BORNITO VOLTA A… PERDER

O antigo vice-presidente de Angola, Bornito de Sousa, e a sua filha, Naulila Diogo Graça, voltaram a perder em Tribunal no processo que moveram contra o Presidente da Frente Cívica portuguesa, Paulo de Morais.

De acordo com a sentença, à qual o Folha 8 teve acesso, «o Tribunal fundamentou a sua convicção com base na análise crítica da prova produzida na audiência de discussão e julgamento, na factualidade não impugnada, e na impugnada designadamente valorando os depoimentos colhidos às testemunhas ouvidas, no confronto com a prova documental junta ao processo, tudo analisado de acordo com as regras da experiência comum e da normalidade do acontecer.»

O Tribunal «começou por proceder à analise da prova documental junta os autos, por ambas as partes, começando pela leitura do texto publicado no dia 20.01.2020 na rede social do réu e pela visualização, através do canal youtube, das palavras proferidas pelo aqui arguido, no jornal da 8 do canal televisivo CMTV , no dia 23.01.2020.»

O Tribunal Judicial da Comarca do Porto julgou improcedente, por não provada, a acção civil interposta por Bornito de Sousa e a sua filha contra Paulo de Morais, no âmbito do já longo processo que ficou conhecido como o caso “Vestido de noiva”.

A acusação tinha por base comentários públicos que Paulo de Morais fez sobre a compra de um vestido de noiva e outros artigos para o casamento da filha do vice-presidente angolano, em 2014, que teriam custado mais de 200 mil dólares.

Paulo de Morais criticou o gasto excessivo alegando tratar-se de um país onde há muita pobreza e corrupção.

Já em 2021, Tribunal de Instrução Criminal (TIC) do Porto (Portugal) recusou levar a julgamento o líder da Frente Cívica, Paulo de Morais, por alegada difamação ao vice-presidente angolano, Bornito de Sousa, e à filha, no âmbito do processo “Vestidos de noiva”

O processo visando Paulo de Morais teve por base considerações públicas que o presidente da Frente Cívica produziu sobre a compra de um vestido de noiva e outros artigos para o casamento da filha do então vice-presidente angolano, em 2014, e que terão custado mais de 200 mil dólares, o equivalente a 172.600 euros, num país “em que há gente a morrer na rua de fome e de doença”.

“Ao dar público conhecimento [do que soube relativamente ao casamento da filha do ‘vice’ angolano], o arguido agiu dentro do âmbito das suas preocupações, empenhamento e actividade de luta contra a corrupção”, afirmou na altura a juíza de instrução Cristina Malheiro, no seu despacho de não-pronúncia.

Paulo de Morais tinha sido alvo de uma acusação particular dos visados, secundada pelo Ministério Público (MP), mas não se conformou, requerendo a instrução do processo para evitar a sua ida a julgamento.

No debate instrutório, o advogado Paulo de Moura Marques, que representa o vice-presidente de Angola e a sua filha, Naulila, acusou – numa anedota argumentativa típica do ADN do partido (o MPLA) que (se) governa Angola há 46 anos – Paulo de Morais de ter enveredado pela “ofensa gratuita”, ultrapassando os limites da liberdade de expressão.

Já o advogado de Paulo de Morais, Carlos Cal Brandão, pediu à juíza que despronunciasse o arguido, ou seja, que optasse por não o levar a julgamento, dizendo que parte da prova foi levada ao processo sem respeitar as normas legais e argumentado que o seu cliente agiu no quadro da defesa do interesse público, visando apenas figuras públicas e recorrendo ao seu direito de liberdade de expressão. Liberdade de expressão, acrescentamos nós, que no país de Bornito de Sousa é uma muito ténue miragem.

“E tudo o que disse o arguido, embora com variações, está claramente demonstrado nos autos”, acrescentou, citando reportagens televisivas que não terão sido desmentidas e que, portanto, Paulo de Morais “tomou como a verdade”. A tese foi parcialmente acolhida pela juíza de instrução.

“Face ao conteúdo de todas estas publicações, ao facto de as mesmas serem públicas e de não se conhecer qualquer reacção dos assistentes às mesmas”, o arguido expressou as suas opiniões “convencido, como ainda está, de que tudo quanto publicou e disse corresponde à rigorosa expressão da verdade”, afirma a magistrada judicial no seu despacho.

A juíza disse ser “público que o regime de governo da República de Angola tem em si graves problemas em vários campos, no político, no social, no económico – questões, que sempre foram conhecidas e comentadas, tornaram-se muito mais evidentes e públicas com a divulgação do dossier conhecido como Luanda Leaks”.

Também são públicas e conhecidas, acrescentava, “as más e pobres condições em que vivem as classes mais desfavorecidas da população angolana. É perante este contexto que o arguido (…) se pronunciou”, sem que transparecesse “qualquer comentário xenófobo e preconceituoso”. Que o digam, por exemplo, os 20 milhões de angolanos pobres…

Assim, “nos termos dos arts. 307.º e 308.º do Código de Processo Penal, decide-se não pronunciar o arguido (…) pela prática de dois crimes de difamação com publicidade e agravada previstos e punidos pelos artigos 180.º, n.º1, 182.º, 183.º, n.º2 do Código Penal”, conclui o despacho de não pronúncia, que imputa ao vice-presidente angolano e a à filha, enquanto assistentes no processo, o pagamento das custas, no valor de 204 euros.

A magistrada recusou, porém, a “nulidade de insuficiência de inquérito”, pretendida pela defesa de Paulo de Morais, pois “não existe qualquer omissão de acto obrigatório a ser realizado na fase de inquérito”; ou seja, foi feito tudo o que a lei impunha nessa fase processual.

Paulo de Morais chegou a classificar Naulila como “a nova princesa de Angola”, numa comparação com a empresária Isabel dos Santos, filha de Eduardo dos Santos, de quem Bornito de Sousa era, na altura do casamento, ministro, conhecida como a “princesa de Angola” e visada no processo “Luanda Leaks”.

As observações de Paulo de Morais que deram origem ao processo “Vestidos de noiva” centram-se em Janeiro de 2020, numa rede social e num canal televisivo, sendo posteriormente reafirmadas, apesar dos pedidos dos queixosos para que se retratasse.

Ao contrário, o dirigente da Frente Cívica portuguesa reafirmou as considerações tecidas na sua página oficial da rede Facebook: “Os factos que revelo nestas comunicações que tenho feito sobre o assunto são objectivos, comprováveis. As opiniões que eu emito sobre esses factos, emito-as no uso de um direito constitucional, que é o meu direito de liberdade de expressão. Não altero, retiro ou acrescento nada ao que disse”.

Na sentença ora conhecida refere-se que: «(…) a liberdade de expressão, de informar e de ser informado é um direito enquadrado na jusfundamentalidade, plasmado nos artigos 37º e 38º da CRP. A lei fundamental garante a todos o direito de exprimir e divulgar livremente o seu pensamento pela palavra, pela imagem ou qualquer outro meio, bem como o direito de informar, de se informar e de ser informado, sem impedimentos nem discriminações, sendo que, o exercício desses direitos não pode ser impedido ou limitado por qualquer tipo ou forma de censura».

Acrescenta ainda que “este direito tem, assim, uma dupla vertente: activa, por banda daqueles que exercem uma função informativa e passiva, do lado dos cidadãos, receptores das notícias por aqueles transmitidas. O exercício deste direito, quer pelos jornalistas, quer pelas pessoas, está impedido de sofrer, por qualquer forma, impedimentos ou limitações consideradas desnecessárias”.

Ora, “pela sua importância na sociedade, o direito à liberdade de expressão e de informação está ainda contemplado e garantido nos seguintes diplomas: Declaração Universal dos Direitos do Homem (art. 19º), Pacto Internacional Relativo aos Direitos Civis e Políticos (art. 19º nº 2), Convenção Europeia dos Direitos do Homem (art. 10º), Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (art. 11º), Lei da Imprensa nº 2/99 de 13.01 (arts. 1 e 2.) e Estatuto do Jornalista-Lei nº 1/99 de 13.01 (arts. 6º e 7º).”

Além de líder da Frente Cívica, Paulo de Morais é professor universitário, co-fundador da Transparência e Integridade, antigo candidato à Presidência da República portuguesa e foi vice-presidente da Câmara do Porto de 2002 a 2005.

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