O Presidente da República, João Lourenço, não tem dúvidas: “O Executivo tem feito tudo, em termos de políticas, para criar um bom ambiente de negócios, atrair investimento privado directo estrangeiro, incentivar a banca e o sector empresarial privado a fazerem a sua parte”. Será mesmo assim? Bom. O Presidente do MPLA diz que é verdade. Já o Titular do Poder Executivo subscreve. Embora não tenha sido possível ouvir o Comandante-em-Chefe das FAA, é de crer que seja da mesmo opinião…
Ao dizer aos seus auxiliares do Conselho Económico e Social o que eles devem dizer (mesmo que não pensem isso), o general João Lourenço frisou que, apesar da obra-prima do mestre (que ele próprio), é preciso “maior ousadia, que os empresários aceitem correr o risco inerente a qualquer negócio”.
Alguns conselheiros anuíram e sentiram-se tentados a ir beijar a mão de tão ilustre pensador. Mas contiveram-se. Foi então que João Lourenço continuou a dar sua divina e celestial aula, mostrando (mais uma vez) a razão pela qual diz que o paraíso está quase a chegar.
Segundo João Lourenço, o Executivo está a dar todo o apoio à agricultura familiar e, como resultado disso, muito do que consumimos vem da agricultura familiar, de praticamente todos os municípios do país.
Nessa altura, fez-se silêncio. O que estaria o “querido líder” a pensar? Há quem diga que se lembrou que, no dia 18 de Março de 2022, o seu ministro da Agricultura e Pescas, António de Assis, afirmou que agricultores do interior do país disputavam enxadas e catanas, por falta de produção local, considerando que este é um dos factores que limitava o desenvolvimento do sector. Disse mesmo que “no Bailundo as enxadas estão a ser alugadas à hora…”
“Encorajamos a todos aqueles que se dedicam seriamente a produção de grãos, de milho, feijão, soja, arroz, sorgo e trigo, de aves e de ovos, de caprinos e suínos, de bovinos, para alcançarmos a auto-suficiência alimentar”, salientou João Lourenço.
O Chefe de Estado destacou também, com um raro sentido de oportunidade, que o Executivo abriu linhas de financiamento para o fomento da produção de grãos, de carne e de peixe e outros produtos do mar, oportunidade que deve ser aproveitada pelo sector empresarial privado angolano.
João Lourenço afirmou, igualmente, que o país está a fazer um grande esforço para aumentar a oferta de água e energia para as populações, mas também para as empresas, para o fomento da indústria nacional. Quem diria, não é? Quarente e oito anos depois de ser dono do reino, o MPLA ainda não resolveu o problema da água e da energia. É obra.
“Vamos apostar na construção de milhares de quilómetros de linhas de transporte da energia produzida no Baixo Kwanza pelas barragens hidroeléctricas de Capanda, Laúca e Caculo Cabaça, quando ficar concluída, para alimentar todo o país em energia”, ressaltou, num visível (apesar de controlado pela sua modéstia) orgasmo que só é apanágio dos seres abençoados pela mão divina.
O Titular do Poder Executivo garantiu, atente-se alcance da divina governação, que estão projectadas as linhas Malange-Xá Muteba-Saurimo-Dundo, Gove-Matala, Gove-Menongue, Belém do Huambo-Lubango-Moçamedes-Tômbua, para as quais serão mobilizados os recursos que forem necessários, por se tratar de uma prioridade para o desenvolvimento económico e social do país.
“O nosso compromisso com o povo angolano é sério e inquebrantável. Neste mês do poeta maior, Agostinho Neto, mantemos a máxima: “o mais importante é resolver os problemas do povo”. E, por isso, vamos continuar a trabalhar para colocar Angola num outro patamar cada vez mais alto”, reafirmou o general João Lourenço, não reparando que alguns conselheiros chegaram a temer que ele fosse citar o genocida (assassino, se preferirem) quando disse que “não vamos perder tempo com julgamentos”
ENXADAS ALUGADAS À HORA
Angola explora apenas 331.285 quilómetros (10,37 %) dos 3.194.395 quilómetros de área cultivável, indica o relatório final do Recenseamento Agro-pecuário e Pescas (RAPP). No dia 18 de Março de 2022, o ministro da Agricultura e Pescas, António de Assis, afirmou que agricultores do interior do país disputavam enxadas e catanas, por falta de produção local, considerando que este é um dos factores que limitava o desenvolvimento do sector. “No Bailundo as enxadas estão a ser alugadas à hora…”
O relatório, o primeiro pós-independência, apresentado em Luanda pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), identificou a existência de mais de três milhões de camponeses em todo país e as províncias do Uíge e Zaire com os solos mais ricos.
O mesmo foi apresentado em três módulos, nomeadamente, as “explorações agro-pecuárias e piscatórias familiares”, a “exploração comunitária” e a “explorações agro-pecuárias, piscatórias e aquícolas empresariais”.
Neste módulo, os dados foram recolhidos entre 2019 e 2020, e inquiriu-se 2.364.880 cidadãos, tendo-se destacado as famílias de Malanje, Cabinda, Bié, Huambo na exploração agro-pecuária. No Cuando Cubango é que menos famílias cultivam.
No processo de recolha de dados, as famílias que praticam actividades agrícolas, pecuárias e piscatórias nas 23.651 aldeias apuradas, destaca-se o cultivo do milho, seguido da mandioca, batata-doce e feijão.
No campo da exploração pecuária, em 20 mil aldeias estudadas, foi apurado 1.430.606 criadores, com a produção de galinhas a encabeçar o sector pecuário, seguido dos caprinos, suínos, bovinos e ovinos.
Já na actividade aquícola, foram apurados 8.263 exploradores que produzem maioritariamente em tanques escavados (91%) e lagoas, com predominância na produção da tilápia nativa e do peixe bagre.
Em relação às explorações agro-pecuárias, piscatórias e aquícolas empresariais, o relatório do RAPP identifica 5.887 empresários baseados, na sua maioria, em Benguela e Huambo, mas a província do Cuanza Sul se apresenta com a maior média por hectare, 540 hectares de exploração.
Aqui, os dados indicam que o género masculino domina com as idades compreendidas entre os 54 a 64 anos de idade, em que os nacionais são detentores de 98% das empresas agro-pecuárias do país.
No que diz respeito ao acesso ao crédito, o RAPP apurou, em 2021, que 3,6% dos empresários tiveram acesso ao crédito e cerca de 37% obtiveram assistência técnica.
No evento, o secretário de Estado para a Economia, Ivan dos Santos, considerou o RAPP como um instrumento fundamental de apoio à diversificação da economia nacional.
O recenseamento Agro-pecuário e Pescas, designado por RAPP 2019-2022, é o primeiro a ser realizado em Angola depois da independência, com o objectivo de actualizar o sistema de informação estatística agro-pecuária e pescas, para apoiar as políticas, planos e programas em desenvolvimento no país.
Co-organizado pelos ministérios da Economia e Planeamento e da Agricultura e Florestas, o recenseamento contou com a parceria do Banco Mundial (BM) na assistência técnica, avaliada em 60 mil dólares, bem como da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO).
NEM ENXADAS, NEM CATANAS
O auxiliar de João Lourenço, o ministro da Agricultura e Pescas, António de Assis, afirmou no dia 18 de Março de 2022 que agricultores do interior do país disputavam enxadas e catanas, por falta de produção local, considerando que este é um dos factores que limita o desenvolvimento do sector. Nem enxadas nem catanas. Coisas da crise… que já dura há 48 anos. O melhor mesmo é pescar com enxadas e semear com anzóis.
Para António de Assis, a falta de fabrico interno de meios de produção agrícola, nomeadamente catanas, enxadas, carros de mão, agulhas e de fertilizantes e pesticidas condiciona o fomento da produção agrícola, levando os agricultores a disputarem estes meios. No entanto, não faltam viagens aos Emirados Árabes Unidos…
Segundo o governante, a falta de conhecimento e de mercado constam também entre os factores que inviabilizam o crescimento da agricultura em Angola, defendendo que as acções das autoridades deviam convergir com o sector que dirige.
“A nível de Catabola [província do Bié] encontrar sementes e pesticidas é difícil, nas principais regiões onde se produz não há enxadas e no Bailundo [província do Huambo] as enxadas estão a ser alugadas à hora para se poder cultivar”, contou António de Assis.
O país “não produz enxadas, precisamos fazer diplomacia económica para atrair investimentos e produzir localmente enxadas, catanas, carros de mão, machados, regadores, facas, agulhas para coser os sacos e outros meios de produção”, frisou.
“Há alguns passos positivos nesse sentido, mas ainda insuficientes para as necessidades do país”, salientou.
O ministro falava durante a segunda edição do Café CIPRA (Centro de Imprensa da Presidência da República de Angola), que abordou o “Fomento da Produção Nacional e a Sustentabilidade da Reserva Estratégica Alimentar (REA)”.
A ausência de um “mercado sólido, que é todo o conjunto que congrega leis, normas, procedimentos, centrais logísticas, estradas e o ambiente em si onde a produção é levada” também emperram o desenvolvimento da agricultura, segundo o ministro. “Há esforços nesse sentido, hoje é possível verificar acções nesse domínio, mas precisamos de mais”, realçou.
Em relação ao que considerou de “défice acentuado de conhecimento” para a agricultura, António de Assis apontou que, no interior de Angola, a sementeira do milho e da mandioca “não obedece às normas técnico-científicas” do sector.
Com uma “sementeira correcta do milho”, exemplificou, a produção cresce a 100%: “A plantação da mandioca nos campos agrícolas é incorrecta, digo isso do ponto de vista técnico-científico e o mesmo se aplica à plantação da banana”.
“Angola tem de ser um país virado para a agricultura e todo o momento precisamos de analisar o sector para definir parâmetros de actuação conjunta, todos os sectores ministeriais devem estar ligados à agricultura por ser um sector transversal”, disse.
“Apesar dos actuais constrangimentos, observou António de Assis, nos últimos anos foram dados passos significativos no domínio da agricultura e pescas e mesmo durante a pandemia o país não teve falta de alimentos”. Nada foi dito sobre se os agricultores, contrariando as ordens superiores do MPLA, já plantam as couves com a raiz para… baixo.
“E pelo país há bastante produção local, há produtos agrícolas com alguma frequência e qualidade a nível do país. No país, há um despertar pela necessidade de se produzir, sobretudo devido às dificuldades do passado e a consciência de se consumir produtos locais”, apontou.
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