EM TRÊS MESES, 803 MILHÕES PARA IMPORTAR… GASOLINA

Angola desembolsou 803 milhões de dólares (733 milhões de euros), no primeiro trimestre deste ano, mais três por cento do que no anterior período homólogo, para a aquisição de 1,2 milhões de toneladas métricas de derivados de petróleo (gasóleo, gasolina etc.) anunciou hoje o instituto regulador.

De acordo com o Instituto Regulador de Derivados de Petróleo (IRDP), o montante representou um aumento de 3% face ao período homólogo anterior, sendo cerca de 48,2% destinado à aquisição de gasóleo, 35,3% para gasolina, 9,4% para “fuel oil”, 5,5% para Jet A1, 1,3% para petróleo e 0,2% para betume asfáltico.

Segundo os dados do IRDP, citados pela agência noticiosa angolana, Angop, 64% dos derivados de petróleo foram importados, 35% provenientes da Refinaria de Luanda e 1% da Cabinda Golf Company-Topping de Cabinda.

A informação apresentada pelo director-geral do IRDP, Luís Fernandes, dá conta também que o país contou com uma capacidade instalada de armazenagem de combustíveis líquidos de 675.968 metros cúbicos, em terra.

Segundo o responsável, 904 postos de abastecimento estiveram operacionais no período em referência, dos quais 336 pertencem à Sonangol Distribuição e Comercialização (37%), 79 à Pumangol (9%), 54 à Sonangalp (6%), 51 à TEMA – Total Energies Marketing Angola (5,6%) e 384 de bandeira branca – agentes privados (42,4%).

O mapeamento do IRDP realça que 40 dos 164 municípios que compõem o país carecem ainda de postos de abastecimento de combustíveis.

A Sonangol Distribuição e Comercialização mantém a liderança da quota de mercado em volume de vendas, com cerca de 62%, seguida da Pumangol, com 21%, a Sonangalp, com 9%, e a TEMA, com 8%.

Relativamente ao gás de cozinha, os dados indicam que do volume de 96 091 toneladas métricas introduzidas no mercado interno, a fábrica Angola LNG abasteceu com 90% do total, sendo as outras quantidades provenientes da Refinaria de Luanda (6%) e do Topping de Cabinda (4%).

Neste segmento, o país contou com uma capacidade instalada de armazenagem, em terra, de 10.927 toneladas métricas.

Quanto aos combustíveis gasosos, a comercialização rondou as 108.640 toneladas métricas, destacando-se nas vendas a Sonangol Gás e Energias Renováveis, que mantém a liderança de mercado neste segmento com uma quota de 79%, seguida pela Saigás (11%), a Progás e a Gastém (4%) e Canhonho Gás (2%).

Já nos lubrificantes, foi registado um volume de aquisições de cerca de 8.379 toneladas métricas, das quais apenas 1.543 toneladas métricas foram produzidas localmente, o correspondente a 18% e os restantes 82% importação.

O total de lubrificantes adquiridos foi consumido pelo mercado interno, maioritariamente pelas províncias de Luanda, Benguela, Huíla, Huambo e Cabinda, com um total de 81% do consumo nacional.

No dia 7 de Maio de 2019, o Presidente João Lourenço admitiu que a “falta de diálogo” entre a petrolífera estatal angolana Sonangol e o Governo (do qual é o chefe) “contribuiu negativamente” para o processo de importação de combustíveis e consequente escassez do produto no mercado em todo o país. Na altura, o Folha 8 sugeriu que, dada a impossibilidade de haver um Ministério da Competência, talvez fosse chegada a altura de criar o Ministério do Diálogo Interno. Não resultou.

Na altura, numa nota oficial, a Casa Civil do Presidente referia que esta foi a conclusão que saiu da reunião que o chefe de Estado (também Presidente do MPLA e Titular do Poder Executivo) manteve com a equipa económica do Governo, que decorreu à porta fechada e sem declarações à imprensa, apesar de os jornalistas terem sido convocados para decorar o local.

“Da análise feita, concluiu-se ter havido falta de diálogo e comunicação entre a Sonangol e as diferentes instituições do Estado, o que terá contribuído negativamente no processo de importação de combustíveis. Foram, no entanto, tomadas as medidas e mobilizados todos os recursos necessários para a completa estabilização do mercado de abastecimento dos combustíveis nos próximos dias”, lê-se na nota.

“Apela-se à compreensão dos utentes e da população em geral, não obstante reconhecermos os constrangimentos a que estão sujeitos com a situação criada”, termina a curta nota sobre a reunião, que durou cerca de hora e meia e na qual, presume-se, tenha havido diálogo.

Estando no ADN do MPLA, partido no Poder desde 1975, o desconhecimento da diferença entre diálogo e monólogo, entre democracia e ditadura, não admira que os departamentos do Estado e, neste caso, a Sonangol tenha funcionado a ancestral rega de dialogarem calados, todos juntos, um de cada vez, e à luz de um candeeiro apagado (por falta de combustível).

No encontro com João Lourenço participaram os ministros de Estado para o Desenvolvimento Económico e Social, de Estado e Chefe da Casa de Segurança do Presidente, da Energia e Águas, dos Recursos Minerais e Petróleos, e das Finanças, o Governador do Banco Nacional de Angola (BNA) e o presidente da Sonangol.

Sua majestade João Lourenço faz muito bem em exigir diálogo. Mas será que a sua formação partidária nos garante que ele não é alérgico ao diálogo? Não garante. Fica-lhe bem falar em diálogo. Ainda agora (2023) o MPLA não descobriu que dialogar é pedra basilar de qualquer sociedade sã.

Mas, não há diálogo que nos valha quando um Estado, um país, ou até mesmo que seja (como parece ser o nosso caso) um reino, chega ao ponto de não ter combustíveis porque a petrolífera do MPLA/Governo (Sonangol) não dialogou com esse mesmo Governo…

Que melhor exemplo de vulgaridade dos governantes do MPLA do que justificar a falta de combustíveis com a falta de diálogo entre o Estado (Sonangol) e o Estado (Governo)?

Já agora, recorde-se que, em 2015, após a apresentação por Francisco Lemos, então PCA da Sonangol, do “Relatório Resgate da Eficiência Empresarial”, o Executivo angolano (no qual figurava João Lourenço) tomou conhecimento da gravidade do problema da Sonangol.

A Sonangol, que supostamente deveria ser a segunda maior empresa de África, soube-se de repente que estava falida, e incapaz de pagar a sua dívida bancária e, em consequência, o Executivo tomou a decisão de criar a Comissão de Reestruturação do Sector dos Petróleos, e de contratar um grupo de consultores externos.

A Comissão de Reestruturação do Sector dos Petróleos criada por Decreto Presidencial 86/15 Data 26.10.2015, foi composta por: Ministro dos Petróleos, Ministro das Finanças, Governador do BNA, PCA da Sonangol, Ministro da Casa Civil da Presidência da República.

A arrogância pessoal de Carlos Saturnino, que mais pareceu um (mais um) acerto pessoal de contas, pôs em causa – num monólogo travestido de diálogo – as decisões tomadas pelo governo angolano em 2015 e 2016, pôs em causa a presença de consultores, pôs suspeitas sobre o trabalho realizado e pagamentos feitos, negando – ou branqueando – o facto de que a Sonangol estava falida.

Pôr em causa a decisão do Governo angolano em querer reestruturar a Sonangol, e tentar manipular a opinião pública, para que se pensasse que a Administração anterior trouxe os consultores por falta de competência ou por interesses privados, significou querer reescrever a história, e atribuir a outros as responsabilidades da falência da Sonangol.

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