O activista Luther “King” Campos manifestou-se hoje satisfeito pela restituição da sua liberdade, após ser condenado a um ano e 10 meses com pena suspensa, e prometeu “continuar a lutar” pela “necessidade urgente de defender Angola e os angolanos”.
Por isso, “graças a Deus fui restituído à liberdade, vamos continuar, nós temos uma necessidade urgente de defender Angola e os angolanos”, disse o activista, a partir da viatura dos serviços prisionais, à saída do tribunal, onde um grupo de activistas gritava “resistência”.
O termo “resistência” tem sido uma palavra de ordem de muitos activistas durante manifestações em Luanda, e foi hoje utilizado por estes para demonstrar satisfação pela liberdade de Luther, logo à saída do Tribunal da Comarca de Luanda, mesmo ante a presença de efectivos da polícia (do MPLA, supostamente nacional) no local.
A satisfação pela liberdade do conhecido activista angolano, detido em 12 de Janeiro de 2023 na sequência de uma greve dos taxistas, em Luanda, foi exteriorizada pelo activista Simão Cativa, afirmando, no entanto, que Luther “foi mesmo um preso político”.
“Realmente o que mais interessa agora é a soltura do mano, mas não fiquei muito satisfeito com a decisão do juiz, porque tudo o que eles fizeram é fabricar um crime, praticamente o regime fabricou crimes que ele não cometeu, simplesmente para saírem bem na fita”, afirmou.
Simão Cativa prosseguiu: “O mano (Luther) sim é um preso político, ele foi preso pelo regime, porque naquela fase as manifestações estavam mesmo à flor da pele e isso aconteceu de forma a abafar os nossos protestos na rua”.
O activista angolano Luther “King” Campos foi condenado a um ano e 10 meses de prisão pelo crime de (suposta) instigação pública, com pena suspensa por um período de cinco anos.
A sentença do activista, considerado “preso político” por organizações da sociedade civil, foi lida pelo juiz titular do processo, Biscai Cassoma.
Segundo o juiz, ficou apenas provado que o arguido cometeu o crime de instigação pública, sendo que não ficaram provados os crimes de ultraje ao Estado, seus símbolos e órgãos, rebelião e associação criminosa.
O acórdão ditou a condenação de um ano e 10 meses de prisão, pagamento de 100 mil kwanzas (cerca de 185 euros) de taxa de justiça e indemnização oficiosa ao Estado no valor de 500 mil kwanzas (cerca de 920 euros).
O juiz, no entanto, decidiu suspender a pena por um período de cinco anos “por razões de doença grave” do arguido, “sob a condição de não voltar a praticar crimes da mesma natureza geradoras de situações iguais”.
DIREITOS HUMANOS? UM DIA… TALVEZ!
Há mais de um ano a Human Rights Watch (HRW) aplaudiu a entrada em vigor do novo código penal em Angola mas para a implicação das forças de segurança angolanas em violações graves dos direitos humanos. O relatório da HRW não foi, obviamente, contraditado pelos donos do país, nomeadamente pelo Departamento de Informação e Propaganda do MPLA…
No capítulo dedicado a Angola do seu relatório anual, hoje publicado, a organização não-governamental recordou que em 2021 entrou em vigor o novo código penal em Angola, que substituiu uma lei obsoleta, de 1886.
“Há aspectos que merecem a nossa apreciação positiva. Mas para a dimensão dos problemas de direitos humanos de Angola ainda há muito trabalho para se fazer. (…) Por exemplo, no que diz respeito à actuação das forças de defesa e segurança, muito pouco mudou”, disse a representante da HRW para Angola, Zenaida Machado, em declarações desde Maputo.
Segundo o relatório, em 2021 as forças de segurança angolanas “continuaram a ser implicadas em graves violações dos direitos humanos, incluindo execuções sumárias, uso excessivo de força contra manifestantes pacíficos e detenções arbitrárias”.
No relatório recordou-se que, em 30 de Janeiro, a polícia matou pelo menos 10 manifestantes (foram, de facto, muitos mais) quando “disparou indiscriminadamente contra as pessoas que se tinham juntado pacificamente para exigir melhores serviços públicos” na cidade de Cafunfo, na província de Lunda Norte.
“É uma decepção enorme ver que as forças de defesa e segurança de Angola continuam a agir da mesma forma, como se quem pacificamente protesta contra o regime fosse um inimigo do Estado”, disse Zenaida Machado, comparando a situação com a do regime do ex-Presidente José Eduardo dos Santos porque havia “expectativas positivas em relação” ao Presidente João Lourenço.
A responsável defendeu a “necessidade urgente de reestruturação e reforma das forças de defesa e segurança” angolanas, o que passa por “formação em aspectos de direitos humanos, e a “implementação urgente e eficiente” da estratégia de direitos humanos formalmente aprovada pelo Governo.
No relatório, a organização lamentou também que as autoridades continuem a usar “leis draconianas” para limitar o trabalho dos jornalistas e alertou que milhões de angolanos em todo país vêem negado o direito a informação livre, diversa e imparcial, já que o país é o único da África austral sem estações de rádio comunitárias, e recorda que as autoridades reduziram o número de televisões privadas quando suspenderam três canais em Abril, o que resultou na perda de centenas de empregos.
A análise do representante de “Deus” em Angola
João Lourenço afirmou que “nas primeiras horas da manhã desta segunda-feira, dia 10 de Janeiro, o país foi surpreendido por um acto de rebelião que alterou a ordem pública, vandalizou bens públicos e privados e pôs em risco a segurança física e a vida de pacatos cidadãos, trabalhadores no geral e, em particular, de profissionais da saúde e da comunicação social”.
Escreveu João Lourenço que “a paralização (que por acaso se escreve paralisação) de uma pequena parte dos táxis de Luanda, mesmo depois de o Executivo angolano ter atendido prontamente à principal reivindicação das associações representativas da classe, que tinha a ver com a redução da lotação dos táxis por força das medidas de protecção contra a propagação do vírus SARS-COV 2, serviu de pretexto para o aproveitamento político com vista a criar a ira dos cidadãos utilizadores desses meios de transporte urbano”, acrescentando que “importa referir que, mesmo não sendo o sector do transporte público o único a sofrer as consequências da COVID-19, se tivermos em conta que as empresas no geral tiveram de reduzir a força de trabalho ou mesmo encerrar, tendo avultados prejuízos financeiros e sérias consequências sociais para seus trabalhadores e respectivas famílias, para o caso vertente dos taxistas, pelos relevantes serviços que prestam às populações e aos trabalhadores, o Executivo foi para além da principal reivindicação das associações de taxistas, que pediam o alargamento da lotação para 75%, tendo-lhes sido oferecido em contrapartida a lotação máxima de 100%.”
“O que ocorreu na segunda-feira foi um verdadeiro acto de terror cujas impressões digitais deixadas na cena do crime são bem visíveis e facilmente reconhecíveis, e apontam para a materialização de um macabro plano de ingovernabilidade através do fomento da vandalização de bens públicos e privados, incitação à desobediência e à rebelião, na tentativa da subversão do poder democraticamente instituído”, considerou o general Presidente da República, do MPLA e Titular do Poder Executivo.
João Lourenço salientou que “naquele fatídico dia, valeu-nos o facto de a Polícia Nacional ter agido com bastante contenção, e as entidades privadas singulares e colectivas directamente lesadas terem-se comportado como verdadeiros patriotas, tolerantes e responsáveis”
“Para as gerações vindouras, temos a responsabilidade de preservar para a eternidade as duas maiores conquistas do povo angolano alcançadas com muito sacrifício ao longo dos tempos: a Independência Nacional e a Paz e Reconciliação Nacional”, afirmou João Lourenço, apelando “veementemente a todos os cidadãos a se absterem de quaisquer actos de retaliação. Quem viu o seu património vandalizado, queimado ou destruído, que não pague pela mesma moeda porque ninguém está autorizado a fazer justiça por mãos própias (próprias). Entreguemos essa responsabilidade à Justiça e outros órgãos competentes do Estado!”
Escreveu João Lourenço na sua mensagem à nação, que “as nossas forças policiais estão à altura do desafio e vão garantir a ordem e a segurança dos cidadãos, das instituições e da propriedade. Apelamos, por isso, a todos os cidadãos residentes no nosso país, angolanos e estrangeiros, a fazerem sua vida profissional e familiar normalmente”, garantindo que “as eleições gerais previstas terão lugar em ambiente de plena segurança para os eleitores e os observadores, em Agosto do corrente ano de 2022, como estabelece a Constituição da República”.
“Em Angola, a única forma possível e legítima de se disputar o poder político é pela via democrática das eleições. Permitam-me destacar a pronta manifestação de indignação, repulsa e condenação pública da sociedade angolana em uníssono, através dos representantes de partidos políticos, de confissões religiosas, de organizações não governamentais, jornalistas e fazedores de opinião, contra todos aqueles autores morais, mentores, organizadores e executantes dos actos criminosos da passada segunda-feira”.
Folha 8 com Lusa