TROÇO FERROVIÁRIO POR AJUSTE… PESSOAL

A Odebrecht e a Bento Pedroso Construções, que integra o grupo brasileiro, “ganharam” um contrato de 1.168 milhões de dólares para construir o troço Luena-Saurimo do Caminho-de-Ferro de Benguela, em Angola, segundo um decreto presidencial.

No diploma, o Presidente da República, João Lourenço, ouvido o Presidente do MPLA (João Lourenço) e o Titular do Poder Executivo (João Lourenço) autoriza a despesa de 1.168 milhões de dólares (1.077 milhões de euros) e formaliza a contratação simplificada (por ajuste pessoal, também chamado ajuste directo) por critério material para a concepção e construção do troço de 260 quilómetros.

O despacho presidencial justifica o investimento com a necessidade de melhoria do transporte ferroviário, volume de mercadorias e número de passageiros transportados, sublinhando a importância deste eixo ferroviário na ligação entre o litoral e o interior de Angola, partindo de Benguela até ao Moxico, permitindo o transporte de mercadorias a partir do Porto de Lobito até à Região das Lundas.

O objectivo é dotar aquela zona de um meio de transporte seguro, fiável e competitivo que potencie actividades como a mineração, “altamente dependente dos meios de transporte para suprir as necessidades logísticas, bem como dinamizar o projecto Planagrão, cujo objectivo é impulsionar as indústrias e seus derivados com foco nas províncias da Lunda Norte, Lunda Sul, Moxico e Cuando Cubango”.

O ministro dos Transportes terá a competência de aprovar as peças do procedimento e celebrar o contrato enquanto à ministra das Finanças caberá a disponibilização dos recursos financeiros.

Em 3 de Julho de 2020, o presidente da República (não nominalmente eleito), João Lourenço, afirmou que Angola tem mais para oferecer do que petróleo, gás e diamantes, destacando que o país deve explorar todos os seus recursos. Tem toda a razão. Pode, por exemplo, oferecer os melhores peritos em corrupção e incompetência ou um genocida (Agostinho Neto) responsável por milhares e milhares de mortos e que é considerado herói nacional.

João Lourenço, que falava na inauguração do novo Instituto Geológico de Angola (IGEO), em Luanda, destacou que esta é uma entidade “de extrema importância” para um país com os recursos geológicos e mineiros de Angola, podendo prestar serviços ao Estado e a investidores privados.

O chefe do executivo assinalou ainda que o IGEO tem tecnologia de ponta e quadros qualificados, na maioria jovens angolanos, servindo não apenas o sector das ciências geológicas e mineiras, mas também o sector dos petróleos, da agricultura e da construção civil, da exploração espacial, da mortalidade infantil e da produção acelerada de pobres, cuja fasquia já passou os 20 milhões.

“Nós temos puxado pelo ministro dos Recursos Minerais e Petróleo no sentido de procurar explorar todos os recursos de que Angola dispõe. Até aqui os recursos mais explorados são o petróleo, o gás e o diamante, mas como acabámos de ver, nas amostras apresentadas, o país tem muito mais”, sublinhou.

João Lourenço acrescentou ainda que o IGEO “vai ser útil aos investidores que precisam de informação geológica para poderem fazer os seus investimentos na área geológica e mineira e essa informação será colhida nesse instituto que tem capacidade para servir todo o tipo de cliente, quer seja o estado quer sejam investidores privados”.

O IGEO, cuja primeira pedra foi lançada em Dezembro de 2013, tem sede em Luanda na centralidade de Kilamba, e dois centros regionais, no Lubango (província da Huíla) e Saurimo (província da Lunda-Sul).

O laboratório de Luanda tem a função mais completa, com foco na microanálise. O de Lubango, além das análises genéricas possui capacidade de preparação e análise de rochas ornamentais e minerais industriais, enquanto o de Saurimo realiza análises geo-científicas.

Colonos portugueses ensinaram, mas…

Angola preparou-se para lançar a 27 de Agosto de 2019 o primeiro concurso público internacional para atribuição de licenças de exploração e prospecção de diamantes, ferro e fosfato. De acordo com Diamantino de Azevedo, ministro dos Recursos Minerais, Petróleo e Gás, o concurso visava dar cumprimento ao que estava estabelecido no código mineiro angolano, bem como relançar e revitalizar o sector.

O sector mineiro em Angola tem vindo a passar por um processo de reestruturação (várias vezes anunciado e sucessivamente adiado) que, segundo o ministro poderá culminar na alteração do modelo de governação.

O objectivo do estado era reduzir o seu papel na gestão da economia extractiva e, à semelhança do que foi feito no sector petrolífero, tinha em vista o surgimento de uma agência nacional de recursos minerais que iria exercer a função de concessionária, papel até então exercido pela Endiama que actuava como árbitro e operador no sector diamantífero e a Ferrangol em relação à exploração e comercialização do ouro.

Outra alteração ao sector era a criação de uma bolsa de diamantes em Angola para cuidar da parte da comercialização desta pedra preciosa. Foi aprovada uma nova política de comercialização bem como o seu regulamento técnico.

A oito de Setembro de 1997 os chefes de Estado e de governo da SADC assinaram, em Blantyre, República do Malawi, um protocolo para assegurar, através da cooperação e colaboração, o desenvolvimento dos recursos mineiros da região com objectivo teórico de melhorar o nível de vida da população.

A SADC tem vindo a apelar aos países membros para adoptarem uma posturas socialmente responsáveis aquando da implementação de políticas para o desenvolvimento do sector mineiro nos países membros, e defende mesmo a necessidade de utilização dos meios de investigação e técnicos, já existentes na região da África Austral, uma estratégia que denominou de “trabalho em rede”.

Repetir diagnósticos enquanto o doente definha

As notícias sobre as boas intenções do regime do MPLA, o mesmo desde 1975, repetem-se. Em 2016 o Governo disse que previa iniciar a produção de concentrado de ferro a partir dos depósitos de Kassinga (ou Cassinga), no sul, dentro de dois anos, sendo esta a primeira fase de um projecto para relançar a extracção deste minério no país.

De acordo com o programa de reestruturação do Projecto Mineiro-Siderúrgico de Kassinga (PMSK), aprovado por decreto real de 13 de Junho de 2016, trata-se de uma área alvo de trabalhos de prospecção nos últimos anos.

Situa-se a 350 quilómetros do Lubango, de onde, desde 1967, foram exportadas 40 milhões de toneladas de minério de ferro para a Europa, América e Ásia, até à suspensão das operações, em 1975, no fim do período colonial português e início da sovietização do país via MPLA.

A primeira fase deste projecto, tido pelo Governo como estrutural para o sector mineiro nacional, previa um investimento de 120 milhões de dólares (108 milhões de euros) e tinha como objectivo “relançar a extracção e beneficiamento de minério de ferro” nos depósitos secundários das áreas de Kassinga Norte (Jamba) e Kassinga Sul (Tchamulete), “com reservas, provadas e prováveis, que atingem as 35,29 megatoneladas”.

“A meta é atingir uma produção de 1,8 Mtpa [milhões de toneladas por ano] de concentrado, para exportação”, referia o programa de reestruturação do PMSK, que seria negociado pela concessionária estatal do sector mineiro, a empresa Ferrangol, e implementado “em associação com parceiros estratégicos, técnica e financeiramente bem capacitados”.

No prazo de três a cinco anos previa-se o arranque da produção anual de 10 milhões de toneladas de ‘pellets’ (ferro comprimido e moldado) a partir do depósito primário de Cateruca (2.ª fase), e entre quatro a seis anos o início da produção anual de mais 10 milhões de toneladas de ‘pellets’ no depósito primário de Tchamutete (3.ª fase).

Estava ainda previsto, ao abrigo do PMSK, o “desenvolvimento de actividades siderúrgicas com vista à instalação de uma fileira industrial com base no minério de ferro nacional”.

O transporte do minério extraído seria garantido através do Caminho-de-Ferro de Moçâmedes (CFM) até ao litoral, e depois por via marítima, o que obrigaria a um investimento suplementar na linha férrea, no valor de 35 milhões de dólares (31,5 milhões de euros), e nas infra-estruturas marítimas, avaliado em 45 milhões de dólares (40,5 milhões de euros).

Como era antes da independência

Angola foi, até ao início dos anos sessenta do século passado, essencialmente um reservatório de matérias-primas por explorar, como um diamante em bruto que espera a lapidação. Mas em 1961 as coisas mudaram e as indústrias até aí adormecidas começam a acordar para o mercado. Com o território aberto para os investimentos nacionais e estrangeiros o caminho começa a desenhar-se. As primeiras indústrias a ganhar relevo – ainda que progressivamente – foram as do ferro e do petróleo, que conseguiram um lugar de destaque junto dos chamados produtos tradicionais, como o café e os diamantes.

O ferro principalmente, uma vez que se começou a investir em novas infra-estruturas, nomeadamente transportes (como os caminhos-de-ferro), indústrias extractivas e transformadoras. Foi no início dos anos 60 do século XX que o Planeamento Mineiro deu os seus primeiros passos em Angola, sob o impulso do engenheiro José Quintino Rogado, Catedrático de Preparação de Minérios do Instituto Superior Técnico e Director Técnico da Companhia Mineira do Lobito.

Nessa época surgem as primeiras tentativas de modelização matemática dos recursos minerais metálicos a partir da geo-estatística. A importância da Companhia Mineira do Lobito na economia de Angola era extremamente significativa: o valor médio anual da produção de minério de ferro no período 1968/1973 correspondia a 22.8 % da indústria extractiva e a 9.4% do total das exportações, o que levava a que este produto se posicionasse em terceiro lugar (a seguir ao café e aos diamantes) no ranking da economia de Angola, durante a derradeira fase colonial, em que a produção dos concentrados de ferro cresceu ao ritmo de 23% ao ano.

A Companhia Mineira do Lobito foi fundada em 1957 e logo assumiu a extracção de ferro na Jamba, Kassinga e Chamutete. Esta companhia cedeu depois as actividades à Krupp alemã, que também funcionava com capitais da Greg-Europe Belga e do Japão.

Referem ainda os dados disponíveis que a quantidade de exploração anual, incluindo a produção geral nas províncias de Malange, Bié, Huambo e Huíla, atingia a média de 5,7 milhões de toneladas em 1974. A maior parte do mineral era exportado para o Japão, Alemanha e Grã-Bretanha, que pagavam a Angola 50 milhões de dólares norte-americanos ao ano, a preços constantes.

O potencial mineiro do Moxico também alimentava nesta altura a indústria extractiva do país. Cobre, ouro, volfrâmio, diamantes, manganês e urânio eram transportados pelos Caminhos-Ferro-de Benguela para o porto de Lobito.

O Moxico nasceu à sombra do Caminho-de-Ferro de Benguela (CFB) e cresceu como entreposto comercial até se tornar no mais importante centro da região. Na época colonial, a capital da província, conhecida por Luso (Luena) albergava uma das estações principais do CFB. As locomotivas, que transportavam milhares de toneladas de materiais, metais preciosos e produtos agrícolas entre o porto do Lobito, na costa Atlântica, e povoação fronteiriça de Luau, na parte oriental do país, faziam escala no Luso para se abastecer e depositar mercadorias. Ao mesmo tempo, Kassinga, na província de Huíla, era a jóia da coroa da metrópole na época colonial. As minas desta cidade abasteceram a Siderurgia Nacional com 985 mil toneladas de minérios para transformação.

Rica em ferro e manganês, os minerais eram transportados pelo ramal ferroviário até ao porto do Saco-Mar. E daqui seguiam para a Siderurgia Nacional, no Seixal, nos arredores de Lisboa. O Porto do Saco-Mar, concluído em 1967, possuía uma ponte constituída por betão assente sob fiadas de estacas. Mais tarde, seguiu-se a construção de um local com profundidade suficiente para receber navios de grande porte.

A Siderurgia Nacional era quase sempre o destino dos minerais angolanos. Inaugurada em Agosto de 1961, o complexo industrial produzia 230 mil toneladas de gusa (produto resultante do minério de ferro pelo carvão ou calcário num alto forno), 140 mil de escória, usada em aplicações como balastro de estradas, construção civil e fabrico de cimentos. Na área da aciaria, a produção anual era de 300 mil toneladas de aço bruto, e na laminagem, onde era transformado o aço, produzia-se 150 mil toneladas de aço para betão.

Sem os minérios de Kassinga a produção em Lisboa nunca teria atingido estes valores. Quase dez anos depois, no início da década de setenta a taxa de crescimento da economia angolana atingia níveis elevados fruto das modificações verificadas entre 1960 e 1972, a progressão da produção das indústrias extractivas nos dez anos anteriores. Esse crescimento foi particularmente visível – entre 1960 e 1972 – nos diamantes, ferro e petróleo, sendo que entre 1962 e 1968, a taxa de crescimento das indústrias extractivas foi de mais de 170% (cerca de 28% por ano) com preponderância para o ferro.

E mais: entre 1968 e 1969 as vendas de ferro duplicaram. Foi neste sector — onde se encontrava o essencial dos investimentos estrangeiros multinacionais — que houve a maior expansão no período de 1960-72. Por exemplo, entre 1960 e 1972 a produção de minério de ferro passou, em números redondos, de 660 mil toneladas a 4830 mil toneladas. O ferro estava em alta: durante esse período o minério era o principal produto exportado de Angola sendo que um importante conjunto de minas de ferro estava localizado nas Províncias do Huambo e Huíla, dentro da bacia do rio Cunene.

A última mina em exploração situava-se em Kassinga, Huíla, tendo cessado a extracção durante a guerra civil. Nessa altura as plantações existiam sobretudo na parte noroeste de Angola com especial destaque para a produção do café, seguida do algodão e do açúcar. As minas existiam sobretudo na parte noroeste de Angola, para a extracção de diamantes, e na parte sul de Angola – planalto de Huíla e Cuando-Cubango – para a extracção de minério de ferro.

Em 1973 as principais exportações eram ainda o petróleo (30%), café (27%), diamantes (10%), minérios de ferro (6%), algodão (3%) e sisal (2%).

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