O economista-chefe do Banco Fomento Angola (BFA), José Miguel Cerdeira , diz que há “sinais claros” de diversificação económica em Angola, mas salientou que é preciso fazer mais e apontou a reforma cambial como a mais importante neste processo. Não está mal. Ao fim de 48 anos de independência, mais de 20 de paz total, há sinais (claros) de diversificação económica…
José Miguel Cerdeira, em declarações à Lusa, diz que “há sinais de que o processo de diversificação começou, há provas que indicam isso, porém não é suficiente. Há coisas que falta fazer, há custos de contexto de que é preciso falar, a questão das comunicações, as estradas, energia, águas, em alguns desses aspectos, na energia, principalmente, paulatinamente está a melhorar, mas noutros sectores ainda falta fazer muito”. Em síntese, e traduzindo para português não propagandístico, falta fazer quase tudo.
A diversificação da economia, tornando-a menos dependente da produção e exportação de petróleo, tem sido falada em Angola há vários anos, praticamente desde a (in)dependência comprada pelo MPLA a Portugal, mas só nos últimos tem conhecido um impulso, que (segundo o MPLA e os seus acólitos) começa a ser visível nos indicadores económicos, que dão conta de um peso cada vez maior da economia não petrolífera no total da criação de riqueza nacional.
“Isto é o efeito da quebra da produção de crude que, por definição, leva a uma quebra da economia petrolífera, e portanto esta é menos representativa no total da economia; é uma diversificação pela negativa”, diz José Miguel Cerdeira, lembrando que “a economia petrolífera caiu 35% nos últimos oito anos, mas é um facto que a economia como um todo depende um pouco menos do petróleo agora do que há oito anos, ainda que continue a depender muito desta matéria-prima”.
A economia petrolífera pesa agora um pouco mais que 25% no total da actividade económica, de acordo com os dados mais recentes do Instituto Nacional de Estatística, diz o analista, lembrando que “pesava cerca de 38% em 2015”.
Assim, a economia não petrolífera, desde 2015, “ao invés da quebra de 35%, cresceu 12%, o que é manifestamente pouco para 12 anos, mas inclui os cinco anos de recessão e da pandemia”.
Para além da quebra automática do peso da economia petrolífera pela redução da produção, aponta, o factor decisivo foi a reforma cambial introduzida em 2017: “esta é a principal reforma; há 5 anos, com o dólar a valer 100 ou 160 kwanzas era impraticável impossível pensar em produzir o que quer que fosse em Angola, porque muito poucas vezes iria compensar o esforço face ao preço barato das importações”, explica.
“Nunca iria haver diversificação com esse câmbio”, salienta, admitindo que “o ajustamento foi muito exigente, para falar claro, trouxe perda de poder de compra e piores condições de vida para a população toda, é inegável, mas nesta altura, havendo ainda muitas dúvidas, passou a fazer sentido para uma série de agentes económicos ponderar produzir ou não em Angola, e há uns quantos que decidem que sim, que vale a pena produzir localmente”, sublinha.
Essa de dizer que a política cambial resultou em “piores condições de vida para a população toda” é digna de registo. Para a população toda? Sim, para toda se dessa toda se excluir a vasta classe dirigente, conjunto de nababos (sobretudo do MPLA) que vivem para se servir e não para servir.
Manter o câmbio artificialmente alto “é muito bom para o poder de compra das famílias angolanas, mas condiciona completamente o futuro da produção nacional angolana, era um câmbio que ao nível a que estava tornava praticamente impossível a ponderação de qualquer produção nacional que pudesse competir com a produção estrangeira, e por isso foi a reforma mais importante na diversificação”, diz o economista-chefe do BFA.
Para José Miguel Cerdeira, “esta tendência de quebra lenta da dependência do petróleo vai continuar, mantendo ainda uma influência determinante, porque basta pensar que ainda a esta altura, apesar de o consumo nacional ter um pouco mais de produtos nacionais com alguma substituição de importações, 99% das receitas de exportação vêm ainda de petróleo ou diamantes, pelo que o câmbio de Angola, e nesse sentido, o poder de compra da sua população, ainda está completamente dependente do volume de produção e preço desta matéria-prima”.
A previsão do gabinete de estudos económicos do BFA é que “o PIB (Produto Interno Bruto) petrolífero caia, a uma média entre os 2 a 4% ao ano até 2027”, caindo acima de 4% este ano e menos do que 2% em 2024.
“Para o PIB não petrolífero o cenário que consideramos agora é de um crescimento de 5 a 7%, em média, e para a economia como um todo, o cenário resultaria num crescimento médio entre 3 a 5% até 2027”, conclui o economista.
Folha 8 com Lusa