático, que faz da força bélica, um modo de governação. Pese o comprometimento e os muitos erros, o Tribunal Constitucional vai dando algumas guinadas, pequenas mas significativas, na bifurcação ideológica, que amarfanha o poder judicial.

No dia 5 de Setembro de 2022, 10 dos 11 juízes (Josefa Neto votou vencida), do Constitucional, negaram, pelo acórdão 769/2022 provimento à providência da UNITA que pediu a ineficácia da acta de apuramento das eleições, reclamando vitória sobre o MPLA, com base na contabilidade da cópia das actas da própria Comissão Nacional Eleitoral.

Foi um balde de água fria, para a sociedade civil, líder do “votou sentou” para o controlo do voto, porque o MPLA perdeu, mas continua no poder, a UNITA ganhou e está na oposição. Muitos cidadãos pediram ao Galo Negro a ocupação das ruas em manifestações de protestos, mas ante a demonstração de força do regime, Adalberto da Costa Júnior optou por entrar nas instituições, “para preservar o derramamento de sangue”. Mancha negra judicial, confirmando o domínio partidocrata dos tribunais superiores.

Com a imagem degradada, muito por a presidente, Laurinda Cardoso, ser membro do bureau político do MPLA, era preciso uma inversão, para resgate da imagem desgastada e, um ano e um mês depois, através do Acórdão 845/2023, aprovado no 4.10.23, recorrendo à ética de Aristóteles de a coragem ser uma virtude moral que se encontra no meio-termo entre a covardia e a imprudência, o Tribunal Constitucional avançou, para um desmonte presidencial.

E tendo ou não ciência, os magistrados pegando o cajado de Nelson Mandela: “Eu aprendi que a coragem não é a ausência de medo, mas o triunfo sobre ele. O homem corajoso não é aquele que não sente medo, mas aquele que conquista por cima do medo,” enfrentaram e derrubaram o Decreto Presidencial n.º 69/21, de 16 Março, que estabelecia o regime de divisão (comparticipação) de 10% dos activos financeiros e não financeiros recuperados, aos denominados corruptos, com os magistrados. Foi o fim da heresia jurídica – partidocrata, que colocava na mesa do banquete, o mais inusitado, a nível mundial, magistrados e delinquentes, dividindo o produto de ilícitos (roubos/corrupção).

E fizeram-no dando provimento a uma acção movida, também, corajosamente, pela Ordem de Advogados de Angola que considerou o Decreto presidencial, uma ofensa ao direito e grosseira inconstitucionalidade, por quase estimular, tendências de práticas dantescas de magistrados, o exercício de funções.

Foi o primeiro, duro e grande alerta do Constitucional contra João Lourenço avisando-o que não poderia tudo, permanentemente, pois “existe” a independência dos órgãos de soberania e não deve, pese o poder autocrático, ser tão ostensivo na humilhação, ao legislativo e judiciário.

Mas logo depois, o mesmo TC, quando na bifurcação deveria ir para a direita, guina à esquerda através do acórdão 881/2024 de 2 de Abril.

É um hino às elucubrações jurídico-constitucionais e abraço solidário ao Presidente João Lourenço, ao desconsiderar o pedido da UNITA de acção de Fiscalização Abstracta Sucessiva, para a apreciação e declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma constante do n.º 3 do artigo 284.º do Regimento da Assembleia Nacional (RAN), aprovado pela Lei n.º 13/17, de 6 de Julho – Lei Orgânica do Regimento da Assembleia Nacional, por conferir ao Plenário da Assembleia Nacional, poderes conflituantes aos estabelecidos nos números 3, 4 e alíneas b) e c) do n.º 5 do artigo 129.º da CRA. Esta alusão é uma pérola, merecedora de ampla discussão nas academias de direito, ao considerar norma infraconstitucional superior a norma constitucional e que “não existem desconformidades entre a norma do n.º 3 do artigo 284.º do RAN (Regimento da Assembleia Nacional) com os comandos dos n.ºs 3, 4 e alíneas b) e c) n.º 5 do artigo 129.º da CRA, e que a norma regimental em causa não viola o princípio da supremacia da Constituição e legalidade consagrado no artigo 6.º da Constituição da República de Angola”.

Não é verdade, viola! A negação de provimento é absurda, tem vínculo político, autêntica moeda de troca, com João Lourenço: uma no cravo outra na ferradura: UNITA esfola e Zenú salva.

Mas com isso, o plenário do TC abre o que nas insuficiências, se denomina, um precedente representativo, por o acórdão violar a reserva do plenário, quanto a declaração de inconstitucionalidade dos n.ºs 3 (“T Supremo, conhecer e decidir processos criminais contra PR”), 4 (“T Constitucional, conhecer e decidir destituição do PR”) e alíneas b) e c) do n.º 5 do art.º 129.º CRA, na medida que os magistrados deixaram de interpretar na plenitude, as incontornáveis al.ª b) “proposta apresentada por um terço dos deputados em efectividade de funções”, tendo a UNITA cumprido materialmente ao apresentar o processo subscrito por mais de 70 deputados.

Folha 8 com Lusa

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