FALAR DE FOME COM A BARRIGA A ABARROTAR

O grupo parlamentar da UNITA, o maior partido da oposição que o MPLA ainda permite em Angola, expressou hoje solidariedade às famílias das vitimas das chuvas e exortou o executivo a encontrar soluções duradouras para o problema da drenagem das águas pluviais em Luanda e noutras cidades angolanas. É, mais ou menos, como estar solidário com os famintos tendo acabado de jantar trufas pretas, caranguejos gigantes, cordeiro assado com cogumelos, bolbos de lírio de Inverno, supremos de galinha com espuma de raiz de beterraba e queijos acompanhados de mel e amêndoas caramelizadas e umas garrafas de Château-Grillet 2005…

Segundo um balanço apresentado na última sexta-feira pelo governo, desde Agosto do ano passado as chuvas causaram a morte a mais de 300 pessoas e deixaram 66 mil pessoas desalojadas. Em Luanda terão morrido desde a semana passada dez pessoas em consequência das chuvas torrenciais.

Em comunicado, o grupo parlamentar da UNITA manifestou-se “profundamente tocado pela dramática situação” e exprimiu a sua solidariedade para com as famílias das vítimas desta calamidade natural, endereçando sentimentos de pesar pelas mortes.

Os deputados da UNITA também pedem ao executivo que se empenhe “em encontrar soluções duradouras para o problema da drenagem das águas pluviais em Luanda e noutras cidades e vilas de Angola”, ouvindo sugestões de especialistas, ambientalistas, académicos, universidades, autoridades tradicionais e outros atores sociais, que possam ajudar a desenhar as medidas e soluções adequadas para se mitigar os danos resultantes dos cíclicos fenómenos naturais.

Nem seria preciso tanto. Bastaria ver como é que faziam os colonos brancos portugueses antes da entre do país aos colonos negros do MPLA.

A UNITA aponta ainda a necessidade de o Estado tomar “decisões estruturantes como a institucionalização efectiva das autarquias locais” e pede que sejam assumidas as responsabilidades políticas “e não atitudes facilitistas que reduzem a exclusividade das causas à indisciplina dos cidadãos por terem construído em zonas de risco que a Administração do Estado permitiu”.

A UNITA sublinha que “o Estado tem a obrigação constitucional e legal” de assegurar o planeamento urbano e o ordenamento do território, bem como a defesa da vida e da dignidade humana e a segurança das pessoas, famílias e empresas.

“Por isso, o Executivo não pode fugir da responsabilidade de definir a orientação geral das políticas públicas, sua execução, avaliação e responsabilização”, conclui o grupo parlamentar do maior partido da oposição angolana.

Trufas e caviar ao jantar

A reiterada estratégia de a UNITA fazer oposição de gabinete, lembra-nos que, em Julho de 2008, os líderes das oito economias mais industrializadas do mundo (G8), reunidos no Japão numa cimeira sobre a fome, causaram espanto e repúdio na opinião pública internacional, após ter sido divulgada pelos órgãos de comunicação social a ementa dos seus almoços de trabalho e jantares de gala.

Reunidos sob o signo dos altos preços dos bens alimentares nos países desenvolvidos – e consequente apelo à poupança -, bem como da escassez de comida nos países mais pobres, os chefes de Estado e de Governo não se inibiram de experimentar 24 pratos, incluindo entradas e sobremesas, num jantar que terá custado, por cabeça, a módica quantia de 300 euros.

Trufas pretas, caranguejos gigantes, cordeiro assado com cogumelos, bolbos de lírio de Inverno, supremos de galinha com espuma de raiz de beterraba e uma selecção de queijos acompanhados de mel e amêndoas caramelizadas eram apenas alguns dos pratos à disposição dos líderes mundiais, que acompanharam a refeição da noite com cinco vinhos diferentes, entre os quais um Château-Grillet 2005, que estava avaliado na altura em casas da especialidade online a cerca de 70 euros cada garrafa.

Não faltou também caviar legítimo com champanhe, salmão fumado, bifes de vaca de Quioto e espargos brancos. Nas refeições estiveram envolvidos 25 chefs japoneses e estrangeiros, entre os quais alguns galardoados com as afamadas três estrelas do Guia Michelin.

Segundo a imprensa britânica, o “decoro” dos líderes do G8 – ou, no mínimo, dos anfitriões japoneses – impediu-os de convidar para o jantar alguns dos participantes nas reuniões sobre as questões alimentares, como sejam os representantes da Etiópia, Tanzânia ou Senegal.

Os jornais e as televisões inglesas estiveram na linha da frente da divulgação do serviço de mesa e das reacções concomitantes. Dominic Nutt, da organização Britain Save the Children, citado por várias órgãos online, referiu que “é bastante hipócrita que os líderes do G8 não tenham resistido a um festim destes numa altura em que existe uma crise alimentar e milhões de pessoas não conseguem sequer uma refeição decente por dia”.

Para Andrew Mitchell, do então governo-sombra conservador, “é irracional que cada um destes líderes tenha dado a garantia de que vão ajudar os mais pobres e depois façam isto”.

A cimeira do G8, realizada no Japão, custou um total de 358 milhões de euros, o suficiente para comprar 100 milhões de mosquiteiros que ajudam a impedir a propagação da malária em África ou quatro milhões de doentes com Sida. Só o centro de imprensa, construído propositadamente para o evento, custou 30 milhões de euros.

Folha 8 com Lusa

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