POVO PROTESTA, POLÍCIA DISPARA, MPLA GOZA

A Amnistia Internacional (AI) pediu hoje contenção à Polícia angolana (em rigor, Polícia do MPLA) e a protecção dos direitos humanos, no dia em que se anunciou para sábado uma marcha nacional contra a subida dos combustíveis.

O apelo da AI surge após uma semana agitada em que manifestações de taxistas e moto taxistas nas cidades do Lubango e do Huambo terminaram em confrontos com a polícia, de que resultaram mortos, feridos e detidos. Hoje eclodiu em Moçâmedes um novo protesto em que foram feitas também detenções.

A AI sublinha que a dispersão dos manifestantes deve ser sempre uma medida excepcional (o MPLA faz do que deveria ser excepção a regra), tal como o uso da força, que deve estar reduzida ao mínimo indispensável, questionando o uso de gás lacrimogéneo e balas reais para dispersar uma multidão no Huambo, no dia 5 de Junho. Pelo menos cinco pessoas morreram nesta cidade, entre as quais uma criança de 12 anos.

“Pedimos à polícia nacional que pare de usar a força excessiva nestes protestos”, apela a organização de direitos humanos.

Outra organização não-governamental, a Friends of Angola endereçou cartas ao Presidente angolano, João Lourenço (com conhecimento do Presidente do MPLA, João Lourenço, e do Titular do Poder Executivo, João Lourenço) e ao líder do principal partido da oposição que o mesmo MPLA (ainda) permite em Angola, Adalberto da Costa Júnior (UNITA), expressando preocupação com os oito cidadãos que diz terem morrido no Huambo, bem como com os feridos.

“O incidente ocorrido na província do Huambo, onde a Polícia Nacional usou da força de forma excessiva e desproporcional, incluindo balas reais, contra manifestantes é sem dúvida uma violação da constituição angolana e das normas internacionais de direitos humanos”, acusam.

Na origem da revolta está o facto de o governo ter subido de um dia para o outro o preço da gasolina em 87%, passando de 160 (25 cêntimos) para 300 kwanzas (48 cêntimos) por litro, isentando taxistas e moto taxistas.

No entanto, a grande maioria destes operadores não estão licenciados (por culpa de quem?) e entre os que estão apenas um reduzido número tiveram já acesso aos cartões que lhes permitem aceder a este benefício

Recorde-se que a situação levou a que os dirigentes da re(i)pública viessem a terreiro explicar falhas de comunicação sobre o processo de retirada dos subsídios aos combustíveis, que continuam a gerar protestos – alguns violentos, com mortos e feridos) – em várias províncias.

O administrador do Instituto de Gestão de Activos e Participações do Estado (IGAPE), Raimundo Santa Rosa, admitiu que houve falhas de comunicação nos vários níveis da tomada de decisão no processo de redução dos subsídios aos combustíveis.

“O que aconteceu no Huambo e no Lubango é lamentável, isso toca a todos nós, não era o esperado, tudo foi feito para que isso não acontecesse (…), mas pensamos que com os esforços que estão a ser feitos desde o princípio isto está a ser mitigado na maior velocidade possível”, disse Raimundo Santa Rosa.

O Ministério das Finanças foi também “obrigado” a fazer sessões com líderes religiosos e sindicatos sobre a reforma em curso e deu conta de que estava a ser estudada a redução do IRT (Imposto sobre o Rendimento do Trabalho) para mitigar os efeitos da medida.

Os responsáveis têm salientado os custos do subsídio aos combustíveis para as despesas do Estado e que é necessário diminuir o impacto nas finanças públicas, lembrando que esta era uma medida já prevista. Quanto aos milhões de angolanos que continuam a aprender a viver sem comer, que continuem ir às aulas…

O Governo continua a subvencionar a gasolina, atribuindo – a partir de Luanda e a uma velocidade que varia entre devagar, devagarinho e… parado – um cartão personalizado a todos os taxistas, moto taxistas e embarcações de pesca licenciada. A demora na atribuição destes cartões gerou, sobretudo mas não só nas províncias do Huambo e da Huíla, protestos violentos.

O Ministério dos Transportes e o Ministério das Finanças emitiram também um comunicado apelando à calma e à serenidade. De barriga vazia mas calmos e serenos, pede o MPLA.

O administrador para a Área de Operações da Agência Nacional dos Transportes Terrestres, Alberto Quengue, referiu que antes do licenciamento da classe foram realizadas reuniões com parceiros, nomeadamente associações de taxistas, para auscultação, “mas de facto não se falou em momento algum do aumento do combustível”.

Brilhante. Reuniões que tinham como cerne o aumento do combustível mas que, certamente por falta de gasolina, acabaram por não abordar o “aumento do combustível”.

Alberto Quengue disse que a questão do aumento do preço dos combustíveis já se vinha falando há algum tempo de forma informal, mas “em algum momento o Governo informou que haveria de proceder ao aumento dos combustíveis e precisar a data”. Por outras palavras, o Governo acreditou que, como quase sempre, o Povo era incapaz de reagir e que, caso reagisse, lá estaria (como esteve, como está, como estará) a lei da força da Polícia do MPLA.

“Imaginemos que se tivesse avisado que haveria esse aumento do combustível, o que é que haveria de acontecer? Seremos honestos connosco mesmos. Cada um de nós ia pegar num reservatório de cinco a 10 mil litros e meter em casa o combustível e haveria variadíssimos danos colaterais, como possíveis incêndios e outras desgraças”, disse Alberto Quengue.

“Achou-se por bem emitir os cartões de subsídios, verdade sim, que as nossas instituições bancárias não conseguiram dar resposta à demanda, à avalanche que se previa, para terem uma ideia, apenas duas instituições estão a emitir os cartões”, acrescentou.

Para acelerar o processo, avançou o responsável, foram retirados alguns itens que continham nos cartões e numa das instituições bancárias as emissões passaram de 300 a 500 cartões diários.

O director nacional do Gabinete de Comunicação Institucional do Ministério das Finanças de Angola, Adebayo Vunge, justificou que o Governo olhou para outras realidades, citando a recente experiência da Nigéria, com o anúncio pelo Presidente de uma eventual subida do preço dos combustíveis.

“Tivemos uma experiência da Nigéria, exactamente dois dias antes de nós, o Presidente da Nigéria tomou posse e anunciou que iria fazer uma reforma dos subsídios aos combustíveis, foi um tumulto total, sem anunciar datas, a hora”, realçou.

Adebayo Vunge destacou que é uma medida difícil e a opção do Governo “foi num primeiro impacto gerir a informação e anunciá-la num ‘timing’ relativamente razoável”.

“Hoje já não discutimos se era necessário, se devíamos cortar ou não o subsídio dos combustíveis, hoje o tema crítico é: os taxistas e moto taxistas precisam dos cartões. O que se espera é que as equipas técnicas consigam em tempo útil – estamos a estimar um prazo até por volta do dia 15 de Julho – ter esse processo suficientemente amadurecido, para não dizer concluído”, referiu.

Folha 8 com Lusa

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