SEM ELE SERIA O FIM DO MUNDO

O Presidente angolano, general João Lourenço, disse hoje que é hora de negociar e fazer a paz na Europa, voltando a apelar um cessar-fogo definitivo e incondicional por parte da Rússia para criar o “necessário ambiente negocial” entre as partes. Vladimir Putin pôs-se em sentido e disse “спасибо президент” (obrigado Presidente).

João Lourenço, que discursava na cerimónia de apresentação de cumprimentos do corpo diplomático acreditado em Angola, apontou a guerra na Ucrânia como “uma séria ameaça à paz e segurança” da Europa e do mundo, provocando a maior crise energética, alimentar e humanitária desde a Segunda Guerra Mundial.

“Exortamos ao estabelecimento de um cessar-fogo definitivo e incondicional por parte da Rússia, para que se crie o necessário ambiente negocial entre as partes envolvidas, que leve à construção de uma paz sólida e duradoura nesse continente”, sublinhou o general do MPLA, na sua qualidade de “querido líder” dos angolanos.

O chefe de Estado prosseguiu com o foco na Rússia, salientando que “a realidade de hoje contrasta com o estatuto e prestígio” que esta potência conquistou na altura, juntando-se aos aliados de então – Estados Unidos da América, Reino Unido e França – para libertar a Europa e o mundo da ocupação e da ameaça nazi.

“É hora de negociar e fazer a paz, o mundo reconhecerá esse passo na direcção certa da História”, encorajou o general João Lourenço, dirigindo-se aos embaixadores e chefes de missão diplomática, na cerimónia interrompida dois anos devido à pandemia de Covid-19.

Abordando os acontecimentos recentes no Brasil, João Lourenço voltou a condenar “veementemente o assalto às instituições do poder executivo, do legislativo e do judicial”, numa tentativa de reverter a ordem constitucional e a legitimidade do poder conferido nas urnas.

“Naquelas horas de domingo, a democracia brasileira viveu momentos de grande perigo e incertezas pelo facto de os acontecimentos poderem ter evoluído para um golpe de Estado”, lamentou o chefe de Estado angolano, certamente lamentando que Jair Bolsonaro, seu amigo, não tenha pedido ajuda à Comissão Nacional Eleitoral (do MPLA) e ao Tribunal Constitucional (do MPLA). Tinha sido tudo muito mais simples.

Um “atentado grave” contra a democracia que levou o mundo a solidarizar-se em uníssono com o Governo de Lula da Silva “em respeito à vontade expressa do povo brasileiro”, complementou. Quanto à “vontade expressa do povo angolano” nas eleições de Agosto do ano passado… nada.

Noutro campo, apontou os esforços da diplomacia angolana na mediação e resolução de conflitos na Região dos Grandes Lagos, na África Central e na Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral (SADC).

“Continuamos a desenvolver, em conjunto com a comunidade dos Estados da África do Leste, importantes esforços para a pacificação do leste da RD Congo e o restabelecimento das relações de amizade e boa vizinhança entre a RD Congo e o Ruanda, no espírito das deliberações da última cimeira de Luanda”, frisou.

Além disso, “Angola contribui com a projecção de forças e meios da comunidade no esforço colectivo de luta contra o terrorismo e pacificação de Cabo Delgado em Moçambique”.

O Presidente angolano abordou também as reformas que tem vindo a operar nos últimos anos “com vista a garantir as liberdades fundamentais dos cidadãos, reduzir a burocracia na função pública, combater a corrupção e a impunidade”, progressos que disse deverem-se também à melhoria do ambiente de negócios e ao sucesso do programa com o grupo Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional, “que aumentou a credibilidade de Angola”.

O chefe de Estado destacou ainda outras acções que reflectem a importância que o executivo dá ao sector privado e os investimentos públicos em infra-estruturas, no sector social e na educação, bem como o combate à seca e à pobreza.

Depois desta lição, mais uma, de diplomacia de altíssimo nível, o general João Lourenço terá exemplificado com um uma refeição frugal, do tipo trufas pretas, caranguejos gigantes, cordeiro assado com cogumelos, bolbos de lírio de Inverno, supremos de galinha com espuma de raiz de beterraba e queijos acompanhados de mel e amêndoas caramelizadas e umas garrafas de Château-Grillet 2005.

Se não o fez… deveria ter feito. Seria uma ementa que só honraria os angolanos, nomeadamente os 20 milhões que com honra assumem ser… pobres.

DISCURSO (NA ÍNTEGRA) DE SUA EMINÊNCIA JOÃO LOURENÇO

«É para mim e para a minha esposa, uma grande honra receber Vossas Excelências para a realização desta cerimónia, interrompida nos últimos dois anos por força da pandemia da Covid-19, para nos saudarmos mutuamente por ocasião deste ano de 2023 que acaba de iniciar.

Agradeço e manifesto o meu apreço pelas palavras encorajadoras que foram dirigidas a mim e, por meu intermédio, aos meus compatriotas, pelo senhor embaixador Piotr Józef Myslimwiec, Decano do corpo diplomático acreditado em Angola.

Vossas Excelências têm sido testemunhas oculares das reformas que se vêm operando nos últimos anos em Angola com vista a garantir as liberdades fundamentais dos cidadãos, reduzir a burocracia na função pública, combater a corrupção e a impunidade, diversificar a economia, fomentar a produção interna de bens e serviços, reduzir as importações de bens essenciais de consumo e aumentar as exportações e a oferta de postos de trabalho.

Todos estes progressos devem-se à criação de um novo ambiente de negócios, ao sucesso obtido no programa com o Grupo Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional, que aumentou a credibilidade de Angola junto dos credores internacionais.

O sucesso deve-se ainda à clara definição do papel do Estado na economia, à importância que este Executivo dá ao sector privado da economia, ao programa de privatizações de activos do Estado, ao forte investimento público que se vem fazendo em infra-estruturas de produção e distribuição de energia e água, nas estradas, caminhos de ferro, portos e aeroportos, assim como no sector social com a construção de uma importante rede hospitalar nas três categorias de classificação, na educação e ensino superior, com a admissão de milhares de profissionais destes dois sectores.

De destacar ainda as acções em curso no combate à seca no sul do país, no combate à pobreza, no apoio e promoção do empreendedorismo, na formação profissional dos jovens e na distribuição gratuita de kits profissionais.

A diplomacia angolana, juntamente com outros actores internacionais, vem ganhando uma nova dinâmica no mundo de hoje, jogando um importante papel de mediação e resolução de conflitos pela via do diálogo na Região dos Grandes Lagos, na África Central e na SADC.

No cumprimento do mandato da União Africana, continuamos a desenvolver, em conjunto com a comunidade dos Estados da África do Leste, importantes esforços para a pacificação do leste da RDC e o restabelecimento das relações de amizade e boa vizinhança entre a RDC e o Ruanda, no espírito das deliberações da última cimeira de Luanda.

No quadro da SADC, Angola contribui com a projecção de forças e meios da comunidade no esforço colectivo de luta contra o terrorismo e pacificação de Cabo Delgado em Moçambique.

Congratulamo-nos com os esforços que vêem sendo feitos pela Comunidade dos Estados da África Ocidental CEDEAO, nos esforços para a reposição da normalidade constitucional ferida em alguns Estados membros nomeadamente no Mali, na Guiné e no Burkina Fasso.

Enquanto Presidente pro tempore da Comunidade dos Países de Língua Oficial Portuguesa CPLP, condenamos veementemente o assalto às instituições do poder Executivo, do Legislativo e do Judicial, numa tentativa de reversão da ordem constitucional e da legitimidade do poder democraticamente conferidos nas urnas no Brasil.

Naquelas horas de domingo, a democracia brasileira viveu momentos de grande perigo e incertezas pelo facto de os acontecimentos poderem ter evoluído para um golpe de Estado. O mundo inteiro reagiu em uníssono contra este atentado grave à democracia, solidarizando-se com o governo de Lula em respeito à vontade expressa do povo brasileiro.

Aproveito esta ocasião para realçar a vitória de África na Cimeira Estados Unidos da América-África, pelo anúncio de o continente passar a estar condignamente representado no G-20, assim como ganhar um lugar de membro permanente do Conselho de Segurança das Nações Unidas no quadro das reformas que se vão realizar.

Estas conquistas são o resultado da nossa longa luta pelo reconhecimento do quanto África contribuiu para o crescimento e desenvolvimento das economias das grandes potências, o quanto pode contribuir mais para a economia mundial, para a ciência, a cultura, o desporto, a paz e segurança mundiais. Está sendo feita justiça e, com isso, passaremos a ver um Conselho de Segurança que melhor reflecte a realidade geopolítica, económica e demográfica do século XXI.

A guerra contra a Ucrânia representa uma séria ameaça à paz e segurança não apenas para a Europa mas a nível global. Provocou já a maior crise energética, alimentar e humanitária que o mundo conheceu após a Segunda Guerra Mundial que, como sabemos, terminou em 1945, ou seja, há 78 anos.

Toda a comunidade internacional é pela paz e concórdia entre os povos, é pela resolução pacífica dos conflitos entre as nações. Exortamos ao estabelecimento de um cessar-fogo definitivo e incondicional por parte da Rússia, para que se crie o necessário ambiente negocial entre as partes envolvidas, que leve à construção de uma paz sólida e duradoura nesse continente.

A realidade de hoje contrasta com o estatuto e prestígio granjeados pela Rússia de ter sido, com os aliados de então -os EUA, o Reino Unido e a França- os que libertaram a Europa e o Mundo da ocupação e da ameaça nazi.

É hora de negociar e fazer a paz; o mundo reconhecerá esse passo na direção certa da História.»

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