PAREM DE LAVAR DINHEIRO ROUBADO PELOS OLIGARCAS DE ANGOLA

O jornalista Oliver Bullough defendeu hoje que as sanções do Reino Unido contra oligarcas russos devem ser o início de um processo para o país deixar de “receber, lavar e proteger dinheiro roubado” de países como Angola. Será que, mais uma vez, o vice-presidente de Angola vai processar o jornalista?

Numa apresentação hoje em Londres do livro “Butler to the World” [Mordomo do Mundo], Oliver Bullough disse que “a resposta do Governo britânico ao que está acontecer [na Ucrânia] mostra o carácter do Reino Unido e o seu papel como destinatário, branqueador e protector de dinheiro roubado”.

Nos últimos meses, na sequência da guerra que a Rússia mover contra a Ucrânia, o Governo de Boris Johnson anunciou várias medidas, como a suspensão dos vistos de residência a investidores e o congelamento de bens e proibição de viagens a dezenas de russos associados ao regime do presidente russo, Vladimir Putin.

Prometeu também alterar o sistema de registo de empresas, para tornar mais transparente a propriedade de imobiliário e outro tipo de activos no país, criou uma nova unidade dedicada à cleptocracia, na Agência de Combate ao Crime Organizado, e reforçou as Ordens de Riqueza Inexplicáveis, que permitem às autoridades confiscar bens sem terem que provar que estes foram produto de actividade criminosa.

Porém, Oliver Bullough lamentou que pouco tenha sido feito ao longo de décadas para acabar com as lacunas que permitem a estrangeiros abusar dos sistemas legislativo e financeiro britânicos para transferirem a riqueza construída de forma indevida.

Isto contribuiu para o país ganhar reputação como um centro de `dinheiro sujo` que alimenta, por exemplo, o mercado imobiliário de luxo.

“O Reino Unido não é mordomo dos russos, é mordomo do mundo. Ainda existem oligarcas do Cazaquistão, do Azerbaijão, da Ucrânia, de Angola, da Nigéria, do Egipto, dos estados do Golfo, da Malásia, da China e por aí diante. Estão aqui totalmente sem serem incomodados”, afirmou.

Oliver Bullough saudou as recentes sanções aos multimilionários com ligações a Putin e a ajuda militar britânica à Ucrânia, mas lamenta que, simultaneamente, governos sucessivos tenham deixado entrar investimentos e activos financeiros sem questionar a fonte.

Segundo o autor de “Moneyland”, é necessária “uma mudança cultural completa em termos de dar à polícia os recursos e o apoio político que ela precisa para fazer o trabalho que estamos a pedir”.

No livro “Butler to the World”, publicado este mês, expõe lacunas que permitem a magnatas, cleptocratas, criminosos e outras pessoas esconder a riqueza ou fugirem aos impostos.

Além dos paraísos fiscais em protectorados britânicos, como as Ilhas Virgens, Ilhas Caimão ou Gibraltar, que permitem o uso de sociedades anónimas para esconder a propriedade de activos, o jornalista denuncia outros mecanismos semelhantes, nomeadamente na Escócia.

No livro, conta como um grupo de criminosos roubou 1.000 milhões de dólares (912 milhões de euros) de três bancos da Moldova em 2014 e usou uma empresa veículo [`limited partnership`] na Escócia para movimentar o dinheiro, beneficiando do anonimato e reputação de estar no universo financeiro britânico.

Oliver Bullough revela também como Gibraltar “revolucionou totalmente a indústria global de apostas” ao providenciar uma base para as lucrativas empresas de jogos de azar na Internet, contornando as regulamentações existentes para este tipo de actividade nos países europeus.

“É diferente de Las Vegas ou Macau porque as apostas não acontecem em Gibraltar, acontece tudo noutros países. (…) Os problemas causados pelas apostas estão no Reino Unido ou em outros países, e os lucros ficam em Gibraltar”, vincou.

Recorde-se que Bornito de Sousa, o ainda vice-presidente da República de Angola iniciou uma acção num tribunal em Portugal contra o jornalista britânico Oliver Bullough por alegada difamação, na qual exige uma indemnização superior a 500 mil euros.

No seu portal, Oliver Bullough, que escreve regularmente para vários meios de comunicação britânicos, incluindo o Guardian, BBC e GQ, confirmou a notícia dada pela PressGazette uma publicação na internet dedicada ao jornalismo.

“Recebi alguns documentos jurídicos de advogados a actuarem por ordem de Bornito de Sousa Baltazar Diogo, vice-presidente de Angola, afirmando que tencionam levar-me a tribunal em Portugal por difamação”, escreveu o jornalista.

“Como tal, ultimamente muito do meu tempo tem sido gasto a tentar compreender a que exactamente ele tem objecções, o que significa que não tenho lido tantos livros como gostaria”, acrescentou Oliver Bullough.

Segundo o portal PressGazette, a acção está relacionada com o livro “Moneyland: Why Thieves and Crooks Now Rule de World” publicado em 2018 e que examina o que descreve como “o mundo secreto dos cleptocratas globais”.

No livro, o jornalista dedicou oito páginas à participação da filha de Bornito de Sousa, Naulila, num “reality show” intitulado “Say Yes to the Dress”, em 2015, em que alegadamente gastou 200 mil dólares num vestido de noiva, o maior gasto por qualquer noiva na história da boutique de Nova Iorque que promove o programa, diz a PressGazette. O advogado britânico do jornalista diz que “o caso não tem mérito”.

Antes, o vice-presidente e a filha tinham intentado (e, como nada têm para faze… continuam a intentar) uma acção em Portugal contra o activista anti-corrupção da Frente Cívica, Paulo Morais, em que os advogados disseram que a informação sobre a aquisição de um vestido de noiva por 200 mil dólares se tarava de “uma afirmação falsa (“fake news”) que em tempo devido (2015) foi objecto de contestação”.

A PressGazette faz notar que, como a Grã-Bretanha deixou a União Europeia, qualquer caso em Portugal, mesmo que favorecendo o vice-presidente angolano, será “difícil de aplicar” a um cidadão britânico.

De acordo com os advogados portugueses de Bornito de Sousa, o uso dessa expressão “A Nova Princesa de Angola”, usada por Paulo Morais, “implica que autor esteja a qualificar a conduta pessoal e profissional de Naulila Diogo Graça como próxima ou similar da Srª. Engª Isabel dos Santos, a qual se encontra a ser visada na comunicação social e na opinião pública por factos de natureza criminal, o que se repudia porque ilícito e se considera difamatório”.

De acordo com a tese do advogado de Bornito de Sousa e da sua filha, Paulo Morais termina as suas afirmações a propósito deste alegado facto, com a menção ao “poder selvagem”, “numa alusão imediatamente perceptível ser atirada contra o nosso representado atenta as suas funções de Vice-Presidente da República de Angola, querendo qualificar o mesmo como estando a perpetuar práticas condenáveis vindas de anteriores titulares do poder público”.

Depois deste devaneio opinativo, centrado num ataque a Isabel dos Santos e ao seu pai (do qual Bornito de Sousa foi um acólito submisso), o advogado justifica que “o facto alegado” por Paulo Morais – a saber, a aquisição de um vestido de noiva por 200.000,00 dólares – se trata de uma afirmação falsa visa “uma imputação de comportamentos indevidos ao nosso representado e o caracterizar a sua filha, aos olhos de leitores e/ou espectadores, de forma negativa, mais o associando a práticas governativas incorrectas”.

De acordo com o articulado, o advogado de Bornito de Sousa que, recorde-se, desempenhou no consulado do pai da “Princesa de Angola”, José Eduardo dos Santos, as funções de Ministro da Administração do Território, de Fevereiro de 2010 a Setembro de 2012, tendo sido reconduzido em Outubro de 2012 e que a 23 de Agosto de 2017 foi “eleito” Vice-Presidente da República, na candidatura do MPLA liderada por João Manuel Gonçalves Lourenço, “em rigor”, Paulo de Morais “apela a comparações indevidas e tenta concitar sentimentos contra os nossos representados, com recurso a facto não verdadeiro”.

Será que, por possuir duas licenciaturas, uma em Ciências Sociais, pela Escola Superior do MPLA, e outra em Direito, pela Universidade Agostinho Neto e, ainda por ser advogado e Docente da cadeira de Ciência Política e Direito Constitucional das Faculdades de Direito da Universidade Agostinho Neto e da Universidade Católica de Angola, Bornito de Sousa “não pode, por certo, desconhecer” que a liberdade de expressão é um direito (embora nem sempre respeitado em Angola) consagrado na Constituição (Artigo 40º).

A autovitimização de Bornito de Sousa neste diferendo de vestidos, princesas e outras saias de nada lhe servirá quando João Lourenço entender, e já faltou mais, que chegou a hora de exonerar o seu (apagado) vice-presidente.

Folha 8 com Lusa

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