300 MILHÕES DE CRIANÇAS PRECISAM DE AJUDA

A Unicef diz que várias ameaças concorrem para uma realidade ainda mais difícil este ano. Um novo relatório da agência pede prioridade nas respostas dos governos pelo mundo. Cerca de 300 milhões de crianças precisarão de auxílio humanitário este ano no mundo, segundo o Fundo das Nações Unidas para a Infância, Unicef. A estimativa é do relatório «Perspectivas para crianças em 2023: Uma visão global».

O estudo, lançado em Nova Iorque, adverte que esse número requer urgência na intervenção e oferta de ajuda de organizações internacionais e governos.

As crises múltiplas agravam os níveis de deslocamento, da falta de acesso à educação e das taxas de desnutrição afectando as crianças. O conjunto de factores das crises múltiplas e simultâneas deve perdurar até 2025.

A situação é mais grave nos países em desenvolvimento porque políticos em cargos de decisão tentam lidar com várias necessidades urgentes, destaca o estudo.

Angola, o único país de língua portuguesa no documento, apresenta um risco de inadimplência (falta de cumprimento) de dívida soberana na faixa de mais de 50% no quinquénio até 2025.

No topo da lista estão nove países, incluindo a Ucrânia, onde os níveis da dívida não serão mais sustentáveis e precisarão de ser reestruturados.

O Unicef destaca que os esforços internacionais ainda não são suficientes para descartar uma possível crise da dívida soberana a médio prazo, casa a situação piore.

Os efeitos arrasadores nos padrões de vida nos países afectados incluem uma queda para níveis históricos do investimento em crianças que atrasa a implementação das metas globais.

As crises múltiplas envolvem ainda a alta de preços de alimentos e da energia, factores que contribuíram para aumentar a fome e desnutrição global. As crises limitam o acesso aos cuidados de saúde para muitas crianças, dificultando seu tratamento e imunizações de rotina.

O relatório aponta que a recuperação das perdas no ensino após o fecho de escolas será lenta e sentida por vários anos. A mudança para o sistema de aulas remotas deixou desafios para crianças de famílias pobres e levará tempo a recuperar.

A Unicef alerta que a combinação da falta de fundos, inflação e antevisão de restrições em nível fiscal aumentarão a lacuna de financiamento da educação, uma área vital para se alcançar os Objectivos de Desenvolvimento Sustentável.

As alterações climáticas fazem parte das crises múltiplas. Os efeitos visíveis, incluem as inundações no Paquistão e secas na África Oriental. Esta situação agrava o acesso escolar, a alimentação e os cuidados de saúde, além de causar deslocamentos.

Entre as soluções e estratégias para a combinação de crises actuais estão: priorizar o aumento do investimento em programas de protecção social, como transferências de renda e assistência alimentar.

O relatório recomenda ainda novos programas de recuperação da aprendizagem que ajudarão a enfrentar as perdas e a evitar o retrocesso da educação infantil.

A agência sugere ainda a continuação dos planos de prevenção, detecção e tratamento precoces para desnutrição infantil grave. Estas intervenções são consideradas “eficazes na redução da desnutrição severa em crianças”.

NASCER COM FOME E MORRER COM… FOME

Como sempre, Angola ratificou a Convenção sobre os Direitos da Criança (o tratado internacional mais ratificado em toda história) em 1990, manifestando dessa forma o seu pleno compromisso com a realização de cada direito da criança. Contudo, as nossas crianças continuam a ser geradas com fome, a nascer com fome e a morrer, pouco depois, com… fome. Tal desiderato foi traduzido em vários instrumentos legais com particular destaque para a Lei 25/12 sobre a Protecção e Desenvolvimento Integral da Criança onde estão descritos os 11 Compromissos com a criança.

O Governo do MPLA mostra há 47 anos, também nesta matéria, que assinar “coisas”, legislar, propagandear é a sua principal arma. Quando toca a cumprir é que o rabo torce a porca…

A Convenção sobre os Direitos da Criança continua a ser um instrumento orientador para os países no sentido de implementarem uma agenda que vá de acordo as necessidades das crianças e das suas famílias, particularmente em períodos desafiadores como o que vivemos. No cosso caso, se mesmo sem os tais períodos desafiadores este e outros direitos humanos nunca foram cumpridos, agora a situação é ainda mais dramática.

“O cenário actual é desafiador mas é importante que esta crise não se transforme numa crise dos direitos da criança. Falhar com a criança e os seus direitos hoje, é falhar com o presente e o futuro. Nenhuma sociedade prospera se os direitos da criança não forem protegidos”, afirma Ivan Yerovi, Representante da Unicef em Angola.

Diante dos desafios, a Unicef recomenda que se mantenha a criança no centro das decisões, e que ela continue a ser prioridade absoluta. Para isso é urgente materializar e monitorizar a implementação dos 11 Compromissos, para garantir a sustentabilidade de todos os avanços alcançados até a data ao mesmo tempo que se reforça o investimento no sector social.

Oficialmente Angola fez progressos na implementação da Convenção sobre os Direitos da Criança, destacando-se por exemplo o aumento da cobertura do registo de nascimento, o aumento do acesso ao ensino ou o aumento do investimento na aquisição de vacinas. É claro que, no terreno, o registo de nascimento não enche barriga e a compra de vacinas não é sinónimo de que elas sejam ministradas.

Outros passos importantes, dados recentemente (de acordo com a propaganda oficial e que conta com a cobertura da Unicef) foram a aprovação do Decreto Executivo Conjunto que aprova os Procedimentos Operacionais Padrão no âmbito da Lei do Julgado de Menores; a inclusão no Orçamento Geral do Estado de recursos para o programa de Transferências Monetárias destinado às crianças menores de 5 anos assim como a definição de um orçamento que contempla questões sensíveis ao género. Estas e outras acções promovem, de certa forma, um ambiente mais propício para o desenvolvimento da criança. Para as que estiverem vivas…

“Reconhecemos que muito tem sido feito, mas não devemos descansar enquanto ainda existirem crianças sem vacinas, fora da escola, crianças sem nenhum documento de identificação; enquanto existirem crianças caladas vítimas da violência, e crianças a padecerem de malnutrição ou alguma doença prevenível”, apela a Unicef, certamente inspirada pela conforto de os donos dos escravos terem, todos os dias, pelo menos três coisas que faltam a milhões de crianças angolanas: refeições.

É tempo de (re)imaginar um presente e futuro diferente, é tempo de definir e agir sobre metas claras que trarão mudanças na vida das crianças a curto, médio e longo prazo. É isso que se espera de um país rico, independente há 47 anos e em paz total há 20 anos. As crianças angolanas contam com todos e cada um ou cada uma, para poderem viver num ambiente seguro e favorável para o seu desenvolvimento, um ambiente onde tenham voz e vez.

A Unicef apela para um esforço conjunto na construção e fortalecimento de uma rede de protecção da criança onde actores do Governo, famílias, sociedade civil, sector privado trabalhem em conjunto para providenciar o necessário a cada criança, porque ela não pode esperar.

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